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A logística para organizar uma prova com 320 atletas e 733 quilômetros de percurso sem corte


Cada equipe tem quatro caixas de bikes cinco caixas de plástico e duas bolsas para canoagem (foto: Alexandre Carrijo)

O organizador da Brasília Multisport, Alexandre Carrijo, está na Tasmânia (Austrália), na organização do ARWC, campeonato mundial de corrida de aventura. A prova começou na quarta-feira (dia 2 na Austrália, ainda terça no Brasil). Leia aqui notícias da equipe brasileira Oskalunga, que está na competição. A seguir, Alexandre fala da logísitica para se organizar uma prova com 320 atletas e 733 quilômetros de percurso sem cortes.

Organizar um Adventure Race World Championship (ARWC) desse porte é uma aula de logística. São 80 equipes (71 mistas e nove formada apenas por homens), num total de 320 atletas de 25 países. Além dos competidores, mais 21 pessoas da organização e 49 voluntários de vários países (eu me incluo neste time) são responsáveis por fazerem com que os equipamentos dos competidores estejam na hora e lugar certo. Ainda participam 17 convidados VIPs e mais 22 jornalistas. Somando, são 429 pessoas diretamente ligadas à prova.

O nome oficial do evento é XPD uma redução da palavra expedition. Ele está na sexta edição e pela primeira vez vale como o ARWC. O logo é “As Much an Expedition as a Race”. Ou seja, ela é tanto uma expedição quanto uma corrida. O casal Craig e Louise Bycroft organizadores do XPD já foram oficiais militares. Ele do exército australiano e ela da marinha britânica. Eles são casados e têm dois filhos pequenos. Antes de organizarem eventos esportivos, tinham justamente funções de logística na carreira militar. Este fato certamente explica algumas características da prova. Por exemplo, no race book estava escrito que a largada seria pontualmente às 9h. Mesmo com discursos e problemas de última hora, o programado foi cumprido à risca.

Outra característica significante é que a prova não tem cortes de percurso para equipes retardatárias, como na maioria das corridas de aventura a previsão é que a primeira equipe complete os 733 quilômetros entre cinco e seis dias e que as últimas em até 10 dias. Para se ter uma ideia, o maior evento do gênero no Brasil, o Ecomotion, é feito em quatro dias pelos primeiros colocados e em seis dias e meio pelos últimos. Sendo que sempre há, no mínimo, dois cortes de percurso, um deles que tira de vez a equipe do jogo.

E não ter cortes significa que a organização tem de cuidar de uma vasta área de prova, que naturalmente separa os times que brigam pelo título daqueles que só desejam terminar. A organização tem de disponibilizar todos os serviços necessários para os 53 postos de controles (como transporte da pessoa que cuida dele e alimentação), mais comunicação, resgate, apoio para a mídia e, ainda, transporte de equipamentos dos 320 atletas. Não é pouca coisa.

Cada equipe tem quatro caixas de bicicletas, cinco caixas de plástico para equipamentos e alimentação e duas bolsas para itens ligados à canoagem. Fazendo as contas, são mais ou menos 880 itens a serem transportados ao longo de todo o percurso e em diferentes tempos tudo com total precisão. Imagine a frustação de uma equipe ao ter seu ritmo atrapalhado pela ausência de algums desses itens. A prova é composta por três trechos de canoagem, cinco de mountain bike e quatro de trekking. Ou seja, 11 áreas de transição que necessitam de apoios transportando caixas e demais coisas. E o que eu notei até agora foi uma enorme precisão neste trabalho, feito por pessoas muito bem treinadas.

E em corrida de aventura tudo pode acontecer. E realmente acontece. Só nas primeiras 48 horas de prova, os times já estão bem espalhados pelo percurso. Enquanto os primeiros colocados já ultrapassaram os 300 quilômetros, um terço das equipes ainda não atingiu o quilômetro 160.

O mais impressionante é que os diretores de prova não aparentam estresse. Eles até têm tempo de conversar com mídia, população local e até próprios atletas, nas áreas de transição. Toda a prova parece funcionar independentemente da supervisão direta deles que, assim, ficam com a atenção voltada para as situações inesperadas e os problemas de competitividade entre as equipes que brigam pelo título. Sem duvida, uma lição a ser aprendida.

Essa capacidade de disponibilizar o percurso aos atletas por tantos dias lembra os bons tempos do Eco-Challenge. Isso também faz com que mais equipes desejem participar, pois há a garantia de conhecer todo o percurso, mesmo sem ser um superatleta. O que também é bom para o evento sob o ponto de vista financeiro: neste mundial, as 12 equipes que ganharam as provas qualificatórias pelo mundo não pagaram inscrição, mas os outros 68 inscritos desembolsaram 7 mil dólares australianos, que tem cotação semelhante à moeda dos Estados Unidos. Ou seja, uma receita de inscrição de “apenas” 400 mil dólares americanos.

Este texto foi escrito por: Alexandre Carrijo, especial para o Webventure