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Conceito de escalada após os 50 anos da conquista do Everest

Comemorando os 50 anos da conquista do Monte Everest, centenas de pessoas foram para lá caminhar, correr, apreciar a vista e escalar.

As expedições comerciais nunca tiveram tantos clientes: uma delas tinha 80, pasmem, oitenta clientes divididos em trekkers até o acampamento base, uns até o base avançado , outros até outro ponto, e outro tanto eram escaladores que iriam até o cume.

E, também, junto com eles, tubos e tubos de oxigênio, uma vez que tais clientes não escalam sem esse artifício e nem os sherpas dessas expedições o fazem. Não há qualquer problema em centenas e centenas de pessoas estarem lá na montanha para caminhar, escalar ou simplesmente curtir a paisagem da maior montanha do planeta.

Mas a forma como esses turistas de alta montanha convivem lá é que é o problema. Muitas dessas pessoas querem ter ali a mesma comodidade, os mesmos hábitos com os quais vivem em seus diferentes países. Esses turistas levam para lá todo o seu mundo consumista, de banhos quentes e cybercafés, a celulares que os põem em contatos com as últimas novidades do seu país, do seu mundo do dia a dia. Talvez por que precisem estar sempre atualizadíssimos ou, então, por que precisam dizer, ou se fazerem escutar que estão na montanha mais alta do mundo.

E, por assim fazerem, há o absurdo de se encontrar acima de 8.500m de altitude um montão de cilindros abandonados após o uso por esses escaladores, ou então, um desmatamento imenso na região dos Annapurnas e na região do Solo Khumbu – onde está o Everest – porque querem tomar banho todos os dias com água quente.

Oras, numa região onde não há estradas, apenas trilhas e tudo é carregado nas costas de Sherpas ou no lombo dos animais chamados yaks, a forma principal de aquecer essa água é através de fogo a lenha. Como os Sherpas, que eram essencialmente agricultores, aprenderam rapidinho que o turista de alta montanha – trekkers e escaladores – representa a possibilidade de muito dinheiro, eles fazem de tudo para agradar essas pessoas.

Querem banho quente, é só pedir que eles providenciarão. A que custo? A devastação da natureza é um conceito muito elitizado para fazer frente às necessidades do consumo moderno que os Sherpas aprenderam nesse convívio intenso com os ocidentais.

Hilllary disse que ficar bebendo cerveja no acampamento base, enquanto os Sherpas montam as vias e preparam toda a montanha para receber os trekkers e escaladores não é escalar. Concordo plenamente. Hoje, diferentemente da época da conquista, isso é apenas turismo em alta montanha. E, para esse turismo, há a necessidade de se fazer um programa mais adequado para que se aprenda a respeitar a cultura local, respeitar o convívio com aquele ambiente.

Mas, ainda há outra forma de consumismo: pensam em subir as montanhas, escalando ou caminhando, sentindo as emoções pulsando a mil, com adrenalina a milhões; nada mais enganoso. Não é um filme de Hollywood, com cenas mirabolantes, lances espetaculares de avalanches caindo, e você bem ali no meio, sobrevivendo como se fosse um super-herói. A realidade é um pouco diferente. É uma dura caminhada de aproximação, aclimatando seu corpo àquela altitude e a sua mente àquela cultura.

A necessária paciência para entender a cultura daquele povo, para esperar pelo bom tempo, para ir montando os acampamentos… Dura não no sentido de que poucos podem fazê-la, mas, no sentido de que o esforço de caminhar em altitudes diferentes das quais você está acostumado provoca mais cansaço do que êxtase. E, no meio desse cansaço, somente aqueles que têm sensibilidade, percebem a imponente – e maravilhosa – natureza, e também de valores humanos diferentes dos seus, como, por exemplo, a percepção de que você é privilegiado por estar praticando um esporte em ambientes como aquele, aprendendo a conviver com a montanha, respeitando o local e as pessoas que lá vivem.

Então, será que é preciso fechar o acesso ao Mt Everest para que poucos o escalem? Não, não é necessário. Escalar respeitando a montanha, sem diminuir a sensação de sua altitude não utilizando cilindros de oxigênio e procurando causar o menor impacto ambiental possível, já é um prazer que só poucos experimentam.

Este texto foi escrito por: Helena Coelho, especial para o Webventure