A fachada do Shopping Morumbi em São Paulo teve trabalho de técnicas verticais (foto: Divulgação)
Dia de Natal chegando, shoppings centers e fachadas de prédios enfeitados, árvores de Natal gigantes, tudo muito lindo e grande não? E alto! Pois é, você já parou para pensar como que os grandes shoppings e prédios das avenidas movimentadas fazem para montar essa estética natalina?
Cada vez mais, montanhistas e escaladores estão se especializando na arte de montar essas mega estruturas para prédios altos e construções cujo nível de se atingir um cume é tarefa para profissionais em técnicas verticais.
No Rio de Janeiro, o shopping Rio Sul foi decorado em 20 dias consecutivos pelos montanhistas e especialistas no assunto Marcelo Krings e Walter Sávio Fonseca. Os dois, em conjunto com Nelson Bareta (que viaja para a Antártica anualmente, pelo Clube Alpino Paulista, para um trabalho de orientação e treinamento de cientistas na estação Comandante Ferraz) trabalham para a Cipolatti, um das mais requisitadas empresas do segmento.
Na região Sul do país, quem também trabalha no segmento é Elton Fagundes, da Stonehenge, que faz a decoração do prédio das Lojas Pernambucanas em São Paulo desde o ano passado, na esquina da avenida Paulista com a Rua da Consolação, além de recuperação de fachadas e trabalhos de limpeza em indústrias.
Em São Paulo, com tantos shoppings centers na capital brasileira do consumo, são vários os casos de shoppings e prédios com decoração em altura e para isso existem empresas especializadas. Nesse mercado de soluções em ambientes verticais, somam-se a Vertical Pro, a Tectom e Adventures, e no Paraná a Climb Clean.
Para que todo esse trabalho seja desenvolvido com segurança é necessário seguir protocolos e recomendado usar equipamentos especiais, e não os de escalada esportiva ou de rocha.
Jussara Nery, responsável pelo atendimento de equipamentos profissionais de técnicas verticais da Serelepe, importadora e fabricante de produtos para esta finalidade, alerta para o uso de cintos integrais por estes profissionais e não as conhecidas cadeirinhas (ou bouldrier).
“O profissional de altura precisa ter as mãos livres para executar o trabalho e por isso os pontos de apoio laterais do cinturão devem ser utilizados. No caso de queda os pontos de apoio são o tórax e dorsal, e não o abdômen, como são nas cadeirinhas tradicionais de escalada. Isso evita com que ele vire de ponta cabeça, por exemplo.
Colaborou Daniel Costa.
Pense em um shopping center no Brasil com decoração complicada, alta, cuja instalação vem desde o teto: Alameda Shopping em Brasília? BH Shopping e Diamond Mall em Minas Gerais? Castanheira Shopping Center no Pará? Morumbi Shopping, Center Norte, Shopping Ibirapuera e Jardim Sul em São Paulo? Prédios como Bank Boston, Itaú e Savoy, entre muitos outros.
Todos tiveram uma mãozinha com cordas especiais, equipamentos de proteção e orientação de profissionais de técnicas verticais para fazê-los chamar ainda mais atenção dos consumidores no período de Natal.
A Cipolatti é uma das empresas mais conhecidas para esse tipo de decoração especializada, tanto que atende shoppings centers no Chile, Argentina, Uruguai, México, Panamá e El Salvador. Este ano, a mesma equipe que montou a decoração do Shopping Rio Sul, coordenada pelo montanhista, arquiteto e empresário de educação ambiental (Uggi) Marcelo Krings, montou mais duas decorações de shoppings no Chile, que serão desmontadas em janeiro.
“Tem um shopping em São Paulo que as únicas formas de chegar é montando uma estrutura de andaimes – o que leva um tempo considerável e nunca disponível – ou contratar um alpinista. Ao invés de ficar dois dias montando estruturas e fechar uma sessão do shopping, podemos na mesma noite pendurar uma corda e acessar o telhado, por exemplo. Às sete horas da manhã já está tudo pronto, ninguém nem percebe que foi realizado um trabalho lá durante a noite”, explica Krings.
