Descer do carro, no meio das dunas, e descobrir que você não conta mais com o diferencial, ou seja, que seu carro se transformou num comum 4×2, é o pesadelo de qualquer piloto de carro ou caminhão. E foi o que vivemos. O diferencial dianteiro quebrou e nosso Mitsubishi Pajero Full se tornou, na areia, um indefeso 4×2, como qualquer carro que circula normalmente na cidade. A pista mais próxima, onde talvez poderíamos andar com tração em apenas duas rodas, estava a mais de 150 quilômetros de distância. Mas para chegar até lá tínhamos que enfrentar muitas dunas e areia fofa.
Ficar parado no meio do deserto do Saara significaria perder o carro. Então decidimos tentar salvá-lo, seguindo a rota do rali, para alcançar a tal pista, já que estando na rota correta nossas vidas estariam salvas. Se chegássemos, ainda poderíamos pegar esta trilha e, em vez de fazer os 90 quilômetros restantes da etapa (impossíveis para nossa situação), seguir no outro sentido, com 680. O trecho era muito mais longo, mas, talvez, viável. Era nossa única alternativa para continuarmos no maior rali do mundo e ainda manter a liderança na categoria graças à vantagem armazenada em relação ao segundo colocado. Incrível como as decisões ficam difíceis nestes momentos.
Arriscando tudo, esvaziando os pneus Pirelli ao máximo, cavando quilos e quilos de areia e procurando a pé passagens alternativas, fomos seguindo até um ponto onde quase todos concorrentes já haviam nos ultrapassado e nós não conseguíamos mais seguir em frente.
Ainda faltavam 50 quilômetros, os mais difíceis. Impossíveis, para ser mais claro. Havia ainda uma carta na manga: os caminhões. Mas estávamos no meio das dunas e sei que elas mexem com a cabeça das pessoas. Nossa sorte é que meu navegador, o Bruno, é francês e amigo pessoal de um tripulante do caminhão da equipe de fábrica da Mitsubishi. Era nossa chance. Eles chegaram e não hesitaram em nos ajudar. Foram horas de temor esperando por eles e de terror com eles, pois ser puxado por um caminhão nas dunas é mais assustador que um trem fantasma.
Depois das dunas eles nos liberaram e seguimos em frente até onde era possível. E lá vinham eles de novo para dar mais este empurrãozinho. Quer dizer, puxadinha. Isto se repetiu por cinco vezes.
Parecia que nosso plano de contingência iria funcionar, mas as dunas foram ficando complicadas, até para eles, sozinhos. Imaginem nos puxando. Foi quando entrou em jogo o controle emocional. Havia apenas mais uma duna nos separando da tal pista. Mais do que esta duna, ou os 15 metros a serem vencidos, estava o descontrole ou “piração” que ataca aos concorrentes do rali. A cinta que prendia o carro ao caminhão soltou-se. Bastava o caminhão dar marcha a ré e em mais cinco minutos estaríamos livres daquele buraco e poderíamos pegar a trilha e continuar o rali.
Mas nossos anjos da guarda estavam esgotados, estressados e se foram. Depois de tudo que fizeram – que contradição – só falta o gesto da banana. Lá ficamos sem saber se conseguiríamos sair de lá.
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André Azevedo, 41, e Klever Kolberg, 38, são pilotos da Equipe Petrobras Lubrax e participam do rali Paris-Dakar há 13 anos.
Este texto foi escrito por: André Azevedo e Klever Kolberg, da Equipe Petrobras Lubrax
Last modified: janeiro 10, 2001