A equipe Coroas do Cerrado (foto: Arquivo pessoal)
Coroas do Cerrado é o nome curioso desta equipe de biker de Brasília (DF), que participou da edição 99 no Iron Biker, a prova mais longa da América Latina, em 16 e 17 de outubro, em Minas. Belas paisagens, imprevistos, solidariedade e muito, muito fôlego, são os ingredientes básicos desta aventura narrada em detalhes para a Webventure.
O primeiro dia
Já tinhamos a informação que o primeiro dia seria pedreira, mas nem sequer imaginávamos o tamanho dessa pedreira. Chegamos em Ouro Preto às 8h e tivemos tempo de sobra para nos preparar. Fomos pedalando para o curral de largada. Todos estavam tranqüilos e relaxados, acho que a experiência das edições anteriores fez a diferença. O Oswaldo estava zen, o Full estava sentado de olhos fechados, eu não parava de fazer xixi e o Mauricio não parava de falar besteira. Ou seja: tudo normal.
Largamos pouco depois das 10h e, para variar, já teve uma queda de uns 10 na frente. Houve o tradicional afunilamento e logo em seguida subimos pela estrada para BH até o hotel Estalagem de Minas. O Augusto e Kaká foram na frente, eu e Gilvan optamos por andar juntos trocando roda e perseguindo os pelotões. Entramos à esquerda no hotel e começamos uma estrada de terra com uma poeira insuportável. Como havia muita gente junta, ficou perigoso andar na roda de alguém sem ver nada à frente. Eu preferi ser muito cauteloso nessa fase e continuei por perto do Gilvan. Logo atrás estava o Maurício.
Fazendo fila – Chegamos ao trilho de trem e seguimos margeando-o até Rodrigo Silva. De lá, fomos para o Bico de Pedra através de uma estradinha estreita. Foi ali que começei a pedalar mais tranqüilo. Já não havia mais pelotões, alguns paravam com problemas mecânicos ou cansaço e ficava mais fácil ultrapassar nas subidas. Nessa hora, eu passei o Kaká, que estava ajustando o banco. Depois ele me superou para logo em seguida começar a passar mal. Mesmo assim não parou de falar um só minuto.
Passei o Kaká tentando trazê-lo na roda mas ele foi ficando e, na
subida do Bico de Pedra, eu alcancei o Augusto, que estava sofrendo de cãimbras. Meus problemas também já tinham começado, mas eu não estava percebendo. Larguei com cinco tubos de gel energético, mas perdi dois tentando tirá-los enquanto pedalava. Isso iria me fazer falta na parte final da prova…
Logo depois começava uma subida animal, que era simplesmente um morro enorme onde tínhamos de carregar as bicicletas. O Apoio estava a 6 km, mas muita gente começava a sentir o desgaste da prova. Foi uma subida longa e sinalizava que parte mais técnica e difícil estava apenas começando.
Uma outra prova – Cheguei inteiro ao Apoio em Lavras Novas e não quis sequer parar. Simplesmente troquei as garrafas, falei que estava ótimo e saí para o loop final de 22 km. O problema era que essa volta final era simplesmente uma outra prova, tão ou mais desgastante que os primeiros 46 km e, logo na primeira descida da cidade para o rio, perdi a garrafa com carboidrato. A descida era um show: muito técnica, travada e em alguns pontos você podia escolher o melhor trajeto. Para quem gosta de Pirenópolis foi um prato cheio.
Depois começaram as subidas, ai meu Deus… O circuito de 22 Km já pegou todos cansados e era simplesmente muito mais duro e técnico que a parte antes do Apoio. Na primeira metada não havia estrada, eram só
singletracks de subida. Descanso nem pensar. Consegui uma das últimas garrafas de água do Apoio seguinte, mas a sorte mudou quando minha comida acabou: só restava uma barra.
As cãimbras eram insuportáveis, já começava a tremer de hipoglicemia e engolir um pedaço de Cliff-Bar pedalando na subida com o coração a 180 bpm não é um dos exercícios mais agradáveis. De repente, faltando uns 8 km para o final, o meu anjo da guarda enviou o Mauricio. Ele chegou me dando a força que eu precisava: gel, carboidrato e incentivo. As cãimbras se tornaram suportáveis e passamos a pedalar juntos, detonando nos downhills e ele me esperando com paciência nas subidas.
