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Ciclistas sofrem com baixa premiação nas provas de mountain bike


Edvando Souza Cruz exibe medalha conquistada no Pan-americano 2003. (foto: Wander Roberto/COB)

Mountain bike do Brasil nas Olimpíadas de Atenas, etapa da Copa do Mundo de MTB no Brasil. Tudo parece perfeito para o crescimento do esporte, mas alguns detalhes ainda o colocam como amador no cenário nacional. Uma causa disso é a premiação. Os atletas de mountain bike estão cada vez mais indignados com o prêmio que recebem, que às vezes chega a ser insignificante.

E eles querem é dinheiro! Não medalhas, equipamentos, mochila ou repositores energéticos. O Webventure entrou em contato com os principais organizadores de provas de mountain bike para saber por que a premiação é tão baixa.

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O Campeonato Interestadual de MTB é realizado em São Paulo e acontece há doze anos. O valor da inscrição é R$ 60 para os atletas profissionais. Depois de pedalar por quase duas horas em ritmo forte no circuito, o vencedor na Elite Masculina leva R$ 400 de premiação e da Feminina apenas R$ 250, assim como aconteceu na última etapa da competição realizada no dia 10 de abril.

O organizador do evento, Marcos Silveira, explicou que são destinados para premiação 20% do total arrecadado, somando inscrições e verba de patrocínio. “Somos a maior premiação do Brasil nessa proporção. Distribuímos dinheiro para os cinco melhores atletas de dez categorias”, disse. Segundo ele, o Interestadual distribui, em dinheiro, R$ 3.580 do 1º ao 5º colocado de cada uma das divisões.

Érika Gramiscelli, atual campeã brasileira de mountain bike, reclamou do valor da premiação das provas em geral. “Em um fim de semana que eu vou para São Paulo competir gasto em média R$ 400 com hospedagem, alimentação e transporte. É mais do que eu ganharia se vencesse uma prova”, disse, indignada, a atleta que mora em Minas Gerais.

“Muitos atletas, principalmente nas categorias de Elite, participam das provas querendo o prêmio maior e quando ele é menor do que uma média geral o atleta se sente desestimulado”, disse Odair Pereira, atleta profissional da Scott.

A Copa Internacional PowerBar Reebok de Mountain Bike (ex-Copa Ametur), que conta pontos para o ranking da UCI (União Ciclística Internacional) e que tem o maior número de atletas profissionais participando, prefere dar a premiação em dinheiro só para a categoria Elite, a principal.

“Nosso valor de premiação está acima do estipulado pela UCI, que exige dinheiro apenas para os três primeiros colocados da prova, e nós damos para os quinze primeiros”, esclareceu Tadeu Monteiro, organizador da Copa. São distribuídos R$ 7.160 na etapa.

O vencedor da Elite Masculina dessa competição recebe R$ 1 mil e da Elite Feminina recebe R$ 500. “Gostaríamos de pagar mais para a Elite Feminina, mas o número de atletas é muito pequeno perante o horizonte de homens. Não sei se seria a grande justificativa, mas é a realidade”, explicou Monteiro.

A taxa de inscrição da Copa Internacional é de apenas R$ 40. Sendo assim, tem o menor valor de inscrição de um evento de grande porte e uma das melhores premiações em dinheiro. “Nós somos a favor de que o atleta não tem que pagar a prova. Nós, organizadores, é que temos que viabilizá-la junto aos parceiros do evento. No dia que o atleta tiver que pagar a nossa inscrição para ela ter que existir, ela não vai existir mais”, afirmou o organizador.

A diferença de bônus entre a categorias Masculina e Feminina não tem agradado as atletas. Érika Gramiscelli, vencedora da 1ª etapa da Copa Internacional em 2005, é a favor de igualar a premiação. “Não há mais desculpas de que não tem mulher suficiente nas provas, porque têm, cada vez aparece mais e o nível está cada vez mais alto”, declarou. “Acho muito injusto”.

Flávio Ribeiro, o “Gonga”, organizador do Big Biker, competição que tem média de 400 bikers por etapa, também deu sua justificativa para essa desigualdade. “A premiação para a Elite Feminina no evento é metade da Masculina porque a chance de uma mulher ganhar na categoria é muito maior do que a de um homem, que tem mais concorrentes”.

No Big Biker serão distribuídos R$ 4.500 entre os cincos primeiros colocados das categorias Geral Pró Masculina e Feminina, dinheiro que é gerado apenas da verba das inscrições. Mas esse prêmio aparece só após três etapas, ou seja, na grande final do campeonato, sendo R$ 1.200 para o melhor biker e R$ 600 para a melhor atleta. A premiação para o vencedor de cada etapa é somente um medalhão e as inscrições custam R$ 40.

O Bike Race Across, o maior evento de mountain bike do nordeste do país, não tem critérios para definir a premiação. “É uma negociação com o patrocinador. Ela não é feita a partir de inscrições, nem de acordo com o número de atletas”, explicou Zenardo Maia, organizador do Bike Race. “O dinheiro das inscrições usamos para comer e transporte da organização durante a prova”.

