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De volta ao Brasil, Sylvio Barros comenta a estréia no Dakar


Carlos Ambrósio e Sylvio Barros no Sertões 2006 (foto: Donizetti Castilho/ www.webventure.com.br)

Não foi bem como ele queria. O piloto de moto brasileiro Sylvio Barros teve sua estréia no Dakar interrompida por uma queda. Barros competiu até a quarta etapa, ocupava a 70ª colocação, mas caiu, perdeu temporariamente e memória e teve uma luxação na mão esquerda. “Não me lembro direito do que aconteceu. Levei uma pancada forte na cabeça e fiquei confuso”, revela o piloto.

Os médicos da prova recomendaram que ele voltasse para casa. “Tenho a sensação de que poderia ter continuado”, lamenta o brasileiro. O acidente do piloto aconteceu no mesmo dia da morte do sul-africano Elmer Symon. Sylvio afirma ter passado pelo local do acidente. “Assim que eu vi a moto muito destruída, percebi que era algo grave, ainda mais porque havia um helicóptero da organização pousado lá”, lembra.

De volta ao Brasil, Sylvio falou com exclusividade ao Webventure. Confira a seguir a entrevista sobre a participação dos brasileiros e as impressões do piloto acerca do maior rali do mundo.

Webventure – Qual é a avaliação que você faz da sua participação no Dakar 2007?
Sylvio Barros
– Minha avaliação é ruim. Completei só 20% da prova. Tinha a expectativa de chegar em Dacar, e ela foi frustrada. Minha sensação hoje é de frustração de não conseguir realizar meu objetivo

E enquanto estava lá. Qual era o sentimento de realizar pela primeira vez o Dakar?
A prova é incrível, a estrutura é fantástica, tem pilotos do mundo todo. A organização é impecável, já que a prova tem quase 30 anos. A saída de Portugal foi muito legal. As duas especiais que corremos lá foram muito organizadas. E o rali na Europa é muito mais popular. A cobertura de imprensa é incrível. Ainda mais para nós, por sermos brasileiros, já que a prova sai de Lisboa. Fomos muito bem recebidos. Em especiais de 120 quilômetros não vi nenhum lugar em que não tivesse gente na pista.

Para um brasileiro isso deve ser estranho. O rali aqui no Brasil são só vocês, o equipamento e ninguém em volta. Você chegou a ficar com receio de atropelar alguém?
Na prova de Portugal era impressionante como as pessoas vinham perto de nós na pista. Já vi etapas do WRC [Mundial de Velocidade] em que as pessoas vão em cima, mas ainda não tinha presenciado isso. É uma loucura para ver as equipes o mais perto possível.

Houve uma especial em que fiquei sem gasolina. Calculei mal e um grupo de portugueses que acampou no local de noite me ajudou. Empurraram a moto, conseguiram gasolina para mim e vibraram de poder ajudar alguém no Dakar. Isso foi muito legal.

Como é pilotar na África?
O Marrocos é realmente o que todo mundo fala. Um terreno cheio de armadilhas. São grandes espaços, a diferença de onde tem estrada e onde não tem é realmente o fato de ter passado algum carro lá, algum dia, porque na verdade é tudo igual. Usamos muito navegação por bússola agora que o GPS não é mais aberto. Nos orientamos pelos graus, vamos navegando por direções. E os imprevistos são incríveis. É o que se pode chamar de ilusão de ótica. Você acha que a estrada está ali, inteira, e quando chega é uma vala enorme, que se não tivesse visto na planilha poderia causar um acidente. A estrada acaba sem que se perceba.

Isso dá uma certa insegurança, ainda mais por ser sua a primeira vez?
É difícil de se achar o risco. A prova estava começando, era o segundo dia de Marrocos para mim quando caí. Estava no aquecimento, tinha passado muito frio de noite. O frio no Marrocos é diferente, seco. Estava me acostumando com o cenário e o tipo de prova.

Passei no local do acidente do sul-africano. A moto dele estava bem destruída e tinha um helicóptero lá perto. Imaginei que deveria ter sido algo grave. Ele estava exatamente em um ponto onde não poderia sair da pista. Mas como eram muitas motos, a tendência é sair da moto da frente por causa da poeira, para poder ver alguma coisa. O que ouvimos é que ele foi sair de trás de alguém, para ultrapassar. Fora da pista tinha uma vala enorme. Ele estava rápido e bateu na vala.

E como foi o chamado para a organização tentar o socorro?
Agora os equipamentos de segurança que usamos nas motos são muito bons. Temos um GPS que manda informações para uma central em Paris. Essa central percebeu uma desaceleração muito rápida na moto dele. Como o GPS manda sinal o tempo todo, se a moto está a 120km/h e de repente pára a central aciona um helicóptero. Logo depois disso dois pilotos chegaram. Pelo que vimos, o helicóptero chegou rápido, em menos dez minutos, mas já não havia mais o que fazer.

Eu acho que o Dakar trata a morte de uma forma muito pragmática, muito objetiva. Todos que estão lá sabem o risco que correm. Havia na planilha o aviso do perigo, o piloto de certa forma não respeitou esse aviso não sei o que houve. E ele acabou falecendo É uma forma estranha de se dizer, mas está previsto em regulamento. É até difícil de ler, mas assinamos um termo de responsabilidade. Isso é tratado de uma forma objetiva: infelizmente o Dakar é assim e faz parte da história da prova. Isso torna a sensação de chegar bem a cada dia nas cidades muito melhor. E também a morte faz parte do nosso dia-a-dia.

E sobre o seu acidente, você chegou a perder a memória?
É, não lembro exatamente do momento em que caí. Sei que o Dimas [Mattos] chegou em mim. Eu tinha quebrado a minha viseira, pedi emprestado para ele. Havia dez quilômetros para o abastecimento. Quando cheguei lá, o Carlos [Ambrósio] depois contou que eu ficava repetindo sempre o que falava. Foi uma pancada forte com a cabeça e eu fiquei confuso. Isso já aconteceu com alguns amigos, perde-se um pouco a noção do que está acontecendo por algumas horas, depois passa. Mas quando passou já era final do dia, não poderia retornar para a prova. Estava com uma lesão na mão que o médico pensou que era fratura, depois vi que não era. No final, tenho a sensação que poderia ter continuado. Os médicos que estavam lá acharam que era um risco continuar desse jeito. Mas hoje estou bem, fora a frustração de não terminar a prova.

Em uma avaliação sobre a participação brasileira, quase todos tiveram problemas. Você acha que eles estão sem sorte nesse Dakar?
Acho que o Dimas e o Carlos estão fazendo uma prova boa. O Jean [Azevedo] que teve a infelicidade de um problema elétrico. O Carlos vem de uma contusão que aconteceu dez dias antes do rali e vem se recuperando. O Dimas também está fazendo uma prova muito boa. O objetivo dos dois é chegar em Dacar. Nenhum dos dois tem a expectativa de chegar entre os primeiros, se chegarem em Dacar estarão cumprindo muito bem o objetivo. Os brasileiros nos carros que estão com um pouco mais de dificuldade, mas os de moto, que conheço mais, estão bem no rali.

Este texto foi escrito por: Daniel Costa