Passamos a represa e em seguida vimos a placa “Falta 3 km” (sic). Foi aí que vimos cenas surreais de gente caída pelos cantos da trilha, dormindo abraçado com as bikes, gritando e chorando de dor, se arrastando morro acima empurrando a bicicleta sem poder esticar as pernas por causa das cãimbras. Parecia um campo de extermínio…
Fôlego final – Esses ultimos 3 km, óbvio, eram os piores. Só subida, com singles no meio de pedras impossíveis de pedalar. A chegada ficava bem na entrada da cidade, num lugar muito deprimente, não só pela subida forte mas pela falta de qualquer outro atrativo. Você pedalava até quase morrer para no fim passar na frente de uma mesa com uma pessoa gritando seu número e outra anotando.
O Mauricio chegou em 20º na categoria, rindo e fazendo social; eu cheguei logo atrás amaldiçoando o mundo e mandando ele calar a boca. Enquanto isso, muitos dos nossos atletas, acometidos por cãimbras, não conseguiram passar o PC antes do tempo limite das 14h e tiveram de parar em Lavras Novas. Voltamos para o hotel cansados e felizes, mas sem sabendo que havia mais no dia seguinte…
O segundo dia
Chegamos em Honório Bicalho novamente às 8h30 e tivemos tempo suficiente para aprontar tudo. Dessa vez a saída foi como nos outros anos, com as categorias largando separadamente, a cada 2 minutos.
O problema era que logo havia um forte afunilamento por causa de uma subida depois do rio. Eram simplesmente 700 pessoas carregando
bicicletas morro acima, com todo aquele estresse e sacanagem que sempre rolam nesses casos. Eu, Mauricio e Gilvan ficamos juntos em todo esse trecho e, para variar, perdi novamente a garrafinha com carboidrato, mas aprendí a lição do dia anterior e estava com os bolsos cheios de gel e barras energéticas.
Depois da subida maior, vieram outras em estradinhas de terra. Foi aí que começou para valer a prova, pois alguns já estavam cansados e estava fácil ultrapassar os mais lentos. Fomos subindo até o primeiro ponto de água. No Apoio foi fácil ver aquele monte de gente de amarelo da nossa equipe e o Marcelo fez uma troca digna de F-1: joguei a garrafa no chão antes do apoio e continuei pedalando, então ele correu do meu lado e encaixou as duas garrafas nos suportes. Daí foi só sair no sprint ainda de coroão para uma descida alucinante no asfalto.
Sobe! – Continuamos nas estradinhas até o singletrack nas margens do rio e entrarmos no Macacos para o famoso trecho dentro do rio, que estava com pouca água, ajudando a manter um bom ritmo. Subimos a famigerada ladeira de paralelepípedos – que antes de conhecer eu achava que dava para subir pedalando – e fomos por um single técnico até a beira da represa.
A partir de então foram só subidões até dentro do condomínio onde, depois de um ponto de água, entramos à direita para mais subidas técnicas até o alto do morro, saindo no trevo da estrada para Nova Lima. Na descida para o BH Shopping, havia um desvio para a direita que nos obrigava a antecipar as marchar adequadas para subir pelo terreno de pedras até o ponto de cronometragem final. Depois, continuávamos pelo asfalto até a chegada propriamente dita, seguindo direto para o pódio, onde todos os demais nos aguardavam com a estrutura montada.
Fizemos aquela festa na chegada e continuamos até a entrega dos prêmios, aplaudindo a Carol (1ª na Elite Feminina), o Abraão (2º na Elite Masculina) e o Pedro Igor (1º na Master B, usando o boné dos Coroas no pódio). Depois de tudo fomos todos para uma churrascaria rodízio, que ninguém é de ferro. E o Augusto foi o primeiro a pedir um chope…
A equipe Coroas do Serrado foi composta por Augusto Willeman, Cláudio Arrochela, Gilvan Silva, Ivam Melo, Mauricio Gonçalves, Marcus Heusi (Maka), Oswaldo Silva, Raquel Musy, Ricardo Alessandro (Kaká), Rômulo Lopes e Ruyter Thuin. Apoio: Fernanda Cavalari (fotógrafa),Marcelo (mecânico), Tan (massagista), Adele Heusi, Carla Willeman, Cláudia Lopes, Lucila Silva e Patrícia Lopes, além de Paulo Juvenal (médico) e Marçal Brasil (consultor).
Este texto foi escrito por: Webventure
Last modified: janeiro 6, 2000