Avaliação de atividade (foto: Daniel Costa/ www.webventure.com.br)
Quarta-feira, 16 de maio, 18h. Um grupo formado por guias e empresários de várias regiões do país vasculha a parte baixa do Parque Nacional da Serra dos Órgãos, em Teresópolis (RJ), atrás de um pesquisador desaparecido desde a segunda-feira. Alguns sabiam que era um simulado, outros demoraram para descobrir. O fato é que, de mochila nas costas, lanterna, comida, equipamentos de navegação e técnicas verticais, eles partiram para um exercício prático de busca e salvamento.
O teste foi uma das aulas do Curso para Coordenadores de Grupos Voluntários de Busca e Salvamento (GVBS), uma iniciativa da Abeta, em parceria com o Ministério do Turismo e sob responsabilidade da equipe da Grade VI, do montanhista Rodrigo Raineri. O curso durou a semana inteira, com aulas teóricas, práticas e palestras sobre diversos temas, desde orientação com bússola até burocracia brasileira e como captar recursos para o Grupo.
Os GVBS são grupos voluntários que serão formados em diversos destinos do país, que têm apoio do Programa Aventura Segura, da Associação Brasileira das Empresas de Turismo de Aventura. Estiveram presentes no curso da Serra dos Órgãos representantes do Rio de Janeiro, Teresópolis (RJ), Chapada Diamantina(BA), Bonito (MS), Lençóis Maranhenses (MA), Petar (SP), Florianópolis (SC), Quixadá (CE), Serra do Cipó (MG) e Chapada dos Veadeiros (GO).
Salvamento – Próximo das 22h da quarta-feira o grupo foi desmobilizado. Hora de descer das trilhas e voltar para dormir, porém, sem terem encontrado a suposta vítima. Na quinta-feira, com a luz do dia, as buscas se intensificaram. Reiniciaram às 6h, e a Globo local estava fazendo pressão, isso fez com que alguns que não haviam acreditado passarem a achar que era de verdade.
“O pesquisador foi encontrado às 7h30, levaram maca, imobilizaram e transportaram. Os alunos voltaram para base às 9h e teve quase uma hora de avaliação, comentou Ronaldo Franzen, o Nativo, montanhista e um dos responsáveis pela criação de um dos primeiros grupos voluntários do país, o COSMO, no complexo Marumby (PR).
Assim que foi a vítima foi encontrada, o exercício passou a focar na remoção com segurança. Nos dias anteriores a equipe de voluntários treinou técnicas de resgate e transporte de acidentados por maca. As habilidades e trabalho em grupo foram postas à prova. No fim, após mais de sete horas de trabalho, a vítima (que na verdade era um funcionário do Parque Nacional da Serra dos Órgãos) foi resgatada com sucesso e o exercício terminou.
Essa foi apenas uma das atividades do Curso para Coordenadores de GVBS. Saiba tudo que aconteceu no evento nos textos à seguir.
O primeiro dia do Curso de Coordenadores de GVBS foi voltado para teoria e prática de orientação. Cada aluno com sua bússola ouviu explicações e experiências de montanhistas como Rodrigo Raineri e Ronaldo Franzen, o Nativo. Dificilmente um acidente acontece quando o dia está claro, é sempre de noite, na chuva, quando as condições estão ruins e péssimas coincidências acontecem, comentou Rodrigo Raineri.
Nesses casos, orientação pelo sol, lua, estrela ou outros meios ficam prejudicados. Nativo explicou que existem alguns meios de fortuna para esses casos. O sol passa pela linha do Equador, como aqui no Brasil estamos ao Sul dela, geralmente existe mais sombra no lado Sul dos objetos do que em qualquer outro. Por isso, quando vemos um conjunto de árvores com mais musgo de um mesmo lado, por exemplo, esse lado é o Sul, informou.
