Piloto planeja competir no cross-country. (foto: Arquivo pessoal)
Líder do Campeonato Brasileiro de Regularidade Turismo, Guilherme Alves conta neste texto como começou sua paixão pelo off-road e relembra a emoção de ter retribuído a dedicação de seu pai durante sua criação.
Todos gostamos de brincar de carrinho. Alguns têm preferência por velocidade, querem se aproveitar da máquina e da pista para serem os mais rápidos, enquanto outros preferem a habilidade em transpor obstáculos sem prejudicar o carro o suficiente para também chegarem na frente.
Saber qual brincadeira é mais divertida é de cada um. Fato é que ambas são caras e o retorno é apenas medido em satisfação pessoal, pois raras são as premiações que valham, ou patrocinadores que sustentem. O problema é que, uma vez que se experimenta, não há retorno.
Tudo começou com nossa fazenda de Tocantins e a necessidade de passar em estradas que caminhões, kombis e fuscas eram as únicas formas de se atravessar intermináveis lamaçais em que as estradas se transformavam na época de chuva, exatamente minhas férias de verão… Meu pai, Francis, encomendava pick-ups a empresas de suspensão, que na época ainda passavam pelo IPT da USP para poder trafegar, e assim poderíamos ir ao nosso estilo.
Eram horas (na verdade 16 delas) no asfalto, aguardando ansiosamente pelos últimos 200 km que poderiam durar mais de 6 horas. Tudo valia a pena, mas o que mais me divertia era olhar para trás e ver que além de transpor o que poucos conseguiram, ainda ajudávamos alguns a seguir seu caminho. Foi neste espírito que cresci, quanto mais difícil maior a satisfação de conquista.
Eram meses intermináveis aguardando a chegada das férias e as travessias que torcíamos para estarem cada vez piores. Os anos passaram e percebi que na fazenda tinha menos meninas que eu precisava para passar minhas férias, os destinos foram se alternando e o asfalto chegando mais perto da sede.
Já com 36 anos tive a oportunidade de retribuir as férias aos meus pais em uma viagem em família. Mas para onde? Sempre juntos, eles me proporcionaram conhecimentos em visitas à Europa, diversão na Disney, mas nada melhor sobre a vida do que nas viagens juntos à fazenda. Foi aí que organizei nossa participação na extinta categoria Expedition do Rally dos Sertões de 2005.
Como trabalho com produção de eventos, não me contive e levei água-de-coco em caixinhas TetraPak para distribuir aos demais participantes e um equipamento de projeção para fazer cinema ao ar livre nas pequenas cidades que passávamos. Com certeza além do dia-a-dia do rali, um misto de turismo, esportes outdoor e regularidade, nos desgastávamos ainda mais com estas atividades a que nos propusemos a realizar, mas cada dia que se acabava ficava triste por estarmos mais perto do destino e no fim de tudo aquilo.
Na última noite os organizadores realizaram homenagens a alguns participantes e meu pai foi convidado a falar. Ainda me emociono por ter a oportunidade de devolver um pouco da vida que meu pai me deu e criou. No dia seguinte outra grande surpresa, por pontos acumulados nas tarefas que participamos e por espírito de companheirismo e rali ganhamos o primeiro lugar da categoria. Gostaria que todos pudessem ver seus pais como criança novamente, eu pude. A memória dele segurando o troféu no palco, esticando-se como o verdadeiro campeão. Meu campeão. Meu pai.
Daí em diante resgato aquele momento a cada trilha que participo, sentindo ele comigo, seguindo seus conselhos e o fazendo orgulhoso de seu filho seguir seus passos, mostrando as dificuldades que encontrei e os obstáculos que superei.
Essa paixão me levou novamente ao Sertões de 2006, também com ele ao meu lado, agora em Regularidade, onde mesmo sem ter competido antes ficamos em 3º lugar. Sempre com Ação Social, desta vez em educação e cinema. Atualmente estou em primeiro lugar no Brasileiro de Regularidade Turismo, navegando para velocidade e aguardando o momento de ir para o Cross-Country.
Tudo a seu tempo, pois sei que virá, afinal não há desilusão que me separe desta paixão que se confunde com a própria amizade pelo meu pai. Obrigado pai.
Este texto foi escrito por: Guilherme Alves