“Havia na sala de jantar de minha avó, um armário com porta de vidro e, dentro dele, um pedaço de pele. Não passava de um pedacinho, mas era espesso, áspero, com chumaços de um pêlo avermelhado e grosso. Estava pregado a um cartão por um alfinete enferrujado. No cartão, havia algo escrito com tinta negra, esmaecida, mas eu era então criança demais para ler.
– O que é isso?
– Um pedaço de brontossauro. (…)
Aquele brontossauro específico vivera na Patagônia, uma região da América do Sul, no outro extremo do mundo. Há milhares de anos, caíra dentro de uma geleira, deslocara-se montanha abaixo num prisão de gelo azul e chegara em perfeitas condições ao sopé. Foi lá que o primo de minha avó, Charley Milward, o Marinheiro, o encontrou.”
Esta lembrança de infância, acrescida das fantasias da idade e fermentada com o passar dos anos, levou o jornalista inglês Bruce Chatwin (1940-1989) a palmilhar em 1975 as imensas planuras patagônicas em busca do mundo perdido do qual tantas histórias lhe contava sua avó. O relato desta viagem foi publicado no livro Na Patagônia, que rendeu a Chatwin o Prêmio Hawthorden, em 1978, e o E. M. Forster, da Academia Americana de Artes e Letras, em 1979.
Antes de falecer prematuramente num acidente, Bruce Chatwin publicou vários livros de relatos e fotografias, resultado de longas viagens pelo mundo, sendo que sua obra de ficção, O Vice-Rei de Udá, chegou a ser transformada em filme por Werner Herzog, já exibido no Brasil, e também publicada pela Companhia das Letras.
Num autêntico estilo easy rider e com alguns poucos pertences nas costas, o autor percorreu a América Austral em busca de povoados esquecidos, garimpando histórias inacreditáveis e personagens que poderiam ser foragidos dos livros de Melville, Stevenson ou Jack London.
Quando com imenso prazer li pela primeira vez este livro (fui obrigado a deliciar-me com suas páginas em mais de uma oportunidade…), trilhar os passos de Chatwin tornou-se não somente um sonho como quase uma obsessão, a qual consegui saciar mais de duas décadas depois do autor, ainda mais ao encontrar num escura vitrine do Museu Salesiano de Punta Arenas, no Chile, um pequenino retalho de uma pele espessa, áspera, com chumaços de um pelo avermelhado e grosso…
Uma coisa é certa: quase nada mudou nos confins da América desde então.
Permeado de histórias de gaúchos, imigrantes, bêbados e bandidos, índios, soldados e marinheiros, Bruce Chawin nos conta neste já clássico livro de viagem um pouco mais do nosso continente, leitura imprescindível para os aventureiros que têm no fim do mundo o seu próximo destino.
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“Havia na sala de jantar de minha avó, um armário com porta de vidro e, dentro dele, um pedaço de pele. Não passava de um pedacinho, mas era espesso, áspero, com chumaços de um pêlo avermelhado e grosso. Estava pregado a um cartão por um alfinete enferrujado. No cartão, havia algo escrito com tinta negra, esmaecida, mas eu era então criança demais para ler.
– O que é isso?
– Um pedaço de brontossauro. (…)
Aquele brontossauro específico vivera na Patagônia, uma região da América do Sul, no outro extremo do mundo. Há milhares de anos, caíra dentro de uma geleira, deslocara-se montanha abaixo num prisão de gelo azul e chegara em perfeitas condições ao sopé. Foi lá que o primo de minha avó, Charley Milward, o Marinheiro, o encontrou.”
Esta lembrança de infância, acrescida das fantasias da idade e fermentada com o passar dos anos, levou o jornalista inglês Bruce Chatwin (1940-1989) a palmilhar em 1975 as imensas planuras patagônicas em busca do mundo perdido do qual tantas histórias lhe contava sua avó. O relato desta viagem foi publicado no livro Na Patagônia, que rendeu a Chatwin o Prêmio Hawthorden, em 1978, e o E. M. Forster, da Academia Americana de Artes e Letras, em 1979.
Antes de falecer prematuramente num acidente, Bruce Chatwin publicou vários livros de relatos e fotografias, resultado de longas viagens pelo mundo, sendo que sua obra de ficção, O Vice-Rei de Udá, chegou a ser transformada em filme por Werner Herzog, já exibido no Brasil, e também publicada pela Companhia das Letras.
Num autêntico estilo easy rider e com alguns poucos pertences nas costas, o autor percorreu a América Austral em busca de povoados esquecidos, garimpando histórias inacreditáveis e personagens que poderiam ser foragidos dos livros de Melville, Stevenson ou Jack London.
Quando com imenso prazer li pela primeira vez este livro (fui obrigado a deliciar-me com suas páginas em mais de uma oportunidade…), trilhar os passos de Chatwin tornou-se não somente um sonho como quase uma obsessão, a qual consegui saciar mais de duas décadas depois do autor, ainda mais ao encontrar num escura vitrine do Museu Salesiano de Punta Arenas, no Chile, um pequenino retalho de uma pele espessa, áspera, com chumaços de um pelo avermelhado e grosso…
Uma coisa é certa: quase nada mudou nos confins da América desde então.
Permeado de histórias de gaúchos, imigrantes, bêbados e bandidos, índios, soldados e marinheiros, Bruce Chawin nos conta neste já clássico livro de viagem um pouco mais do nosso continente, leitura imprescindível para os aventureiros que têm no fim do mundo o seu próximo destino.
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Last modified: março 31, 1999