Michel Le Bret na USP: um grande encontro (foto: Marcelo Krings)
por Marcelo Krings
Em 1959, o engenheiro francês Michel Le Bret chegou no Brasil para trabalhar na Rhodia. Na mudança, de navio, trazia entre outras coisas alguns equipamentos para espeleologia. Interessado pela exploração de cavernas no seu país natal, Lê Bret tinha lido bastante sobre as possibilidades espeleológicas no Brasil principalmente os relatos das andanças do prof. Krone pelo Vale do Ribeira e depois pessoalmente com o prof. Epitácio Guimarães.
Somente em 1961 foram possíveis as primeiras explorações, praticamente ininterruptas entre feriados e férias até 1969, quando após um problema de saúde retornou para recuperação na França. Em 1961, já sócio do Clube Alpino Paulista (CAP), participou da expedição de Domingos Giobbi na Cordilheira Branca no Peru e se lançou na pesquisa de cavidades no Vale do Ribeira.
Seguindo relatos e pesquisas anteriores, foi juntamente com Pierre Martin, Peter Slavec, e outros tantos espeleólogos, exploradores do CAP e pessoas da região seguem as pegadas de Krone para a primeira travessia da caverna Casa de Pedra, a exploração e topografia das cavernas Areias 1 e 2, Alambari de Cima, Caverna de Santana, Ouro Grosso, Água Suja e outras tantas somente no Vale do Ribeira.
Quando eu soube da apresentação que o Sr. Le Bret faria no auditório da Geologia da Universidade de São Paulo (USP), fiquei bastante entusiasmado com a possibilidade de conhecê-lo. Ele veio a convite da Redespeleo para participar do Carste 2004 e fez com exigência única a sua participação em alguma expedição espeleológica em curso.
Em meus 12 anos de Clube Alpino, já tinha ouvido falar muito de suas explorações e nunca me imaginei frente a frente com este senhor de mais de 70 anos, extremamente lúcido contando suas peripécias na exploração de cavernas.
Na medida em que a apresentação de slides progredia, narrada por Le Bret, ia aos poucos observando com outro olhar aqueles lugares que as fotos mostravam e que tantas vezes percorri dentro de várias das cavernas que ele nos apresentava. Foi uma maravilhosa volta no tempo, uma volta, curta é verdade, às origens da espeleologia no Vale do Ribeira, com suas dificuldades de acesso, seus pousos simplórios e seus equipamento pouco mais que rudimentares comparados àqueles que temos a disposição hoje.
Estes exploradores realmente são fonte inspiradora pela sua determinação na conquista de novas fronteiras e conhecimentos. Graças a estes senhores, espeleólogos podem hoje seguir seus passos (e ir além), esportistas podem testar suas habilidades em um ambiente muito agressivo e estudantes secundaristas, muitos anos depois, podem seguir os passos dos primeiros exploradores buscando instrução em geografia, geologia, biologia.
Isso sem falar em toda uma série de conhecimentos, hoje transversais e interligados, que podem ser acrescentados à bagagem cultural de muitos alunos em que, entre outras coisas, se aprende a ter respeito pela natureza e preservar aquilo que nos toca e emociona quando nos deparamos com a magnitude e s processos envolvidos na formação de cavernas.
Se não fosse ele e seus colegas, talvez outros tivessem feito este trabalho, não sei, mas da próxima vez que for ao Salão de Lama, na parte superior da Água Suja ou conseguir refazer a travessia da Tapagem vou lembrar das palavras do Sr. Le Bret contando trecho a trecho o processo da exploração e a felicidade de poder concretizar aos poucos os objetivos propostos para cada caverna.
Espeleo x montanha – Uma coisa que lamento é o triste fato do CAP, que tão bem recebeu os cavernícolas nas décadas de 60, 70 e 80, com tanta exploração e história feita não tenha mais um departamento de Espeleologia. Quem sabe não é oportuno procurar o motivo desta lacuna e incentivar paulatinamente a formação de um grupo interessado em cavernas.
Considero importante que na formação de novos montanhistas, a partir dos cursos básicos, a espeleologia continue presente, como está no CAP, instruindo e apresentando o mundo das cavernas.
Para quem quiser saber mais sobre Michel Le Bret recomendo seu livro Maravilhoso Brasil Subterrâneo, editora Japi, 1995, em que se apresenta em uma narrativa direta, realista e divertida de parte de suas explorações, sobre a história da espeleologia brasileira, os primeiros grupos de espeleólogos, a fundação da Sociedade Brasileira de Espeleologia (SBE) e outros assuntos relativos.
Este texto foi escrito por: Marcelo Krings
Last modified: agosto 4, 2004