Nesta Semana do Meio Ambiente, o Webventure apresenta uma inédita série de reportagens sobre os impactos ambientais causados pelos esportes de aventura. Infelizmente, conclui-se que não há atividade que não cause impacto – mesmo no trekking, há interferência. Mas há duas boas notícias. A primeira é que você, praticante, pode tomar cuidados para minimizar esses impactos; a segunda é que a preocupação de entender quais são os efeitos negativos das atividades e lutar para que sejam atenuados está crescendo entre organizadores de eventos e até Prefeituras.
Essas reportagens foram publicadas integralmente nas estações dos esportes correspondentes e agora estão reunidas neste Aventura Brasil.
Para muita gente, classificar o off-road entre os esportes de natureza é uma contradição. Apesar de as trilhas em terra, ou seja, na natureza, serem o palco desta atividade, o fato de andar por aí soltando fumaça, fazendo barulho, escavando o solo com os pneus e derrubando árvores para fazer atalhos ou ancoragens está longe de ser o comportamento de quem se preocupa com o meio ambiente, idéia associada aos praticantes de esportes de aventura.
O Webventure ouviu dois especialistas e eles garantem que é possível fazer o off-road sem causar grandes impactos ao meio. O impacto zero não existe, mesmo uma caminhada, lembra João Roberto Gaiotto, Consultor Webventure e que dá cursos da modalidade por todo o país.
Jalapão já sofre – Gaiotto diz que as regras principais são dar preferência a locais já degradados para praticar o off-road, pois o impacto será menor; e, em meio à natureza, deve-se andar sempre pela trilha que já existe. Ora, se o desafio para o jipeiro é passar por um terreno difícil, ele que vença o atoleiro ou aquele buraco e não abra um novo caminho para contornar o obstáculo, diz.
Gaiotto avisa que os atalhos já estão comprometendo regiões como a do Jalapão (TO), considerada uma das mais desafiadoras para os praticantes de off-road. Tem gente que para fugir do areião passa por cima do cerrado. A vegetação morre e aquilo ali vai virar areia, então o próximo que vier vai abrir outro caminho pelo cerrado para evitar aquele local e assim por diante.
Nas áreas protegidas – Andar com o carro ou a moto locais proibidos, como as áreas de preservação, é crime. Não adianta dizer que o problema nesses locais é que não há fiscais para coibir a entrada… Se a gente não respeitar por iniciativa própria essas restrições, daqui a pouco vão haver leis que vão proibir toda a atividade. É o que acontece na Europa, por exemplo. Na Alemanha, você não consegue fazer o off-road em lugar nenhum. Na Inglaterra, para andar numa propriedade particular você precisa de 200 autorizações…, alerta João Roberto Gaiotto.
Jurandir Lima, formado em MBA na área de Engenharia da Qualidade Ambiental, realiza expedições a Parques Nacionais a bordo de um veículo off-road, claro, respeitando as restrições de circulação de veículos nesses locais. A verdade é que dos 48 Parques Nacionais que existem hoje no Brasil cerca de seis têm estrutura para a visitação, que inclui orientações ao visitante de onde ele pode seguir de carro e onde é proibido, diz.
Leia mais sobre os impactos do off-road e como poderá minimizá-los.
Lenta e gradualmente, alguns apaixonados por montanhismo têm viabilizado projetos com o objetivo de preservar a natureza nas alturas. Coordenado pela Federação de Montanhismo do Estado de São Paulo (Femesp) no ano passado, o programa “Adote uma Montanha” é um dos mais ativos do país.
Através dele foram formados grupos responsáveis por determinadas montanhas. Cabe a esses voluntários cuidar da limpeza, orientação e manutenção da fauna e flora dos locais. Cada grupo é cadastrado e fica com a incumbência de realizar relatórios com fotos sobre a situação de seus picos, explica Silvério Nery, presidente da Femesp.
Dez grupos espalhados pelo estado de São Paulo participam do “Adote uma Montanha”. Mas ainda é pouco diante da popularização que os pontos de escalada vêm sendo submetidos. Essas áreas estão sofrendo com o volume muito grande de gente que circula, conta Silvério.
O caso Marins – O ato de escalar nunca esteve tão na moda quanto atualmente. No entanto, a infra-estrutura para abrigar os praticantes não acompanha tamanha demanda. Nessa equação, o maior derrotado é sempre o meio ambiente.
Foram essas circunstâncias que levaram o Pico dos Marins ao estado em que se encontra hoje, afirma o presidente da Femesp, em referência à montanha próxima a Piquete, no estado de São Paulo. Quem for lá hoje achará o local maravilhoso, mas não se compara ao que era há sete anos, acrescenta. Desmatamento, sujeira e um contingente de pessoas bem acima do viável são algumas das novas características do Marins. Ele nunca mais vai ser o que foi.
