O Conquista tem pela frente 15 meses de expedição. (foto: Arquivo Projeto ??gua Viva)
Vindo do Sul do Brasil, Doutor Alberto, com seus olhos azuis tão alemães, sai do barco e conta uma história. A história do desperdício da água consumível, da sujeira nos rios. História triste, mas contada de um jeito que faz rir pescadores e moradores de vilas, bairros e cidades do nosso país. É este o objetivo final de uma expedição que parte em junho, de barco, rumo ao Amazonas.
A idéia é viver uma aventura e usar a arte do teatro para conscientizar os brasileiros. O projeto se chama Água Viva e é criação de dois jovens – Juliano Treis, de 30 anos, que trabalha na área jurídica, e a atriz Denise de Almeida, de 20. Eles apostaram tudo na vida dentro de um barco, hoje ancorado em Blumenau (SC), às margens do rio Itajaí-Açú. Para completar o novo estilo de viver, planejaram uma viagem e um nobre objetivo: falar sobre a água e o uso consciente deste recurso tão precioso.
A partida será em junho. Enquanto isso, Juliano, que também é comandante do veleiro batizado de Conquista, se reveza entre a logística da expedição e o trabalho na Justiça do Trabalho. Denise, hora está à máquina de costura, preparando os figurinos da peça teatral que motiva a expedição, hora ensaia com o companheiro os segredos de informar usando a comédia e indo até onde o povo está. Neste Aventura Brasil, conheça mais sobre o Projeto Água Viva.
Temos um amigo que foi marinheiro por muito tempo, hoje é artista plástico. Há cerca de um ano ele conversou com a gente sobre barcos a vela e vimos um veleiro na praia. Quando chegamos perto dele, lemos o nome: Conquista. Foi uma febre louca, quisemos comprar o barco naquele momento. Para pagá-lo, vendemos tudo, até a casa, e resolvemos morar no barco. É assim que Denise narra a decisão de mudar radicalmente seu estilo de vida.
Há seis meses, depois de se desfazer do carro e da casa herdada por ela, eles adotaram o Conquista como sua casa. Subiram com ele pelo rio Itajaí-Açu e agora ele permanece no antigo porto de Blumenau, uma cidade curiosamente colonizada com barcos.
Viver num deles não foi nada simples, inicialmente. É difícil se adaptar ao espaço restrito. Tínhamos muitos pertences, televisão, som, roupas, panelas… muito disso teve que ficar fora, lembra Denise. No veleiro de 23 pés (aproximadamente sete metros de comprimento), mal dá para ficar em pé dentro da cabine, conta ela. Tivemos de aprender que se pode viver com pouco. Até a nossa alimentação é mais natural, pois não temos condições de cozinhar aqui como em terra.
Poluição – Como aspectos negativos, Denise aponta a falta de privacidade: as pessoas que passam de ônibus pela estrada podem nos ver no barco; e, pior: a poluição naquele trecho do Itajaí-Açu. De vez em quando vem um cheiro ruim, outras vezes aparecem na água umas ilhas com espuma como de sabão, descreve. Mas ainda há muita vida aqui, convivemos com aves e capivaras, os peixes borbulham perto do barco quando chove.
A vontade de realizar uma viagem foi imediata, já que dispunham do barco. Mas Denise e Juliano queriam aliar a aventura a um propósito maior. Lendo um artigo sobre recursos hídricos, veio então a idéia de levar informações sobre o assunto por onde passassem. Denise escolheu um meio singular de promover a conscientização: o teatro. Já faço teatro há mais de seis anos e não queria parar. Unimos o útil ao agradável. E assim nasceu o Projeto Água Viva.
O Projeto Água Viva deve passar por 36 cidades, entre elas muitas capitais. Em cada uma delas, a idéia é apresentar dois a três espetáculos gratuitos. É aí que o Doutor Alberto entra em ação. O personagem é protagonista da peça escrita por Denise. É história de um cientista alemão que viaja de barco e chega com o objetivo de formar inspetores da água, conta a autora.
