De acordo com o plano a qualidade na visita leva à consciência da preservação do local. (foto: Arquivo Imagem Projeto Tamar)
O Ano Internacional do Ecoturismo está começando muito bem. Há sete dias, um dos paraísos brasileiros, Fernando de Noronha, ganhou um verdadeiro e merecido presente. O primeiro plano do uso deste destino para a recreação. Não, ninguém vai construir ali um superparque aquático Noronha é um Parque Nacional e este título felizmente lhe assegura que nada parecido aconteceria.
O plano é para garantir a proteção da área e, ao mesmo tempo, dar mais conforto e qualidade à visitação. Curiosamente, não se está fechando portas, criando listas de proibição, aumentando a restrição dos visitantes para garantir a conservação do local…
Ao contrário. Quer-se que o turista vá a Noronha e, a partir deste plano, ele terá ainda outras vantagens. Além de encantar-se com as riquezas naturais, vai ganhar informação sobre elas e entender sua participação na preservação das mesmas. Ao voltar para casa, vai repassar dados e, convencido de que aquele paraíso deve continuar existindo, incentivará amigos a visitá-lo e conservá-lo.
A boa experiência garante a conservação, resume Sérgio Salvati, do WWF, a Organização Não-Governamental que lançou o plano junto com o Ibama e a Fundação Pró-Tamar. Neste Aventura Brasil, os detalhes do projeto, em depoimentos exclusivos, e mais ações previstas para este que deve ser um ano histórico para o ecoturismo no Brasil.
Foram sete anos entre a idealização, estudos e, finalmente, a prática. Com o lançamento do Programa de Uso Recreativo do Parque Nacional Marinho de Fernando de Noronha, repleto de ações que existem em poucos países do mundo e algumas inéditas no Brasil, o primeiro passo está dado.
Paralelamente, Noronha, arquipélago que faz parte do estado de Pernambuco, completa 13 anos como Parque Nacional. Há 20 anos é uma grande atração entre as diversas que o Brasil oferece. Existe quem tenha como o sonho da vida conhecer suas águas cristalinas onde há golfinhos, tartarugas e peixes coloridos.
O Tamar, centro especializado do Ibama, chegou a Noronha em 1984. Ninguém falava em ecoturismo na época, lembra Cláudio Bellini, um dos executores do plano recreacional e membro do Projeto Tamar em Fernando de Noronha. O Projeto existe para a preservação das tartarugas marinhas e Noronha é uma área de desova. Moro aqui há 11 anos e posso dizer que a consciência do visitante está sempre aumentando. Mas ainda há muito o que fazer.
Passo à frente – Entre algumas medidas que até então serviam como conservacionistas no local, está o controle do número de visitantes, feito pelo Governo de Pernambuco, e aquelas previstas no Plano de Manejo do Parque. O bom é que qualquer grito que dermos aqui reverbera longe, pois Noronha já é um destino conhecido e visto com muito carinho pelo turista, acrescenta Cláudio. Mas temos que estar sempre um passo à frente. Quando a natureza responde, muitas vezes nossa atuação já é tardia.
Em 1996, o Tamar e o WWF idealizaram este plano do uso recreativo. Foram quatro anos de planejamento e dois para que se iniciasse a prática. Na verdade, os novos equipamentos, informativos e até o monitoramento do impacto da visitação estão acontecendo há algum tempo, mas foram lançados em conjunto no último sábado.
Não há nada de inimaginável: entre as ações estão a implantação de trilhas, com instalação de placas educativas, criação e distribuição de folhetos e comercialização de guias, e o monitoramento do impacto da visitação – inclusive no mar, o que é inédito no país. Por trás disso tudo, o desafio de gerenciar e manter tantos esforços para continuar colhendo resultados.
A maior parte das atrações de Noronha está na água. E, mesmo em terra, pode-se dizer que todos os caminhos levam ao mar. Por isso, o plano de uso recreativo contempla os dois ambientes.
