Voluntários no posto de abastecimento (foto: Andrea Fadiga)
Em meados de setembro de 2006, ao tentar me inscrever para o Cape Epic 2007, percebi que não havia mais tempo. A inscrição é feita através de uma loteria que semanalmente sorteia alguns atletas previamente inscritos. A inscrição para o ano subseqüente é aberta logo após o encerramento da prova.
Comecei a procurar no site oficial, alguma alternativa para me inscrever. Fucei um bocado e acabei percebendo que ainda havia algumas vagas para substituir atletas desistentes de alguns times. Tratei de verificar o histórico dos possíveis parceiros e não me adeqüei a nenhuma das opções. Por se tratar de uma prova longa e em dupla, a escolha certa do parceiro é essencial. Continuei a busca por uma vaga e acabei descobrindo que ainda havia algumas disponíveis para voluntários.
Como as inscrições para atletas já estavam encerradas, resolvi me candidatar a uma vaga no staff da prova. Preenchi uma ficha de cadastro, mandei para a organização e, a partir daí era só esperar por um e-mail de confirmação. Participar da prova na organização me daria a oportunidade de conhecer a estrutura, o clima, as características do percurso, alimentação, nível dos atletas e outras inúmeras informações inerentes à prova.
Meses se passaram e, finalmente no meio de dezembro do ano passado recebi um e-mail da organização confirmando a minha participação como voluntário na prova. À partir daí se dava o início de uma nova experiência, que estava só começando… Depois de alguns e-mails trocados com a organização, fui designado a trabalhar nos Water Points (pontos de abastecimento de água e alimento no meio do percurso).
A Prova – O Cape Epic é uma prova longa, realizada em duplas e que acontece em oito etapas (no ano que vem serão nove, a primeira será um prólogo) totalizando cerca de 900 km de prova. Cada etapa tem cerca de 115 km e a cada 30 km existe um ponto de abastecimento de água.
O percurso é modificado anualmente, mas sempre se inicia numa cidade belíssima situada numa região de montanha na costa do Oceano Índico chamada Knysna e termina próximo à Cidade do Cabo.
Desde a chegada a Knysna, era difícil conter a felicidade! No único dia livre que precedia o evento fomos conhecer a região, de bike, é claro! Fomos com a ajuda de um guia local, o Ian. Pedalamos em um parque chamado Rock Ville, inacreditável! Mais de 500 km de trilha, single tracks, down hills, pontes especialmente feitas para as bikes, escoras, riachos com água limpíssima (que muito me lembraram a Serra do Cipó, em função da água cor de Coca-Cola). Além disso tudo, uma vista maravilhosa do Oceano Índico e tudo mais que se tem direito!
Voltando do merecido passeio, me apresentei à direção da prova, mais precisamente ao responsável pelo trabalho voluntário para receber minhas primeiras atribuições. No dia seguinte, bem cedinho, às sete da matina, lá estava eu na secretaria da prova entregando os kits e dando algumas informações iniciais aos participantes.
É meio difícil expressar a emoção de estar num país totalmente desconhecido, em meio a inúmeras pessoas com quem nunca tinha tido contato, imerso em uma fantástica diversidade cultural e racial e, principalmente de trabalhar em um evento de tamanha grandeza.
Com certeza, a paixão pelo esporte me garantiu tal oportunidade! A grande oportunidade de estar em um ambiente composto 100% por pessoas que têm o Mountain Bike como meio ou estilo de vida!
No outro dia, mais cedo ainda, daria o início do trabalho de campo e, já conhecendo minha equipe de trabalho, partimos pra uma jornada que só terminaria oito dias mais tarde!
Designado a trabalhar nos pontos de água, todos os dias era um prazer acordar por volta das 4h45 para que às 5h30 já estivesse pronto pra me deslocar ao local atribuído. Saíamos todos os dias em comboio. Como algumas vias eram fechadas para a passagem da prova, até às 7h já tínhamos de estar no local onde a estrutura de abastecimento seria montada.
