Webventure

Abrigo Bridwell / De Agostini: Legado cultural ou impacto ambiental?

Amanhecer na via <i></img>Normal</i> da Agulha Poincenot (foto: Alexandre Portela / Revista Headwall)” /><br /></br>
Amanhecer na via <i>Normal</i> da Agulha Poincenot (foto: Alexandre Portela / Revista Headwall)</div>
<p>No dia 6 de dezembro de 2006, cumprindo com as resoluções do novo plano de manejo da Área Norte do Parque Nacional Los Glaciares (área que compreende os grupos do Cerro Torre e Fitz Roy), foi demolido o Refúgio de madeira e lona do Acampamento Bridwell (posteriormente De Agostini), na base do grupo de montanhas do Cerro Torre.</p>
<p>A medida gerou polêmica entre os montanhistas que freqüentam a região. Segundo a direção do Parque Nacional, “ambientes naturais como estes não deveriam ter estruturas, refúgios, albergues, nem hotéis de várias estrelas, mas apenas locais onde seja possível, a todos os habitantes do planeta que chegam aqui, montar a barraca, permanecer o tempo que se desejar, e ainda por cima, não precisar pagar nada por isso”. O mesmo plano de ação será adotado na cabana localizada em Rio Blanco, acampamento base para o grupo do Fitz Roy.</p>
<p>Além da demolição das cabanas, cavalos estarão proibidos nas trilhas do Parque a partir de setembro de 2007, devido a erosão acentuada que causam nas trilhas. A partir da temporada 2007-2008, tanto escaladores como caminhantes terão que carregar todo o seu equipamento e comida nas próprias costas.</p>
<p>Sem dúvida nenhuma a filosofia do Parque busca minimizar o impacto ambiental, e maximizar a experiência do contato direto do visitante com a Natureza. Medidas muito válidas, por um lado, porém em relação ao Abrigo, não levam em conta o valor histórico, ou o legado cultural de montanha que este representa. É nesse ponto que se dá o debate. Seria mesmo o Abrigo um patrimônio histórico do montanhismo?</p>
<p><b>Opiniões divididas</b> – O montanhista chileno Rodrigo Fica Pérez comenta: “As medidas parecem ser oportunas e lógicas, com as quais não posso estar mais do que de acordo, porém considero a demolição do Abrigo um erro grave. Não permitir novas reformas e impedir o uso do Abrigo, dada a nova realidade geográfica-populacional, é compreensível, mas “destruir” as cabanas se traduz em um excesso, pois não leva em conta que tais “cabanas”, embora pareçam apenas paus empilhados e plástico ao simples olhar, fazem parte da história do Montanhismo, e conseqüentemente, são um patrimônio cultural de todos nós.”</p>
<p>Rolando Garibotti, experiente montanhista argentino que freqüenta a região há muitos anos, discorda da opinião de Rodrigo Fica. Segundo ele, “É triste e custa aceitar o fato que devido ao aumento no número de visitantes   10 vezes maior que há 15 anos   a “patagônia perdida e selvagem”, a “patagônia dos sonhadores”, desapareceu nesta zona. O resultado deste acréscimo de pessoas é a degradação do ambiente natural circundante, o qual tem forçado os parques a tomar certas medidas que a primeira vista podem parecer drásticas. A proibição do uso da lenha para fazer fogo, em vigor há dez anos, as limitações no uso de cavalos em 2006, a proibição dos mesmos para a próxima temporada (2007-2008), e a retirada das estruturas permanentes ali existentes (as cabanas), me parecem medidas acertadas e coerentes com o objetivo de preservar o ambiente natural em sua forma mais prístina. Já que El Chaltén oferece toda classe de serviços, me parece adequado concentrar ali o impacto o mais possível, proibindo qualquer tipo de construção e estrutura semi-permanente dentro da área protegida. </p>
<p>Quanto ao valor histórico da cabana, cabe destacar que a original foi construída há relativamente pouco tempo, em 1986, tendo sido ampliada (triplicada) em 1994. É curioso que há três anos, quando o Parque reconstruiu a “primeira” cabana em Rio Blanco (demolindo a original, construída por Don Whillans e os irlandeses em 1963), não houve nenhuma queixa. Isso me leva à conclusão que o argumento acerca do valor histórico se utiliza apenas por conveniência. Por outro lado, é preciso observar que o Parque carece dos recursos necessários para preservar as cabanas como “museus” sem que estas se transformem em um acúmulo de lixo e ratos, como estão hoje em dia. Os escaladores são 0,4% dos visitantes, uns 200 dos 50.000 que visitam a região todos os anos. Considerando isso e o fato que nós escaladores raramente contribuímos com muito mais além de críticas, não me parece justo pedir que o Parque assuma a responsabilidade e dedique seus recursos na preservação deste suposto “patrimônio histórico” nosso. </p>
<p>Quanto à real utilidade da cabana do Ac. De Agostini, esta não acomodava mais do que 8 a 10 pessoas por vez, um número insignificante em relação à quantidade de visitantes que o Acampamento recebe. Normalmente na porta havia um cartaz que dizia “climbers only” (somente escaladores), como se por alguma razão o nosso reduzido grupo de usuários tivesse algum direito especial em relação aos outros visitantes. A parte interna era um lugar escuro e úmido, útil dez anos atrás, quando o fogo era permitido, mas muito pouco cômodo hoje em dia. Todas estas razões e muitas outras me levam a apoiar a decisão do Parque em desmontar as cabanas.”</p>
<p>Ainda assim, para muitos, existe um tremendo peso e valor sentimental das cabanas na história do montanhismo local. É como pensam alguns integrantes do Centro Andino El Chaltén, que se colocaram contra a demolição. Em nota de 28/12/06 informam: “Consideramos (a demolição) arbitrária e prejudicial ao nosso meio da escalada. A cabana, erguida há mais de 15 anos por escaladores e sonhadores de todo o mundo, ainda que precária em sua estrutura, era toda feita com materiais do próprio local (troncos e madeiras), que não alteravam em nada a paisagem circundante. Além do mais, cumpria uma importante função relacionada com a atividade de montanha, trekking, escalada e recreação, servia de refúgio durante as tormentas (que aqui são freqüentes), e como hospital improvisado no caso de acidentes.</p>
<p>Consideramos também que a cabana era parte do nosso patrimônio cultural, um referencial da nossa história como povo da montanha e como escaladores, que em livros, textos, e filmagens de famosos andinistas, serviu de inspiração e como um marco geográfico. Existem portanto razões culturais, históricas, geográficas, literárias e sentimentais, pelas quais repudiamos o dano e a destruição do dito Refúgio, ainda mais quando esta comunidade e suas instituições relacionadas não tenham sido consultadas nem informadas previamente, para que pelo menos alguns dos objetos que agora estão desaparecidos pudessem ser conservados para um futuro museu. Não devemos nos esquecer que os primeiros a visitar estas terras foram escaladores e que a nossa curta história está baseada nas estórias das montanhas principalmente. Esperamos que acontecimentos como estes não voltem a se repetir e pedimos às autoridades que não destruam nosso patrimônio cultural, já que nessa parte do mundo nossas montanhas são a nossa cultura.</p>
<p><strong><em>Este texto foi escrito por: Filippo Croso</em></strong></p>
</body></html>