Vista do vale Trinidad. (foto: Roberta Nunes.)
Esta viagem veio meio como uma boa surpresa. Confesso que ainda me sentia cansada da última e intensa aventura na Groelândia e estava conformada a passar este verão no desfrute de minha terra natal. Mas a história se formou quase por si só e quando vi lá estava eu e mais três bons amigos indo rumo ao desconhecido: as grandes paredes de Cochamo.
Este lugar de beleza impar e selvagem se encontra a 100km de Puerto Montt, no Chile , fazendo parte da cordilheira andina. Fazia parte da expedição Dálio Zippin e Maurício Clauzet, que formariam dupla e cuidariam da parte fotográfica e vídeo, e Karina Filgueiras e eu como dupla feminina a aventurar-se naquelas maravilhosas paredes, algo bem raro para duas brasileiras.
Resolvemos descer de carro os 3.500 km de estrada onde teve início nosso pequeno vídeo. Depois de quatro dias de muita poeira e estradas quase intermináveis chegamos ao pequeno vilarejo de Cochamo, onde contratamos cavalos que auxiliariam nosso transporte até a base das paredes do conjunto montanhoso Trinidad. Quase seis horas de caminhada por um terreno acidentado e um visual surpreendente, beirando todo o tempo um rio que descia desde o alto do vale. Cada vez que entrávamos para no vale mais selvagem se sentia o ambiente.
Depois de um longo e puxado percurso, chegamos na fabulosa base de um vale infestado de paredes que variavam de 500 a 1000 metros de altura, para tirar o fôlego! Descansamos e nos acomodamos bem em nosso novo lar por vinte dias, onde a lei era viver o presente e desfrutar daquela babilônia em granito.
Começamos pela menor agulha granítica, Gendarme, que já deu para tremer as pernas; o estilo de escalada exigia psicologia. Levou alguns dias mais de escalada antes de realmente nos sentirmos encorajadas a provar uma via mais difícil e comprometida. Tudo em seu tempo.
Por fim, chegou o dia. Escolhemos uma bonita via em estilo tradicional, ou seja, sem bolts, toda protegida em friends e fissureros, de 500 metros e de certa forma comprometida por não podermos rapelar por ela, na Pedra do Gorila.
No começo nos sentíamos um pouco tensas, mas a fluidez não tardou em chegar e subimos rápido e boa parte em simultâneo, tendo problemas apenas no final, onde infelizmente acabei me perdendo num sistemas de fendas nada agradáveis.
Por sorte e com tranqüilidade conseguimos resolver a situação e encontramos nossos amigos começando os rapéis. Com esta investida nos sentimos saciadas de aventura apimentada e com a certeza de que podemos seguir escalando juntas. Nada melhor que situações limitantes para se conhecer realmente.
Informações – Cochamo é um potencial em paredes para estilo alpino e big wall. A rocha é composta de sistemas de fendas em um resistente granito perfeito para friends tipo off-set, por apresentar suas fendas mais arredondadas.
Pode-se ir direto de Santiago, capital chilena, até Puerto Montt e pegar um pequeno ônibus para Cochamo. Vai o super toque também com relação ao lixo: é necessário trazê-lo de volta. Foi muito desagradável estar num lugar tão especial com marcas bem grandes de outros acampamentos de escaladores.
Aconselho uma boa dose de escalada em Salinas, no Rio de Janeiro, e Frey, em Bariloche, antes de se aventurar por aquelas lindas paredes que, sinceramente, são exigentes psicologicamente.
É necessário contratar cavalos para a aproximação e levar alimentação para o período integral de estadia. A época favorável é de dezembro a final de março e com sorte pode-se ter belíssimos dias ensolarados.
Não se assuste com a intensa visita de vários tipos de tábanos, parecidos com as nossas mutucas (mosquito) de rio, um pouco vorazes. Acredito ter ao todo 15 rotas de escalada conquistadas nestes últimos cinco anos por cordadas de várias partes do mundo. Qualquer dúvida entre em contato!
Este texto foi escrito por: Roberta Nunes