A solução para minimizar os impactos ambientais decorrentes da prática de escalada não é uma tarefa fácil. Encontramos muitas dificuldades para fazer funcionar o “Adote uma Montanha”. O fato de ser um trabalho voluntário acarreta em uma série de complicações, admite Silvério.
Nota da redação: recebemos um e-mail do internauta Dourado Neto, de Piquete (SP), onde está situado o Pico dos Marins, mencionado nesta reportagem. Ele informa que “hoje, para subir ao pico, o turista conta com monitores treinados e capacitados, orientando os visitantes a proteger a natureza. Foi também inaugurado um portal de entrada para o pico, além de ter sido asfaltada a estrada que liga Piquete ao bairro dos Marins e ainda calçamento na estrada que liga o bairro dos Marins ao pórtico da montanha.”
Leia dicas para dimimuir o impacto ambiental no montanhismo.
Fiscal da natureza ou causador de estresse no mundo subaquático. São duas posições opostas que podem ser atribuídas a um praticante do mergulho, conforme o seu comportamento e conhecimento da atividade.
Mergulhar requer a consciência de que se está entrando num mundo completamente diferente do que temos aqui na superfície terrestre: lá embaixo, vibrações e movimentos, por exemplo, tomam proporções muito maiores. Por outro lado, ao chegar a esse ambiente ao qual poucos têm acesso, o mergulhador tem uma visão privilegiada do que ocorre no litoral, nas cavernas, nos lagos e poderá descobrir e denunciar agressões ao meio.
Toque – O ato de tocar é apontado como um maiores impactos que um mergulhador pode causar ao ambiente subaquático. Mas também é atribuído como uma falha dos iniciantes. O fato é que não se deve, sem o preparo adequado, tocar em nada no fundo do mar. Muito menos mudar algo de lugar, como as pedras e estrelas-do-mar, a título de curiosidade.
O mergulho é um esporte em que não existe platéia, então há quem sinta necessidade de trazer à superfície um pedaço do que viu para mostrar aos amigos, explica Randal Fonseca, praticante há 30 anos e um dos mais experientes mergulhadores brasileiros, que hoje se dedica a dar instruções de segurança a profissionais do mergulho. Ora, é para isso que hoje existe a máquina fotográfica e a câmera para se filmar embaixo d´água. Se quer mostrar o que viu no mergulho, compre um equipamento desses e aprenda a usá-lo.
Na vertical – Até o ato de ficar em pé ou tocar o fundo com os pés pode ser um impacto. Para fazer algum ajuste do aparelho ou para tirar uma foto, às vezes a pessoa tende a ficar na posição vertical, golpeando o fundo com os pés. No fundo arenoso, o impacto é mínimo, mas dentro de uma caverna pode-se causar um distúrbio em sedimentos milenares. Por isso em naufrágios, por exemplo, não se usa nadadeiras, explica Randal.
Outro comportamento condenável é o de alimentar os peixes para atraí-los, levando comida para o fundo do mar ou atirando-a de dentro do barco. As interações danosas com o meio chegam ao absurdo de pessoas que cortam estrelas e ouriços para atrair outros peixes, lembra o biólogo Marcelo Szpilman, diretor do Instituto Ecológico Aqualung.
Pesca submarina – O próprio Marcelo Szpilman se declara praticante da pesca submarina. Não há nada demais se for pescar para comer, é natural. Infelizmente, quem está começando sai atirando em tudo, mas com a prática você aprende a selecionar. É uma atividade bem menos prejudicial do que a pesca de rede ou de anzol, diz o biólogo.
Se você mesmo pegou, sabe a procedência do que vai comer. Já aquele peixe que você deixou para comprar na peixaria você não sabe, talvez tenha sido pescado de forma predatória.Optar por ele não significa que a pessoa seja mais ecológica.
Szpilman lembra, porém, que a pesca submarina, realizada de forma errada, produz impacto no meio ambiente. O mero é uma prova de que a pesca submarina pode diminuir a população de uma espécie. É um peixe bobo, que não oferece muita resistência. Hoje está protegido por lei.
Leia mais sobre os impactos ambientais do mergulho e o que fazer para minimizá-los.
Engana-se quem pensa que o trekking não causa a degradação do meio ambiente. Apesar de ser um esporte que dispensa a utilização de equipamentos, como bicicleta, carro ou corda, a caminhada pode acarretar conseqüências irreversíveis à natureza.
Um dos primeiros problemas do trekking praticado de forma equivocada é o desmatamento. São comuns expedições em que pessoas destroem espécies vegetais sem qualquer necessidade. Na maioria dos casos, o corte de árvores ou plantas se dá para a abertura de uma área de camping.
Além de ir contra todos os conselhos de órgãos do governo e de preservação e proteção do meio ambiente, tal atitude acaba por descaracterizar fisicamente a natureza.