Dependendo do orçamento do shopping center e de sua exigência de decoração, os profissionais de trabalho em altura podem chegar a ficar 20 dias consecutivos montando a decoração do shopping ou de fachadas de prédios. Claro, não pense que você vai fazer suas compras de Natal e vai cruzar com desses escaladores e sua equipe montando o pêndulo que cai do teto ou o cume da árvore de Natal. Eles trabalham de noite, quando o shopping fecha. E depois, mais 20 dias de desmontagem dessas instalações.
Há casos até que eles podem opinar e mudam alguns detalhes importantes para a segurança – no projeto de decoração da empresa que os contratou. No caso das Lojas Pernambucanas em São Paulo, em 2004, Elton conta que pediu para mudar a estrutura metálica que segurava a estrela da árvore de Natal, que tinha mais de 20 metros. A estrela, que fica no cume da árvore tinha 8×16 metros estava muito pesada.
Colaborou Daniel Costa.
Há 10 anos trabalhando como o chamado mercado de trabalho em altura, utilizando técnicas verticais, Elton Fagundes, do Rio Grande do Sul, também comenta a diferenciação dos equipamentos utilizados pelos profissionais que montam essas estruturas e decoram os locais a mais de 30 metros do chão.
Os equipamentos específicos são homologados pela divisão do Ministério do Trabalho, pois existem exigências para que evitamos ao máximo acidentes, pois os contratadores estão sujeitos à leis vigentes em caso de acidente de um dos trabalhadores, explica Elton. Os procedimentos exigidos nesse tipo de escalada industrial, como eles chamam, são específicos e há cursos para isso, ministrados pela própria empresa dele e também pela Vertical Pro, sediada em São Paulo.
Esse não seguimento do procedimento é o que mais causa acidente nesse trabalho, complementa Elton, que dá como exemplo a técnica de descida vertical conhecida como rapel, que constantemente ainda mata e causa acidentes, principalmente no turismo de aventura, quando mal ancorado, ou com equipamentos inadequados, ou mesmo inexperiência do instrutor na descida do cliente ou despreparo na hora de um resgate de emergência.
Um dos maiores exemplos de despreparo e não ter procedimentos no alpinismo industrial é ter de trabalhar com duas cordas, uma do seu trabalho e outra e a linha de vida, que vai o seu trava queda. O que acontece com alguns escaladores esportivos que entram na área sem a adequação exigida? Eles usam um jumar, um ascensor, um blocante shunt como trava quedas. Isso não é um trava quedas para o ambiente profissional, explica Elton.
O trava quedas é um equipamento de proteção individual (EPI) e permite que o profissional se movimente normalmente na vertical, sem risco de queda. Por isso, os clientes, que são os shoppings centers e grandes empresas têm de ter cautela na contratação desses serviços, porque a concorrência na hora de acertar o valor de um trabalho certificado e de um escalador comum é muito diferente, principalmente devidos aos cursos de resgate e especialização que esses montanhistas ou não fizeram e porque os equipamentos que se usam no ambiente vertical industrial são pelo menos 3 vezes mais caros que os de escalada esportiva.
“São técnicas e situações completamente diferentes do que se escalar na montanha e quando o ego do escalador é grande, ele pode acabar confundindo as atividades e achar que pode fazer o mesmo tipo de trabalho que nós e outros profissionais treinados para isso, que temos horas de cursos com esse tipo de técnica vertical, complementa ele.
Colaborou Daniel Costa.
Da troca de uma simples lâmpada, instalação de decoração de fim de ano em shoppings, passando pelo conserto do teto de ginásios e treinamento dos bombeiros até engenhosos projetos e mapeamentos de grandes estruturas, os montanhistas também atuam no setor de telecomunicações. Mas de outra maneira.