Depois da aula teórica, que durou a manhã inteira, os alunos saíram com a bússola e um papel com informações como grau e distância em passos.O exercício: achar moedas no meio da trilha. Era preciso encontrar a moeda, depois medir o grau e contar os passos até a próxima. Isso foi para dar uma idéia de como é difícil encontrar rastros da passagem de uma pessoa pela trilha. Pegadas, lixo, galhos quebrados, tudo conta na hora do resgate, mas não é fácil. Tivemos locais, como nos Lençóis Maranhenses, em que uma pegada ou outro indício some muito fácil. Venta e a duna engole. É preciso agir com pressa e precisão, explicou Eduardo Schiavo, da Grade VI, instrutor do exercício.
A terça-feira também foi voltada para as aulas práticas. Mais uma vez com bússolas e contagem de passos os alunos foram levados até o mirante Alexandre Oliveira da Trilha Mozart Catão, local onde pode-se avistar toda a cidade de Teresópolis.
Estrutura – O dia ainda teve palestras sobre estrutura e capacitação do Grupo, com dicas de como se integrar com a comunidade, corpo de bombeiros locais entre outras comunidades. Meios de transporte e técnicas de rádio comunicação fecharam a noite.
Na quarta-feira, o comandante Jair Paca, do Corpo de Bombeiros de São Paulo, foi explicar como se criam os Núcleos de Defesa Civil (Nudec), e tirar dúvidas dos alunos voluntários. Os GVBS podem virar Nudecs em seus respectivos municípios.
Depois do almoço, na quarta, a tarde foi inteira destinada à imobilização e estabilização das vítimas, além do transporte em grupo. A aula prática ficou por conta de remover uma pessoa por entre as estradas e trilas do Parnaso, até o anoitecer.
Além da prática em busca, resgate e transporte, os alunos também aprenderam sobre burocracia, direito e captação de recursos. Em uma semana, o programa do curso tentou passar o máximo de conhecimento para que cada GVBS seja autônomo em todas as necessidades.
Gostei muito do curso, pois a partir daí, me sinto seguro e com muita confiança para alcançar os propósitos do destino Petar, que é turismo com segurança. Pra mim foi uma grande troca de experiências e realidades diferentes. Sempre estive preparado para assumir qualquer desafio, e o GVBS não poderia ser diferente, comentou Valmir dos Santos, representante do Parque Estadual do Alto Ribeira (Petar), conhecido pelo extenso complexo de cavernas próximo ao litoral sul de São Paulo.
Oficinas de Gestão e Manutenção, e Elaboração de Pré-planos estiveram no penúltimo dia de eventos. Segundo os Álvaro Barros, da Abeta, é preciso que cada destino desenvolva um plano de ação que abrange todos os passos para o resgate, desde o primeiro chamado até o trato com a imprensa. Durante o curso, várias dicas foram passadas e todas elas serão revistas nos cursos específicos para cada destino.
Outro tópico abordado e que para mim foi o mais importante é o da Gestão da Segurança, quando os voluntários aprenderam a realizar o inventário dos perigos e riscos dos atrativos, dimensionando assim seus planos de contingência e palnos de emergência. Com isso bem feito, estarão sempre um passo à frente dos acidentes. Eles aprenderam a importância em se trabalhar na prevenção de acidentes, comentou Nativo.
Para Paulo de Andrade, do Rio de Janeiro, o mais importante foi a integração do grupo. “O que mais gostei foi a disposição dos coordenadores de cada destino em querer aprender sempre mais, na troca de experiências e na união formada pelo grupo. Todos lutando por uma causa nobre, onde todos saem ganhando. No fundo é uma questão de cidadania”, disse.
Um dos temas mais esperados foi a consultoria jurídica, que ficou por conta de Vinícius Porto. Praticamente todos os voluntários tiveram dúvidas sobre quais os procedimentos legais devem ser tomados na hora de um resgate, e também quais responsabilidades poderiam cair sobre eles em caso de atendimento. O curso foi ótimo, na minha opinião. Além do gerenciamento de riscos, a parte jurídica foi importantíssima e esclarecedora, afirmou Adroaldo Vasconcelos, o Jubileu, um dos representantes da Chapada Diamantina.
Sem dúvida assumir um GVBS é um risco grande, porém já estávamos fazendo isso e sem respaldos. Agora em diante diminuíram os riscos, concluiu.
Este texto foi escrito por: Daniel Costa
Last modified: junho 1, 2007