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Diversão nas agulhas do Vale do Refúgio Frey, na Patagônia


Agulha Cohete Banana em primeira plano ao fundo agulha Campanille (foto: Arquivo Pessoal)

Faça tempo bom ou ruim o Vale do Refúgio Frey, em Bariloche, sul da Argentina é garantia de diversão. Algumas vezes o lugar nos faz chorar de medo, chamar a mãe, tremer de frio, enlouquecer com o soprar do vento forte nas orelhas, mas quanto maior o desafio maior a satisfação no fim do dia. Esta temporada foi assim, testando todo o momento a motivação do escalador.

O Vale recebeu brasileiros desde o início da temporada. Na segunda quinzena de dezembro, com a neve ainda tomando conta dos sítios de acampamentos ao longo da lagoa, catarinenses e cariocas ocupavam os arredores do refúgio com suas barracas. A turma que passou pelo Frey em dezembro enfrentou muito vento, nevasca e baixas temperaturas. O calor mesmo só na memória dos brasileiros. Mas tendo vontade sempre alguma coisa a gente escala. A opção era escolher as vias abrigadas do vento e que pegavam sol durante boa parte do dia, quando raramente ele mostrava suas caras.

O primeiro de janeiro chegou com sol e a esperança de clima bom, mas as coisas só foram melhorar mesmo a partir da segunda metade de janeiro. Aí sim foi possível escalar sem bater os dentes. O vento ainda persistia, mas este é companhia freqüente do escalador que procura as agulhas de granito da patagônia, o jeito é se acostumar. Nesta janela de tempo bom, os escaladores aproveitaram para visitar as agulhas mais longes e tentar as vias mais longas e expostas ao clima patagônico.

Teve dia de ter três cordadas escalando a via Sinistro Total, na Torre Principal, famosa pela sua dificuldade técnica, e por estar localiza em uma face da agulha que pega pouco sol e muito vento. Do cume da Principal, a agulha mais alta do vale, se escutava gritos de escaladores, muitos brasileiros, nos cumes da agulha Campanille, Cohete e Banana todos desfrutando do bom clima depois de tantos dias de espera.

Mudanças climáticas, novamente – Claro que, depois de mais de quinze dias de tempo bom, uma hora as coisas iriam mudar. A princípio, um ou dois dias de tempo ruim é bom para descansar sem aquele peso na consciência de estar perdendo um dia bom. Porém, o que aconteceu no início de fevereiro foram cerca de oito dias seguidos de tempo ruim, nas suas mais variadas possibilidades.

O vale do Refúgio Frey chegou a ficar inabitado, com apenas algumas barracas abandonadas pelos seus moradores que desceram para passar o tempo ruim em Bariloche. A promessa, segundo a turma do Refúgio, era que as coisas iriam melhorar a partir do dia 11, e que no dia 13, data que aconteceria o campeonato de escalada Rock Máster no vale do Frey, a temperatura chegaria a 28 graus. E assim foi.

O evento, realmente não sei como foi, pois aproveitamos a janela de tempo bom para fazer um bivaque na base da agulha Campanille, localizada a cerca de uma hora e meia de caminhado do refúgio e considerada por muitas a agulha mais atrativa do vale por suas paredes verticais e rocha de boa qualidade. Não fomos os únicos que desfrutaram do Campanille nestes dias, a agulha estava sempre movimentando recebendo até três cordadas por dia, Buch Goin e Imaginate, sempre disputadas. E já cansados, perdemos o último dia de tempo bom. O tempo voltou a fechar, e a saudade do Brasil e do calor foi maior.

A minha primeira experiência na Patagônia, no vale do Frey, foi no verão de 2008. Naquela temporada tivemos quarenta dias de tempo bom, calor, podendo escalar de bermuda e camiseta no Campanille. Só desfrute, a galera muito motivada e evoluindo a cada nova escalada. Os dias de descanso eram coisa rara. Oh saudade!!!