É o caso de Tomás Papp, engenheiro mecânico formado em 1993 pela Unicamp, montanhista e companheiro de faculdade de Vitor Negrete e Rodrigo Raineri.
Há dois anos, Tom trabalha em ambientes verticais industriais, prestando serviços para empresas de engenharia quando o ambiente vertical é um problema para eles. No caso, grandes empresas de engenharia que precisam resolver problemas nas alturas.
Ainda na faculdade, Vitor, Rodrigo e eu tínhamos a idéia de resolver problemas especiais em altura, mas nunca conseguimos trabalhar com isso. Achávamos que essa habilidade de trabalhar em ambientes verticais podia ser um diferencial profissional, mas não conseguimos fazer isso funcionar como trabalho em um primeiro momento, conta.
Tom fala que a vantagem principal de se contratar profissionais na área é a agilidade no processo e garante que o trabalho é feito com segurança.
“Para torres de telefonia, por exemplo, tenho condições de trabalhar em duas torres no mesmo dia. O pessoal que trabalha com o procedimento convencional demora de três a quatro dias por torre.
O diferencial, explica Tom, é que ele utiliza outras tecnologias fora do campo de trabalho. Ou seja, leva o notebook para o campo e por GPRS transmite o relatório e as fotos do próprio local. Em um dos trabalhos, saiu do Rio Grande do Sul e mandou os resultados no dia seguinte para o cliente. “Na hora do almoço já estava passando os resultados por e-mail para meu cliente.
Para Tom Papp, o trabalho é uma forma de aliar a paixão pelas técnicas verticais e a profissão. Consegui juntar várias coisas que fiz separadamente na vida. É uma forma de usar um conhecimento que adquiri no montanhismo, a minha bagagem de agilizar soluções, com o fato de ser engenheiro.
Colaborou Daniel Costa.
Os trabalhos em altura realizados por alpinistas qualificados viraram moda por causa da relação custo/benefício/segurança, tanto para quem emprega como para quem trabalha.
Somos mais ágeis do que uma estrutura ou um caminhão. Chegamos dentro de nossos carros, com mochilas e equipamentos. Nós somos mais técnicos, uma mão de obra mais especializada, com mais responsabilidade e cuidados gerais na limpeza, conservação, trato com o cliente e principalmente na segurança, disse Nelson Bareta. Nosso tempo de ação é muito mais rápido. Reduzimos em até 80% o tempo de um trabalho de uma grande obra, de uma vistoria ou de uma fotografia, por exemplo, comentou.
Além de especializados nas técnicas verticais, alguns profissionais também têm conhecimentos que podem ajudar no caso de reparos ou avaliações de estruturas. É o caso de Marcelo Krings: Sou arquiteto de formação, o que quer dizer que é possível utilizar o conhecimento das técnicas e equipamento da montanha com um pouco da minha formação. Sei um pouco mais de materiais, estruturas e cálculos que são necessários para esse tipo de ação, exlplicou.
Prazer – Utilizar técnicas de montanha em ambientes artificiais torna-se um privilégio para aqueles que o praticam. Além de trabalho, realizar atividades em altura é um prazer para os montanhistas.
“Usamos uma série de técnicas que vem das pessoas da montanha. Fico feliz em poder aplicar essas técnicas em um trabalho. E, toda vez em que eu posso aperfeiçoar e adaptar essas técnicas, é uma satisfação poder transferir tecnologias, reconheceu Krings.
As pessoas perguntam quando vou tirar férias, quando vou me divertir em uma escalada. Eu vejo tudo como a parte de um dia-a-dia, o trabalho, a diversão e a responsabilidade fazem parte da minha vida. Me sinto por parecer que sou um privilegiado em gostar do que trabalho. Eu faço com muito gosto, com muita paixão, adoro os desafios que o trabalho em altura me proporcionam, contou Bareta.
Este texto foi escrito por: Cristina Degani
Last modified: dezembro 21, 2005