Alguns pontos de abastecimento às vezes coincidiam com pontos de observação para o público. Quando isso acontecia, tínhamos companhia e, sempre um ou outro se oferecia pra nos ajudar.
Ao todo éramos cinco grupos (os Water Boys) formados cada um deles por cinco voluntários e o motorista do caminhão. A maioria dos voluntários era composta por pessoas que, como eu, queriam garantir a vaga para participação na próxima edição da prova e, os demais eram esposas, namoradas ou amigos de competidores.
Dependendo da escala diária, trabalhávamos na largada e chegada, WP1, WP2 ou WP3. Cada ponto com a sua característica própria, mas em comum todos os voluntários estavam sempre super bem dispostos e a fim de colaborar com a organização e com os competidores.
O melhor retorno deste trabalho era a gratidão de todos os atletas. Todos sem exceção com um enorme sorriso no rosto. A gente que corre, sabe exatamente o que é encontrar no meio do nada, uma barraca cheia de gente pra ajudar com água, Coca Cola, isotônicos gelados, frutas, barras energéticas, sombra e muito, muito apoio técnico e moral!
Ao final do dia íamos para a Race Village onde encontrávamos amigos, cerveja gelada e toda a estrutura montada novamente. Pontualmente às 18h30 dava-se o início do jantar que se estendia até as 20h, sempre precedido de apresentação de grupos locais, uma pequena edição do vídeo da respectiva etapa e a premiação com a entrega das camisas dos líderes e, finalmente o briefing da etapa seguinte.
Às 22h as luzes do Race Village se apagavam e quem não tinha dormido ainda, provavelmente passaria a noite trabalhando. Na maioria, mecânicos, cozinheiros e demais operários que já estavam montando ou desmontando a estrutura.
Foram ao todo, oito dias de prova. Uma experiência fantástica e inesquecível! Surpreendente, não só pelo povo ou pelo país que são soberbos, mas principalmente, pela estrutura da prova, a logística, a consideração com os atletas, patrocinadores e colaboradores! Quem sabe um dia a gente chega lá!
O agradecimento estampado no rosto de cada um foi, sem dúvida a maior remuneração que eu poderia receber! E com que satisfação!
Em cada cidade ou vila que acolhe uma etapa, é montado um Race Village, o qual consiste em um mega-acampamento com uma estrutura de deixar qualquer um de boca aberta!
No total das pessoas envolvidas, soma-se em média 1500 participantes. Destes, cerca de 1.200 são corredores (mais ou menos 600 duplas), 45 são voluntários, tendo ainda a equipe médica, a mídia e, mais ou menos 150 pessoas contratadas, entre elas motoristas, cozinheiros, mecânicos, operários e por aí vai.
Para acolher essas 1500 pessoas é montada diariamente uma infra que consiste em:
Para que tudo funcione perfeitamente, há um ótimo trabalho de logística, o que é essencial. Existem por exemplo, dois kits de barraca que funcionam da seguinte maneira: enquanto a prova se desloca para a próxima vila, um grupo de trabalhadores já tinha ido anteriormente para o respectivo local levando um kit de barracas para já fazer a montagem do acampamento e, o outro kit que acabava de ser desmontado, já era também imediatamente levado por outro grupo para a etapa subseqüente e assim por diante.
É incrível como tudo acontece exatamente como programado. Todos os dias a largada se dá às 07h30, e cada dupla tem que concluir a etapa até as 17:00 hs. Ao chegar no final da etapa, o competidor em pouco tempo já tem o seu resultado provisório afixado no respectivo quadro.
São cinco pontos de abastecimento diários: um na largada, três durante o percurso e o último, na chegada. Cada ponto desse, continha 3.000 litros de água gelada, mil litros de bebida isotônica; 100 grades de Coca Cola, milhares de barras energéticas, frutas (apenas no segundo posto do circuito, km 60) e banheiro químico.
Junto a cada Ponto de Abastecimento de Água têm uma tenda mecânica e outra médica
Este texto foi escrito por: Eduardo Soares
Last modified: maio 1, 2007