Ventilador de painel virando pra lá e pra cá. Capa de tecido para proteger os bancos do gigante. No teto da cabine, o aparelho de CD ou um toca-fitas toque os sucessos do momento e a cama instalada logo atrás do encosto da poltrona convida para uma soneca. Um adesivo de Nossa Senhora Aparecida mostra a fé no cantinho do pára-brisa e uma frase de pára-choque, às vezes engraçada, às vezes homenageando um santo, é acessório indispensável. Acostumados com esse cenário cotidiano, os amigos da estrada não fazem idéia da diferença entre o caminhão Tatra da Equipe Petrobras Lubrax no Rally Paris-Dakar e os grandalhões que cruzam esse imenso Brasil.
No Dakar 2002, que começa dia 28 de dezembro em Arras, na pequena cidade a 250 quilômetros da capital francesa, cruzaremos 10.000 quilômetros por trilhas da França e Espanha, na Europa, e Marrocos, Mauritânia e Senegal, na África, terei a companhia (e a ajuda!) de dois competidores da República Checa, Tomas Tomecek e Mira Martinec. O nosso caminhão, refeito inteirinho para a prova, tem praticamente tudo. É uma verdadeira caixa de sobrevivência.
No painel da cabine levamos instrumentos de navegação, equipamentos indispensáveis para nos orientarmos no deserto. Afinal, não temos referências ou estradas; apenas areia, areia, areia e areia. O aparelho mais importante, nesse caso, é o GPS, que na tradução das siglas, em inglês, significa sistema de localização global. Ou seja, recebemos na pequena tela várias informações, como a latitude e a longitude. Para que os leitores da Carga&Cia entendam melhor o funcionamento do GPS, nós sabemos exatamente onde estamos no meio do Planeta. Mas por precaução, já que o pequeno aparelho eletrônico pode nos deixar na mão, é obrigatório o uso da boa e velha bússola. Se numa estrada desconhecida, com todas as referências e placas de sinalização, é sempre bom ter um mapa no porta-luva, imagine no deserto…
Para transformar o caminhão auto-suficiente, dentro do baú levamos quatro estepes, ferramentas, peças de reposição, placas para desatolar na areia, um bom cabo para rebocar outro veículo (ou ser rebocado), material de camping, comida, remédios, equipamentos de socorro e salvamento, um gerador a gasolina para termos luz à noite quando se faz a manutenção e também para a solda elétrica, 50 litros de óleo e 20 litros de água potável. Ainda bem que nosso Tatra é refrigerado a ar. Caso contrário, teríamos que ter mais 50 litros de água para sanar qualquer emergência com o radiador. Resumindo: para 90% dos problemas mecânicos, sejam por desgaste ou acidente, temos condições de resolver lá no meio do deserto do Saara, sem depender de outros.
Ainda não acabou. Levamos também equipamentos de segurança para sinalização, alertando outros competidores que estão atrás ou até mesmo os helicópteros da organização. Os objetos mais usados são tochas de luz, espelho para produzir reflexos durante o dia, granadas de fumaça e fogos sinalizadores. Mas quem tem apelido de “salvador da pátria” (espero nunca usar!) é a baliza. Em caso de acidente grave, por exemplo, acionamos o aparelho e ele imediatamente emite o sinal de rádio para a organização do Rally Paris-Dakar, que envia equipes de resgate, de carro ou helicóptero. No entanto, tal procedimento significa desclassificação da competição. É a última cartada.
E como segurança é a palavra de ordem usada pela organização do Rally Paris-Dakar, foi liberado nos últimos anos o transporte de um telefone via satélite nos veículos inscritos na prova. Nós, da Equipe Petrobras Lubrax, usamos um aparelho da marca Nera. Portátil, leve, resistente e muito funcional, o Nera pode fazer ou receber ligações em qualquer lugar do mundo, seja no centro de São Paulo ou no meio de uma duna na Mauritânia, no Saara, na África. Mas só podemos utilizá-lo, de acordo com o regulamento do Rally Paris-Dakar, em casos de acidentes para informar com mais detalhes a equipe médica o que é necessário para o salvamento. Nestes casos, os doutores do deserto chegam rápido. Afinal, eles têm dois aviões, dois helicópteros e seis carros 4×4 que vão seguindo a caravana do rali. São os nossos anjos da guarda.
Além do Nera, os veículos da Equipe Petrobras Lubrax utilizam ainda o equipamento Controlsat. Uma pequena antena emite sinais para satélites, permitindo que o caminhão seja localizado em caso de roubo ou até mesmo acidente. Graças a tecnologia, o trajeto percorrido é atualizado em uma tela de computador, na central da empresa no Brasil, a cada três segundos.
Enfim, esse é o meu “carga pesada”.
Depois de vários anos disputando o Dakar na categoria Motos e uma com carro, hoje posso dizer com todas as letras como é prazeroso pilotar um “dinossauro” pelo deserto. Correr o rally com um caminhão foi a realização de mais um sonho.
Quer saber mais sobre os bastidores da maior corrida do mundo? Então me ajude a escrever o próximo artigo para a revista Carga&Cia. Dê sugestões. Envie um e-mail para parisdakar@parisdakar.com.br. Visite também o site oficial da Equipe Petrobras Lubrax: www.parisdakar.com.br.
André Azevedo, 42, é piloto de caminhão e há 15 anos compete no Rally Paris-Dakar com Klever Kolberg, 39, na Equipe Petrobras Lubrax. André escreveu este artigo com exclusividade para a edição Número 30, Ano 02, da revista Carga&Cia .
A Equipe Petrobras Lubrax tem patrocínio da Petrobras, BR Distribuidora, Mitsubishi Motors do Brasil, Pirelli, e Eletronet, e apoio das Concessionárias Honda, VAZ Sprockets Chains, Carwin Acessórios, Controlsat Monitoramento Via Satélite, Iveco, Minoica Global Logistics, Mitsubishi Brabus, Planac Informática, Nera Telecomunicações, Telenor, Dakar Promoções, Kaerre, Capacetes Bieffe, Lico Motorsports, Vista Criações Gráficas e Webventure.
Este texto foi escrito por: André Azevedo, da Equipe Petrobras Lubrax
Last modified: fevereiro 22, 2017