Esse ano os dias de desfrute foram poucas. Porém, quando se tem vontade mesmo, se sobe com vento, neve e luvas nas mãos. A emoção com certeza será recompensadora.

Nos primeiros dias de janeiro escalei com a Letícia Zewe, de Curitiba, que estava conhecendo o lugar e escalando vias completas com proteção móvel pela primeira vez.
Fizemos as clássicas, Diedro de Jim e Sifuentes Weber na Agulha Frey, Del Frente na agulha La Vieva e a Normal da Torre Principal, num lindo dia de céu azul e muito vento, o que fez do rapel uma grande aventura, mas fora a apreensão de rolar uma corda presa, tudo correu muito bem. Na janela de tempo bom a nossa cordada ganhou o apoio significativo do Ingo Moller, que teve uma rápida passagem pelo Frey este ano, mas em compensação nos melhores dias.

Escalamos a Trilogia no Frey, esta entre chuviscos. A Anticíclica no Pilares de La Tierra emendando com a Le Gran Tom no Tonto. No Campanille escalamos a Fonrouge Bertonceli e a na Banana a On Marche sur La Lune. Voltei a escalar na Torre Principal pela via Clemenzo.

Em fevereiro, depois do calvário de uma semana de ibernação, eu e a Letícia fizemos uma cordada com a Luana Hudler de Joinville, sempre parceira, e escalamos a Buch Going no Campanille e a On Marche Sur La Lune na Banana. Nos dias de tempo ruim rolou uma grande variedade de primeiras cordadas, intentos, vias mais curta e top ropes na tentativa desesperada de escalar algo e não morrer de tédio. Já de volta ao Brasil, onde o clima esta época do ano também não favorece muito a escalada, é certo que valeu a pena provar do gostinho amargo do clima patagônico para desfrutar daquelas escaladas perfeitas naquele granito alaranjado cheio de possibilidades de boas proteções. Sempre vale a penaaaaaaaaaaaaaaaaaaa!!!! Faça tempo bom ou ruim, na próxima temporada estarei lá.

Como Chegar: até Buenos Aires a melhor opção é avião, pois a diferença da passagem de ônibus não é muita. Mas tudo depende de quanto tempo você tem para viajar. Com bastante tempo se pode ir de ônibus, existem as empresas www.viabariloche.com.ar , os ônibus argentinos são muito confortáveis, os cochecama principalmente. De Buenos Aires fica bem mais barato seguir de ônibus, são mais 17 horas. De avião a passagem custa o dobro do valor pago pelo trecho São Paulo-Buenos Aires.

Em Bariloche a trilha tem início na Vila Catedral, onde funciona uma estação de esqui no inverno. Porém se for subir a cavalo existem outras opções de caminho, vai depender do seu arrieiro.

Época do Ano: no verão, janeiro e fevereiro o clima é mais favorável, mas também é a época onde falta lugar para acampar. Nestes meses é possível escalar, em dias bons, de camiseta e shorts, e também é possível acordar com o teto da barraca pesando sobre você carregado de neve, e fazer muito frio. Portanto, roupas para temperaturas de até -5 são aconselháveis, mas não se esqueça de levar uma camiseta, por se acaso.

Escaladas: as agulhas top of mind são a Agulha Frey, – que da nome ao Refúgio e até mesmo a localidade – , a Torre Principal, – a mais alta do vale -, e a agulha Campanille -, esta localizada no Vale vizinho, onde também se pode acampar. O local oferece vias com graduação para todos os níveis, sendo uma ótima opção para quem quer se aprofundar na técnica de escalada em móvel. O local tem um excelente guia produzido por Rolando Gariboti, conquistador de muitas vias no vale. Gariboti classifica as vias por estrelas, e realmente vale à pena optar pelas três estrelas, a satisfação é garantida.

Este texto foi escrito por: Danielle Pinto