A inscrição para o Bike Race Across, com quatro dias de prova, custa de R$ 100 a R$ 200, dependendo da categoria. “O que eu queria na verdade era não cobrar inscrição. Acho uma injustiça isso, tendo em vista que eles é que fazem a festa”, concluiu, se referindo aos bikers. Na última edição do evento, realizada em novembro passado, foram divididos R$ 4.100 entre os cinco primeiros colocados de cada categoria. O vencedor da Extreme, a principal, ganhou R$ 1.200 e o 1º lugar da Adventure recebeu R$ 700.

O Iron Biker é o evento de mountain bike no Brasil que tem o maior número de participantes e também o que cria mais polêmica em torno da premiação. Em setembro de 2004 cerca de 1.200 bikers alinharam para a largada em Mariana (MG). Foram dois dias de prova. A inscrição custou entre R$ 210 e R$ 300, dependendo da data na qual foi realizada.

A premiação em dinheiro aconteceu apenas para a categoria Elite, como filosofia do evento. “A partir do momento que se oferece dinheiro para categorias que não são profissionais, o evento perde um pouco de poesia”, acredita Gilberto Canaan, organizador do Iron Biker.

Entre as grandes competições de mountain bike, o Iron Biker é o único que tem premiação igual para a Elite, recebendo R$ 1.500 os vencedores da categorias Masculina e Feminina. O total de R$ 10 mil foi distribuído entre os oito primeiros homens e entre as seis primeiras mulheres na última edição. Atletas profissionais reclamam do valor, e dizem que é muito pouco perto do que o evento arrecada.

O MTB 12 Horas, tradicional prova paulista com 12 horas seguidas de duração, não premia os atletas com dinheiro, mas com produtos de patrocinadores. Essa é uma opção de Paulo de Tarso, o “Paulinho”, diretor do Sampa Bikers, empresa organizadora da competição. “O 12 Horas é uma prova voltada para amador”, justificou.

Paulinho compensa a premiação no Power Biker, outra prova que organiza e é válida pelo ranking nacional da modalidade. “Como o Power Biker vale pontos, damos premiação em dinheiro para os profissionais”, explicou. Na próxima edição do evento, que acontecerá nos dias 4 e 5 de junho, serão distribuídos R$ 10 mil entre os cinco primeiros da Elite Masculina e Feminina. O mais rápido entre os homens receberá R$ 2 mil e entre as mulheres, metade desse valor.

Edvando Souza Cruz, o “Vando”, representante brasileiro nas Olimpíadas de Atenas, conta tudo o que pensa sobre a premiação das provas de mountain bike no Brasil:

O que você acha do valor de premiação das provas atualmente?
Vando – Para um atleta profissional no Brasil a premiação não é a ideal, ela é baixa na maioria dos eventos, apesar de algumas mudanças como a Copa Internacional, que premia os quinze primeiros colocados. Então ela está bem distribuída. Mas o primeiro colocado não ganha mais do que R$ 1 mil na competição. E vendo que o esporte está crescendo tanto e tem um grande número de atletas participando das competições e tantos patrocinadores de nome envolvidos, uma premiação de R$ 1 mil ainda é pouco.

Qual foi a maior premiação que você já recebeu, em dinheiro?
Vando – No mountain bike foi na Volta de Santa Catarina, onde ganhei R$ 1500. Mas ainda é pouco.

Se você não tivesse patrocínio e tivesse que bancar todos os seus custos para treinar, quanto você gastaria por mês?
Vando – Para o atleta levar no nível profissional seria no mínimo R$ 2 mil de gasto com viagens e suplementos alimentares, ainda economizando, sem esbanjar (risos).

Você acha que se a premiação fosse mais alta haveria mais atletas no mountain bike?
Vando – Talvez isso ajudasse sim. São dois lados. Por um lado os atletas buscam um patrocinador que banque tudo para ele treinar e competir; outro é o fato de ir para competição e conseguir um dinheiro a mais que ele vai investir na vida dele. Muitos atletas usam o dinheiro da premiação para bancar custos das viagens. Por isso que eu falo que a premiação é baixa. Um campeonato que dá a premiação de R$ 400 pro primeiro colocado da Elite não paga nem as despesas de viagem do atleta.

Como você se sente sendo um representante olímpico ganhando uma premiação tão baixa?
Vando – Os atletas de Elite, que querem levar uma vida como profissional, de alto rendimento, para representar o Brasil lá fora, não estão sendo valorizados.

Você tem alguma sugestão para os patrocinadores?
Vando – Acredito que nos projetos para uma competição eles já têm que colocar uma verba para isso, fazer um planejamento; colocar já no programa da competição uma premiação mais alta.

Você já pensou em largar o mountain bike por causa da baixa premiação?
Vando – Já pensei em largar mas nem tanto pela questão da premiação. Envolveu isso também, mas fiquei me questionando se valeria a pena investir a minha vida nisso ou não, como eu sei que muita gente passa por isso. Uma das causas é a premiação. Eu estaria me dedicando, investindo minha vida numa coisa e de repente, de uma hora pra outra, se eu parasse de competir, iria estar sem nada na mão? Tenho 26 anos, sou casado, tenho filho e a responsabilidade é grande.

Comente a polêmica sobre a baixa premiação das provas de mountain bike no Muro de Recados do Webventure.

Este texto foi escrito por: Camila Christianini