Alberto tem a ajuda de seu computador, que tem vida própria e deve ser responsável pelas risadas do público. O riso é encarado por Denise como uma forma de passar a informação e fixá-la sem exigir muito esforço dos espectadores. Numa das primeiras cenas, por exemplo, o cientista faz um cálculo maluco para mostrar uma estatística real e estarrecedora: quanta água se usa para o pão que a gente come no café-da-manhã. Mil litros de água, da plantação de trigo até o produto ser feito na padaria. Ou seja, a água que a gente consome não é só a que bebemos ou tomamos banho, destaca Denise.
Simples e interativo – Como num espetáculo a ser apresentado num teatro, a peça tem cenário de 3 metros por 1,90m, objetos cênicos e figurino. Tudo para caber em duas mochilas. O cenário é um computador gigante, onde também entramos para fazer as trocas de roupa. Ele foi feito com uma base de alumínio desmontável e um tecido que é colado com velcro. Na peça usamos um teclado e canoa, tudo de espuma, que é fácil de guardar e não pesa, descreve a atriz.
Quem encerrará o espetáculo, segurando a plaquinha de Fim vai ser sempre alguém da platéia, escolhido na hora. E todos levarão para casa a carteirinha de inspetores da água, como se realmente tivessem freqüentado o curso de formação do Doutor Alberto.
Juliano ficou responsável por levantar todas as informações da navegação do Itajaí até o rio Amazonas, destino-final da expedição. Compramos todas as cartas náuticas, levantamos as informações das cidades e dos rios por onde passaremos. E estudamos a melhor época para chegar ao Amazonas, que é a época fora do verão, a estação das chuvas, conta ele.
A partida será em junho. Dali, o roteiro aponta para as 36 cidades onde há paradas planejadas, contornando todo o litoral brasileiro passando pelo Paraná, São Paulo, Rio de Janeiro, Espírito Santo, Bahia, Sergipe, Alagoas, Pernambuco, Paraíba, Rio Grande do Norte, Maranhão, Pará e Amazonas. Uma das paradas será em Fernando de Noronha (PE).
Etapas curtas – A expedição é estimada para durar 15 meses. Calculei as distâncias em milhas náuticas e com uma velocidade baixa, de dois nós, para chegar ao Amazonas na época certa, conta Juliano. Um dos segredos para cumprir esta missão será fazer uma parada a cada dois ou três dias, em cidades com boa estrutura. No roteiro não ultrapassamos 200, 300 milhas sem uma parada. Exceto entre Noronha e Fortaleza e Fortaleza-São Luís, que serão etapas mais longas, descreve.
Para Juliano, a maior dificuldade serão os temporais, quando a navegação é mais difícil. Durante todo o tempo a dupla vai manter navegação costeira. Estamos preparados. A dificuldade mesmo é conseguir patrocínio para viabilizar esta expedição, assume.
O maior desafio – O Projeto Água Viva foi enviado à Fundação Catarinense de Cultura visando sua aprovação para usufruir dos benefícios da Lei Estadual de Incentivo à Cultura, segundo a qual a empresa patrocinadora poderá ter o retorno de 80% do valor investido através da isenção no ICMS. Nossa idéia é que a gente consiga recursos para viajar e apresentar gratuitamente o espetáculo a todos os interessados. Não queremos cobrar para assistirem.
Entre audiência direta, eles esperam atingir 20 mil pessoas com o espetáculo sendo realizado em praças, escolas, portos, fundações culturais. E o casal pretende levar consigo uma infinita tripulação de internautas, que já podem acompanhar os preparativos da expedição no site www.veleiroconquista.com
É Juliano quem finaliza, resumindo o sonho que ele e de Denise estão empenhados em tornar real: transformaremos portos, praias, praças e vilarejos em palco; pescadores, estudantes e turistas em platéia; o mar será o caminho; e, este projeto uma importante ferramenta para um mundo melhor.
Este texto foi escrito por: Luciana de Oliveira