Apredendo a lidar com a bike (foto: Arquivo Nova Origem)
Neste terceiro artigo, o trio do Projeto Nova Origem faz um resumo do primeiro ano da viagem. Eles saíram de Juiz de Fora (MG) em abril de 2010 e chegaram na Bolívia logo depois da virada do ano.
Primeiro passo: deixar tudo para trás
Abandonar a carreira, desfazer dos móveis, eletrodomésticos e roupas foi fácil diante de como explicar para a família que estávamos saindo de casa para dar uma volta ao mundo de bicicleta. Foi no dia 18 de abril de 2010, em Juiz de Fora (MG), que subimos pela primeira vez em uma bicicleta carregada com quase 60 quilos e demos adeus à família, aos amigos e às namoradas, iniciando o sonho de dar uma volta ao mundo pedalando. O Brasil foi o primeiro país de nossa rota, uma escolha acertada, pois a partir dele começamos a descobrir os segredos e a magia da estrada.
O início da jornada
Começamos a pedalar pela BR-040 para chegar a Brasília, passando por um caminho com muito tráfego de carros e caminhões, transportando principalmente o minério extraído de nossas Minas Gerais. A primeira lição da viagem foi já no terceiro dia, quando passamos uma noite na casa de uma família em Conselheiro Lafaiete (MG). Na hora de nos despedirmos, a dona Aparecida disse: Obrigada pela oportunidade de ajudá-los. Em Três Marias (MG) tivemos outra emocionante surpresa: fomos à escola Geralda Márcia para dar uma palestra às crianças e fomos recebidos com faixas e cartazes de boas-vindas e apoio à nossa viagem e à natureza.
Primeiros desafios
Chegando a Paracatu (MG), onde vive a mãe do Kiko, o Marcelo (até então o quarto integrante do Nova Origem) caiu da bicicleta e quebrou o braço, num descuido. Tivemos de correr para o hospital, onde ele foi operado de emergência, mas tudo deu certo. Não tínhamos completado nem um mês de viagem, e ele já tivera de voltar para Juiz de Fora, para se recuperar. O acidente gerou muita insegurança em nossas famílias e nos fez refletir sobre a importância da atenção que devemos ter na estrada. Percebemos que essa viagem não é brincadeira. Cerca de dois meses depois, Marcelo nos deu a notícia de que ficaria em Juiz de Fora, dando continuidade à sua vida. Foi um choque para o grupo, mas ficamos tranquilos ao saber que ele estava seguindo o caminho que o fazia feliz.
Cicloturismo na Chapada dos Veadeiros
O primeiro lugar de natureza paradisíaca que chegamos foi na Chapada dos Veadeiros, em Alto Paraíso de Goiás (GO). O cerrado e o povo que ali vive nos conquistaram e acabamos ficamos quase dois meses na região (o plano era 15 dias). Fizemos uma volta de bicicleta ao redor do parque nacional, passando pelas cinco principais cidades da chapada. Conhecemos o parque, a reserva e o quilombo Kalunga, em meio a um paraíso de água cristalina e inúmeras cachoeiras.
Deserto verde
Depois de Goiás, a primeira cidade que conhecemos no Mato Grosso foi Barra do Garças, na beira da Serra Azul. Esta guarda muitas cachoeiras e o encontro do Rio Araguaia com o das Garças. Dormimos à beira do Araguaia e ali conhecemos, por coincidência, um conterrâneo de Juiz de Fora que há 15 anos viaja de bike pelo Brasil: Éber, de 55 anos de idade. Pedalamos três dias na companhia dele, um mestre na arte de viajar. Ele nos contou muitas de suas histórias de estrada e nos enriqueceu com suas experiências. Também descobrimos um Mato Grosso desértico. Na verdade, um deserto verde de monoculturas de algodão, soja, milho, dentre outras, e de agrotóxico, lançados indiscriminadamente pelos aviões. Escutamos depoimento de pessoas que perderam familiares para o câncer, causado pela inalação diária desses venenos. E também vimos muitos animais silvestres atropelados na estrada. Mas enfim chegamos à Chapada dos Guimarães, perto de Cuiabá (MT), um paraíso preservado frente ao desmatamento de Mato Grosso. Demos um rolê massa de bike para conhecer os mirantes e os paredões da região. Do alto deles, se vê o pôr do sol (um dos mais bonitos que já vimos) no fundo da maior planície alagada do mundo.
Natal e Réveillon na estrada
O aprendizado ficou mais forte ao passarmos o primeiro Natal e Réveillon longe da família e dos amigos, apenas entre nós e em nossa nova casa: a estrada. O Natal foi pouco depois de Cuiabá, nos fundos de uma dessas vendinhas de beira de estrada. Nossa ceia foi macarrão com um pouco de linguiça, acompanhado de um champanhe ganhado em Cuiabá. Já o Réveillon foi em Cáceres (MT), às margens do Rio Paraguai, onde nos alojamos no hotel do Exército de fronteira. E foi justamente no limite de Cáceres e San Matias que entrámos na Bolívia, na região pantaneira. Depois de nove meses em terras brasileiras, iniciamos a etapa internacional de nossa viagem.
Até aqui
Nesses primeiros meses de viagem, aprendemos o que é fazer cicloturismo e como viver por meio dele. Ganhamos intimidade com a bicicleta, aprendemos a fazer manutenção e reparos nas bikes, tivemos de procurar um lugar parar dormir todos os dias, armar e desarmar a barraca e fazer a nossa comida. Não sabemos das dificuldades que nos aguardam, onde vamos dormir, quais serão as pessoas que cruzarão o nosso caminho, nem mesmo o que vem depois da próxima curva. A adaptação é diária e temos de estar preparados para todos os imprevistos. Estamos aprendendo a viver o desconhecido, acreditando sempre no bem e nas pessoas que passam por nosso caminho. Até a próxima coluna!
A Bolívia vai ser explorada na próxima coluna, publicada no final de julho.
Este texto foi escrito por: Nova Origem