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Direto de Katmandu: Paulo e Helena Coelho falam sobre a temporada no Everest


Paulo Coelho em foto tirada a 8.300m no Everest (foto: Helena Coelho)

A montanhista e colunista do Webventure Helena Coellho, conta como foi a escalada dela e de Paulo no Everest neste ano. Helena fala também da diferença de se escalar com e sem oxigênio suplementar, um ideal do casal há pelo menos sete vezes, que foi atingido até 8.400m em outra temporada.

Ela dá sua opinião nesta coluna sobre as conquistas com oxigênio artificial e fala das dificuldades e desafios em se escalar “apenas com o próprio esforço”. Confira aqui seu artigo, enviado direto de Katmandu (no Nepal), com exclusividade para o Webventure.

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Olá a todos,

De volta a Katmandu, depois de quase dois meses no acampamento base, base avançado e superiores do Monte Everest.

Cume? Não ainda. Próxima vez. Enquanto tivermos forcas, dinheiro, amigos… enquanto acreditarmos que chegar ao cume do Monte Everest e uma questão não de grana e de fama, mas sim da pratica de um esporte com o máximo de ética e de seriedade.

Da prática de um esporte em um meio natural com ar rarefeito que exige preparo físico e mental fortíssimos para não sucumbir aos encantos do uso de cilindros de oxigênio, nem de contratar sherpas para aparelhar a montanha com as barracas, comidas, cilindros e tudo o mais que se necessita para subir.

Da prática de um esporte que é para se usar apenas o próprio esforço. Para não se perder mentalmente e começar a arrumar subterfúrgios e justificar que está usando os cilindros apenas para segurança.

Se for por segurança, talvez seja melhor voltar para casa e esperar uma próxima temporada. Ou então, talvez seja melhor contratar uma ótima expedição comercial.

Neste ano, a temporada não foi nada fácil. O fato de a escalada ser decidida e dirigida pelas previsões de tempo fez com que tivéssemos menos movimentação de alpinistas pela montanha e mais concentração dos mesmos nos acampamentos base e base avançados, apenas consultando as fatídicas previsões.

Ou, os mais afortunados, nem nos acampamentos ficavam; contratavam transporte e iam para as cidades situadas uns mil metros a menos de altitude. Lá descansavam enquanto de seus telefones por satélite e computadores se informavam como andavam as previsões e, se sabiam de alguma possível melhora no tempo, voltavam aos acampamentos.

Enquanto isso os sherpas subiam para depositar os equipamentos, os cilindros, em algum ponto do Colo Norte, do C2…

Que diferença… Isso não parecia o Monte Everest real.

Eu e o Paulo tentávamos tocar dentro do nosso estilo; mesmo com as previsões rolando, subimos, montamos o Colo Norte. O Paulo estava super bem, treinou forte nos últimos seis meses e estava tranqüilo para subir, carregar toda a sua parte do equipamento, etc.

Eu passei por um período difícil e o treinamento ainda que duro, foi muito aquém do que eu precisava para uma empreitada desse porte. Estava sem velocidade e com pouca capacidade de carga. Mas ia, devagar. Eu insistia para o Paulo ir sozinho e ele insistia que queria, mesmo que devagar, ir junto comigo.

Para montar o acampamento 2 foi mais difícil, não houve brecha no vento para fazermos isso com antecedência, alem de termos tido o problema de nossa barraca do Colo Norte , onde estavam armazenados todo o equipamento, a comida, gás, etc, para os acampamentos 2 e 3, ter tido o sobreteto rasgado pelo vento forte e a barraca ter sumido inteira durante dez dias – acho que ela era muito velha e não agüentou o vendaval.

Depois de algumas conversas e oferta de dinheiro para tentar encontrar o nosso material, descobrimos que a barraca estava enrolada com tudo dentro perto de outras barracas, guardada por um sherpa que nos entregou e recebeu a recompensa. Que sorte!!!

Nós só voltamos a ter brecha para montar o acampamento 2 quando tivemos a nossa única janela de tempo no final do mês de maio – e posso dizer que foi a melhor que houve por lá – para a subida para o cume. Ai ficou um pouco pesado para mim pois tratava-se de levar em uma só vez toda a carga dos campos 2 e 3. Não deu para montar o C2, então, decidimos ir direto do C1 para o C3 com pouca carga. O vento não deu trégua, a temperatura estava muito baixa com riscos de congelamento para quem não usa cilindros de oxigênio e tivemos que voltar antes de chegar no C3. Não tínhamos mais dias para ficar na montanha, apesar dos quase dois meses lá.

O que nos facilitou ir para o Everest nesta temporada foi a minha passagem aérea adquirida pelo programa de milhas e, agora no final, foi ela a minha camisa-de-força a fazer a nossa volta, pois, não poderia mudar o dia do vôo, a não ser que comprasse outra passagem aérea e aí não seria possível – onde conseguir a grana?… Que coisa !!!

O que podemos dizer é que nesta temporada, até o momento, ninguém chegou ao cume dentro do nosso estilo de escalada e olha que o número de escaladores com esses mesmos princípios têm aumentado e tinha inclusive uns dois com alguns oito mil no currículo que estavam lá tentando desse mesmo jeito…

Mas, não tem nada não, amigos. Vocês ainda não estão livres de ver a gente falar de que escalar o Everest sem cilindros de oxigênio, sem sherpas como guias e carregadores é possível. Mesmo que isso soe fora de moda dentro da política de resultados!!!

Vou ver se consigo treinar mais forte nesse próximo intervalo; vamos ver se conseguimos, como sempre, ir juntando o money, e, se der, a gente volta lá.

Estamos voltando para São Paulo e aí conversaremos mais. Estamos em Katmandu e amanhã já começaremos o nosso vôo de volta.

Um grande abraço a todos.

Paulo e Helena

Este texto foi escrito por: Helena Coelho