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A importância do processo de normalização do turismo de aventura no Brasil

Redação Webventure/ Biking, Destino Aventura, Outros

A colaboradora do Webventure Eliana Garcia é bióloga, guia de ecoturismo, educadora ambiental e coordenadora do Clube de Cicloturismo do Brasil. Ela foi responsável pela elaboração dos textos base referentes ao cicloturismo para o processo de normalização do turismo de aventura. Neste texto, Eliana explica a importância da normalização do turismo de aventura. Entenda mais sobre este assunto e comente você também.

Imagine uma situação hipotética, numa de suas férias de verão. Você faz as reservas num bom hotel na beira da praia para relaxar por alguns dias. Lá chegando, além de praia e água de coco são oferecidos também alguns passeios de aventura. Você já está usufruindo dos serviços do hotel, está satisfeito e resolve se encaixar num grupo que sairá de bicicleta. Acontece que sua intimidade com o veículo já ficou para trás faz alguns anos, mais precisamente desde a infância.

Na primeira descida íngreme a bicicleta traz também à lembrança do que é um belo tombo. Provavelmente, somente nesta hora você perceberá que não havia carro de apoio nem rádio comunicador. Além disso, o guia, mostrando total despreparo, entra em pânico porque não pode ver sangue e tem que ser acalmado pelo cliente-vítima. Poderia ser um acidente hipotético, mas na realidade aconteceu. E acontece praticamente todos os dias pelo Brasil, com maior ou menor gravidade.

Com o aumento dos pacotes e atividades envolvendo aventura sendo oferecidos por agências, hotéis e também por guias independentes, aumentou dramaticamente, em todo o sentido da palavra, o número de acidentes.

Responsabilidade – A maioria das agências de turismo de aventura no país surgiram a partir praticantes das diversas modalidades, que perceberam, num dado momento, que poderiam unir o útil e o agradável. Os proprietários das agências têm assim uma importante experiência de campo que os permitiu levar grupos de iniciantes ou mesmo de não praticantes a vivenciarem tudo aquilo que os encantou e fascinou num determinado esporte de aventura.

Mas uma coisa bem diferente de praticar uma atividade como esporte ou lazer, mesmo que com seriedade, é conduzir um grupo onde há uma relação comercial envolvida. Desde a escolha do roteiro, até logística de alimentação e pernoites, transporte, contratação de guias e todos os aspectos que envolvem a segurança do grupo passam a requerer um outro enfoque.

Para qualquer praticante de esportes de aventura, o mais importante para não se expor a riscos desnecessários é o bom senso. Porém, não é mais a mesma coisa quando este esporte se transforma num pacote turístico. A experiência no esporte de aventura por si só não basta para oferecer um bom produto de turismo, apesar de muito importante, é só mais um dos fatores que poderão resultar na prestação de um serviço de qualidade.

A maioria dos hotéis e pousadas, por outro lado, passou a oferecer opções de turismo de aventura como um diferencial ou mesmo pela própria pressão do mercado, mas muitas vezes sem o devido cuidado que a atividade exige.

Eram necessários então parâmetros que determinassem o que seria uma boa operação turística em aventura. Iniciou-se assim, a partir de uma iniciativa do Ministério do Turismo, o processo de normalização e certificação do turismo de aventura.

Uma vez que o setor não estava suficiente mente organizado, o Ministério passou a financiar, através do Instituto de Hospitalidade (IH) todas as etapas de formatação e discussão de normas para cada área específica do turismo de aventura, assim como também o processo de aprovação das normas na ABNT (Associação Brasileira de Normas Técnicas).

As normas não serão regulamentos, isto é, não serão obrigatoriamente acatadas. Isto porque não haveria estrutura para averiguar, fiscalizar e punir pelo não cumprimento do regulamento. Corria-se o sério risco de serem criadas mais leis daquelas que “não pegam”. Assim, espera-se que, a adesão seja voluntária por parte das empresas e instituições que trabalham com turismo de aventura. As vantagens são claras, as normas irão por exemplo, orientar o consumidor, aumentar a credibilidade de quem está oferecendo o serviço, garantir um padrão mínimo de qualidade e segurança e conseqüentemente atrair maior público nacional e principalmente estrangeiro.

As empresas que quiserem terão a oportunidade, através de uma certificadora, de obter a certificação, o que garante ao consumidor que ela segue as normas do setor. Mas independente de as empresas se certificarem ou não, o importante é que as normas servirão de referência para a melhoria do mercado e também poderão ser inclusive utilizadas como referência técnica em questões judiciais envolvendo acidentes.

Certificação – O turismo de aventura passa neste momento por uma fase que já foi vivida há algumas décadas atrás pelo setor de mergulho. Hoje, quem sai para praticar mergulho, mesmo que pela primeira vez, provavelmente já saberá da existência das certificadoras desta atividade.

Além de atingir diretamente agências, hotéis e demais prestadores de serviço, as normas poderão ajudar também ao servirem de referência para outras empresas ou instituições que promovem atividades de aventura esporadicamente, como academias que organizam caminhadas e lojas de bicicletas que organizam passeios.

Uma série incontável de reuniões foram sendo realizadas, com especialistas e envolvidos em diversas áreas do turismo de aventura. A própria definição de como seriam divididas ou agrupadas as atividades, e quais seriam prioritárias para o momento, foi feita em reunião aberta a todos os interessados. Uma vez elegidas as normas a serem elaboradas (serão 19 por enquanto), foi formada uma comissão de estudo para cada uma. Estas comissões de estudo vêm se reunindo desde o mês de agosto, em diferentes pontos do país, procurando se aproximar dos locais onde a prática de cada atividade tem sido mais expressiva.

Uma vez elaborada e amplamente discutida, a norma segue para a votação pública no site da ABNT. Nesta votação, a norma pode ser reprovada, aprovada ou aprovada com ressalvas. A norma volta então para a comissão de estudo, para que sejam feitos os ajustes necessários e é colocada novamente em votação. Algumas normas já passaram por todo este caminho, mas a maioria ainda está finalizando o processo de discussão nas comissões.

Apesar de todo o esforço de divulgação, a participação de agências, hotéis, ongs e guias foi muito menor do que era de se esperar dada a importância dessa normalização. A dificuldade tem sido ainda maior em atividades pouco difundidas, mas com um enorme potencial de crescimento, como é o caso específico do cicloturismo, por exemplo.

Participe – É muito importante a ampla participação neste processo das pessoas e entidades envolvidas com o turismo de aventura. É do interesse de cada uma das entidades que este mercado seja visto como um setor organizado e regulamentado. Todo esse processo é essencial para que o nosso turismo de aventura deixe de ser notícia como tragédia e passe a ser um modelo até para outros países. Por que não?

Se você quer se interar do processo e participar também, acesse o site do Instituto de Hospitalidade:www.hospitalidade.org.br.

* Eliana Garcia: Bióloga, completou mais de 10 mil quilômetros em cicloviagens, desde 1988. Dentre estas destacam-se: Expedição Parques del Sur (em que percorreu 4200 km passando pelo Chile, Argentina, Uruguai e Sul do Brasil), Expedição Titicaca, Sertão Nordestino, além das travessias do Pantanal, das Chapadas Diamantina, dos Guimarães, dos Veadeiros e da Serra da Canastra. É fundadora e coordenadora do Clube de Cicloturismo do Brasil e fabricante dos alforjes Arara Una (www.ararauna.esp.br).

Este texto foi escrito por: Eliana Garcia*

Last modified: dezembro 7, 2005

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