Contaminação das nascentes – Há ainda uma decorrência mais grave das expedições de trekking realizadas por pessoas sem consciência da importância da preservação ambiental. Diversos participantes urinam e defecam em nascentes de águas que são utilizadas pelas populações ribeirinhas.
Muitas nascentes na Serra da Mantiqueira estão contaminadas em razão da falta de desrespeito dos praticantes. E o pior é que as pessoas humildes que moram nessas localidades usam a água para beber e cozinhar alimentos, destaca Silvério Nery, presidente da Federação de Montanhismo do Estado de São Paulo (Femesp).
A maior parte das grandes provas de trekking apresenta estrutura que permite a limpeza das trilhas. Mas ainda é pouco. Precisamos evoluir muito no trabalho de conscientização, adverte Silvério.
Brotas, chamada capital da aventura no Brasil, e São Luís do Paraitinga, ambas no interior de São Paulo, estão dando exemplo de preocupação com os efeitos da aventura no meio ambiente. Nas duas, o rafting é a atividade principal e mais popular.
Em São Luís, o rafting é feito no rio Paraibuna e também há descidas em uma área de preservação ambiental, o Núcleo Santa Virgínia, entre São Luís e Ubatuba (SP), que faz parte do Parque Nacional da Serra do Mar. Para que atividade pudesse acontecer nesse local protegido, foi realizado um estudo pioneiro da capacidade de carga no rafting numa unidade de conservação com essa.
Da Costa Rica para o Brasil – O trabalho que começou na Costa Rica, com trilhas, e foi adaptado para o rafting por João Paulo Villani, diretor do núcleo Santa Virgínia. Este sistema foi implantado dentro do Parque por duas empresas, a Cia do Rafting e a Montana Rafting, que operam com base neste estudo desde 1999.
O estudo foi primeiramente apresentado na Adventure Sports Fair do ano passado, em São Paulo. João Paulo explicou que no rio em que trabalham, que tem 8km, são permitidas apenas 54 pessoas por dia e, além disso, os passeios são realizados apenas de quinze em quinze dias, que é o tempo que os bichos que vivem na região demoram para se ‘adaptar’ à presença desses visitantes no Parque.
Efeitos no Jacaré-Pepira – Agora imagine a presença de 15 mil pessoas durante quatro dias numa cidade de 20 mil habitantes. Esse foi o número de visitantes que Brotas recebeu no último Carnaval e os turistas se dividiram entre as diversas opções de esportes de aventura que a cidade oferece. Em média, na alta e média temporada, são feitas duas a três descidas de rafting por dia no rio da cidade, o Jacaré-Pepira.
Preocupada em saber qual o número ideal de descidas para que não haja impacto no meio ambiente e seja garantida a segurança dos turistas, a Prefeitura encomendou um estudo ao departamento de Ciências Florestais da Esalq, unidade da USP, de Piracicaba (SP).
Hora de agir – O estudo realizado pela Esalq, curiosamente, demonstrou que os piores efeitos para a natureza acontecem na baixa temporada: É no inverno, quando o rio está mais baixo, que a descida pode causar mais danos ao leito do rio, pois os botes encalham e batem nas pedras. Por outro lado, a freqüência de descidas cai muito nessa época por causa da baixa temperatura. Sendo assim, passamos a nos focar no que é preciso fazer pela preservação na alta e média temporadas, explica o diretor de Meio Ambiente da Prefeitura de Brotas, Ângelo Roberto Lazari Júnior.
Reunindo-se com empresários e guias, a Prefeitura está elaborando regras de controle do turismo local que auxiliem tanto na preservação do meio ambiente quando na segurança dos visitantes. Em novembro passado entrou em vigor o Plano Municipal do Turismo Sustentável. E nesta semana a Câmara Municipal aprovou a Licença Turística Ambiental, que deve ser tirada pelas operadoras que quiserem atuar na cidade.
Em paralelo, há 4 anos, vem sendo realizado o Projeto Rebrotar, que está levantando revitalizando as margens do Jacaré-Pepira e é uma iniciativa da Prefeitura, da Promotoria Pública e da ONG Rio Vivo. Brotas teve aumentada em 600 hectares sua área verde, comemora Ângelo.
Colaborou: Camila Christianini, especial para o Webventure.
A falta de consciência e respeito dos seres humanos para com a natureza é ainda nos dias de hoje a principal responsável pela agressão ao meio ambiente durante a prática de modalidades com biking.
Não se trata de uma situação habitual, mas existem diversos bikers que sujam os locais por onde passam. O lixo nas trilhas é o que causa maior impacto, confirma Paulo de Tarso Martins, fundador do Sampa Bikers, um dos principais clubes de cicloturismo e MTB do país.