Em terra, há informativos para os turistas e a implantação de cinco trilhas-modelo. Na verdade são três, pois algumas que parecem se separar são, na verdade, contínuas, explica Bellini. São elas a Golfinho-Sancho (nomes de praias), a Caieira-Pontinha-Pedra Alta e a Capim-Açu-Leão.
A primeira é a mais conhecida e descrita por Bellini como auto-guiável. Já a da Pontinha e a Capim-Açu são consideradas de alto grau de dificuldade e devem ser feitas com um guia. Por causa do plano, agora essas trilhas estão marcadas com placas que não apenas sinalizam, mas informam, como numa história, os aspectos ambientais e culturais dos atrativos do Parque.
Guia de plástico – A informação também vai até a água. Foram produzidos guias de ilustração da fauna marinha, feitos de plástico, para colocar no pescoço e mergulhar com eles. Dois pontos de mergulho foram criados dentro do Parque e há a expectativa da abertura de novos. Agora só falta as operadoras de mergulho colocarem no pacote o programa do uso recreativo. A partir desta semana vamos comercializar os guias. Infelizmente, não dá para doar, diz Bellini. Mas a gente, na verdade, trabalhou para elas com esse estudo.
Paralelamente já está sendo aplicado um monitoramento-piloto. Um dos objetivos é perceber os impactos da visitação em terra e mar para futuras adaptações das cargas das trilhas, número de mergulhadores permitido, entre outras ações. Ainda é cedo para apresentar os primeiros resultados, é tudo muito novo neste plano e é um trabalho de formiga, argumenta Bellini.
Elogios – Mas os turistas já sentem os efeitos do novo plano. Estamos recebendo muitos elogios, os visitantes agora saem com informações sobre geologia, história…Queremos que eles conheçam o que é o ecoturismo para poderem distinguir as empresas que têm esta prática daquelas que simplesmente levam as pessoas para a natureza. Nosso interesse é informar o mercado e também o turista, diz Salvati.
Agora o empenho dos idealizadores do plano está em encontrar a melhor forma de gerenciá-lo e existe a expectativa de que ele seja duplicado em outras localidades, já que se transformou na publicação o Uso Recreativo do Parque Nacional Marinho de Fernando de Noronha, pelo WWF, com idéias aplicáveis em outros sítios de visitação.
O ecoturismo será tema de um grande encontro mundial em maio deste ano, em Quebec, no Canadá. Para levar a este congresso as idéias brasileiras é que o WWF, juntamente com outras entidades como a Embratur, o SOS Mata Atlântica e o Instituto de Ecoturismo do Brasil, pretende realizar um evento nacional em abril ou maio. Queremos colecionar experiências, conhecer os erros e acertos desses anos de trabalho, explica Salvati.
Além disso, o WWF vai lançar, em abril, um Manual do Ecoturismo e um site sobre turismo comunitário. E já realiza uma campanha com o Ministério do Meio Ambiente para a educação dos visitantes nos meios naturais.
Saldo positivo – Fazendo um balanço desses cerca de 20 anos de atividade de ecoturismo no Brasil, o saldo é positivo, acredita Salvati, que é técnico de turismo e meio ambiente. Antes não se tinha noção do que era, as empresas simplesmente levavam as pessoas para ter contato com a natureza. Com o tempo é que foi-se informando, surgindo o envolvimento da comunidade e se aprendeu com a criação e o gerenciamento das APA (Área de Proteção Ambiental).
Hoje observo que cada vez há mais produtos sendo lançados sem essa preocupação. Não é ecoturismo, é turismo contemplativo. Acredito que devemos iniciar tudo de novo com eles, está começando um novo ciclo, finaliza.
Nada como ter um exemplo como o de Noronha para seguir em um ano em que muito se vai falar sobre o assunto. O Ano Internacional do Ecoturismo é uma criação da UNESCO, que também escolheu 2002 como o Ano Internacional da Montanha… mas este é um assunto para outro Aventura Brasil.
Para saber mais:
Este texto foi escrito por: Luciana de Oliveira
Last modified: março 1, 2002