Temos notado uma melhora gradual com relação à sujeira. Ainda assim, acho que a briga pela preservação da natureza não deverá parar tão cedo, prevê Paulinho, como é conhecido, com a experiência de mais de dez anos organizando eventos para atletas de mountain bike.
O lixo nas trilhas é mais comum em competições do que durante passeios. Quando estão em uma prova que vale pontos, medalhas ou qualquer coisa, as pessoas só pensam em vencer e se esquecem da importância de manter a natureza intacta, acrescenta.
Não deixe rastros – Para tentar minimizar o impacto ambiental, os organizadores de provas têm promovido pequenas campanhas alertando para a importância de não deixar rastros. Se você fez o lixo, cabe a você levá-lo até o final da prova, afirma Paulinho.
Em alguns casos, o alerta não é suficiente e são aplicadas penas nos bikers que jogam papéis de barra energética ou copinhos de água, durante as competições. Em enduros de regularidade, alguns competidores se desfaziam da planilha atirando-a no meio do caminho. Em razão disso, exigimos agora que todos entreguem suas planilhas no final da prova.
Outra maneira de degradação de ambientes outdoor é a pedalada em locais sem trilha. A passagem da bicicleta pela vegetação acaba por destruir espécies da flora brasileira.
Mais natural impossível – A conscientização dos bikers torna-se fundamental na medida em que a bicicleta ganha a cada dia mais mercado por seu caráter não poluente. Em vários centros do mundo as pessoas têm trocado os carros pelas “magrelas” quando percorrem distâncias curtas.
Está comprovado que, entre os esportes de aventura, o biking é o que menos causa impacto ambiental, ao lado do trekking. Quando conseguirmos educar nossos praticantes, alcançaremos uma integração excelente entre homem e natureza, conclui o fundador do Sampa Bikers.
Faça um esforço de imaginação e visualize aproximadamente 300 pessoas passando por uma mesma e estreita trilha, em um intervalo de tempo de duas horas. O resultado: a destruição parcial ou, em alguns casos, total das picadas e vegetações próximas a ela.
Essa é apenas uma das diversas conseqüências da prática de corridas de aventura. O esporte reúne várias modalidades em uma mesma prova e nem sempre a passagem do ser humano pela natureza é possível sem a degradação da mesma.
Para piorar, ainda existem alguns organizadores de eventos completamente despreocupados com o impacto ambiental. Infelizmente no Brasil o movimento para que se crie o respeito ao ambiente outdoor tem de partir dos organizadores. E nem todos eles estão ligando para isso, revela Evandro Schütz, responsável pela Corrida Canela de Aventura, realizada em Canela (RS).
União pela preservação – Vários estão interessados apenas no dinheiro que conseguem promovendo essas provas, acusa Schütz, que propõe a formação de uma liga de organizadores de corridas de aventura de todo o país a fim de viabilizar soluções que minimizem o impacto ambiental.
Enquanto essa não liga não sai do papel, ele e alguns outros responsáveis por provas nacionais têm buscado alternativas. A Expedição Carcará, disputada no Rio Grande do Norte, por exemplo, aposta forte na repercussão das atividades realizadas pelos competidores. Estamos sempre buscando formas de colocar o atleta como exemplo, explica Karim Hosam Salha. Nossa prioridade é poder despertar em toda a prova a consciência de que dependemos da natureza para fazer a aventura. Se a destruirmos, não haverá mais corrida de aventura.
Entre as iniciativas tomadas pelos organizadores da Expedição Carcará está a obrigatoriedade da plantação de mudas de árvores características da região para todas as equipes. Também procuramos passar por lugares em que exista algum tipo de agressão humana à natureza. Colocamos um rapel na Serra Caiada, onde uma pedreira está começando a destruir o local. A intenção de Karim em casos como esse é despertar a atenção dos atletas e da mídia.
Rotas alternativas – Organizador da tradicional Adventure Camp, Sérgio Zolino tem outras preocupações. Procuro sempre disponibilizar rotas alternativas, para diminuir a degradação. Na nossa prova também são cedidas garrafas a todos, a fim de evitar a utilização de copos plásticos que, invariavelmente, são jogados pelo caminho, conta.
Responsável pela Ecomotion, o organizador Said Aiach Neto espera finalizar até 19 de junho, data da prova na Serra do Cipó, um manual de conduta para o participante de corridas de aventura. Foram ouvidas várias pessoas especializadas em educação ambiental, inclusive o Instituto de Ecoturismo Brasileiro (IEB), para a realização desse manual, explica.
Said acredita que diversas discussões poderão ser feitas a partir do resultado inicial do manual. Queremos colocá-lo à disposição dos atletas e escutar sugestões, para que o manual possa ser lapidado. O maior vencedor com isso será a natureza, finaliza o organizador.
Este texto foi escrito por: Jorge Nicola e Luciana de Oliveira
Last modified: junho 6, 2003