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Do Rio aos EUA a bordo de um ultraleve

Redação Webventure/ Outros

O projeto era voar do Rio de Janeiro, Clube Céu, em Jacarepaguá, até a feira aeronáutica da EAA em Oshkosh, nos Estados Unidos. A aeronave escolhida foi um ultraleve FK9, matricula U-5242. Passamos por lugares diferentes a cada dia.

Rio de Janeiro / Uberaba – Começa a aventura, em 14 de julho de 2001. Com a saída do Clube Céu no Rio de Janeiro partimos à tarde para Uberaba, aproando inicialmente Ubatuba. Sobrevoando Parati , fomos autorizados a tomar proa direta de Uberaba. Após quatro horas de vôo estávamos pousando em Uberaba. Uma conversa cordial com o controlador e partimos para o Hotel.

Uberaba / Gurupí – Partimos às 8:00 com destino a Goiânia conforme programado. As condições meteorológicas estavam boas e chegamos ao nosso primeiro destino do dia, sem maiores problemas. Abastecemos e rumamos para Gurupí, no estado de Tocantins. Devido ao calor do dia sentimos os efeitos das correntes ascendentes provocadas pela alta temperatura e, por isso, o vôo não foi muito confortável, pois tinha muita turbulência. Chegamos em Gurupí, sendo muito bem recebidos pelo Sr. Ramon, um apaixonado piloto de ultraleves. Ramon nos cedeu um lugar no seu hangar para o pernoite do nosso ultraleve. Rumamos de táxi para a cidade. Nosso hotel era muito bom.

Gurupí / Marabá – Para agilizar nossa saída, já havíamos deixado pronto o FK-9 no dia anterior. No aeroporto, encontramos nosso amigo Ramon nos aguardando para abrir o hangar e nos desejar um bom vôo. Decolamos às 8h15 de Gurupí, com destino a Marabá. Sobrevoamos Conceição do Araguáia e após quatro horas de vôo pousamos em Marabá. Com uma temperatura de 30º C na sombra, o calor intenso provocava turbulência forte, afetando o desempenho do nosso vôo, devido ao pouco peso do avião. A meteorologia amazônica também nos mostrou ser melhor voar na parte da manhã e ficar no solo à tarde.

Marabá / Macapá – Decolamos às 8h com destino a Macapá. Sobrevoamos o lago de Tucuruí, em condições de vôo visual e logo em seguida já apareceram as primeiras nuvens pesadas, formadas pelo calor do dia. Voamos fazendo vários desvios até o sobrevôo da cidade de Breves, na ilha de Marajó. Quando estávamos próximos de Macapá, avistamos ao norte formações mais intensas de nuvens carregadas, confirmando a impossibilidade de voar à tarde.

Pousamos às 11h46 e o resto do dia aproveitamos para preparar nossa saída junto à Alfândega, DAC e Polícia Federal, onde a presteza e agilidade fizeram com que em poucos minutos estivéssemos com a burocracia “resolvida”. Conhecemos em Macapá o Cmte. Carlos, que já sabia da nossa aventura. Após nosso pouso ele veio nos saudar, nos levou ao hotel e jantamos juntos.

Macapá / Rochambeau – Nossa rota de Macapá para Rochambeau, aeroporto internacional de Caiena, que é a capital da Guiana Francesa, incluía somente o sobrevôo da cidade de Oiapoque, já na fronteira entre os dois paises. Este foi o trecho em que sobrevoamos a maior extensão de floresta da nossa viagem. Também foi o trecho com menores vestígios de civilização, tal como estradas (somente uma) e cidades ou vilas (somente duas). A informação meteorológica na rota era por conseqüência inexistente.

Logo cedo o Cmte Carlos veio ao hotel, tomamos café da manhã e fomos para o aeroporto. Saímos de Macapá às 8h30. Vôo visual, porém com muitos desvios de nuvens carregadas. Sobre o Oiapoque, devido à alta umidade do ar, percebemos a formação de gelo no carburador. Tivemos que descer e continuar a viagem mais abaixo, até nosso destino. O vôo tornou-se turbulento, mas o pouso foi tranqüilo. O pessoal da alfândega de Caiena foi bem ágil. Há no aeroporto um excelente serviço de meteorologia, com informações completas, previsões corretas e fotos de satélite (finalmente)! Em Caiena ficamos no hotel Novotel, que é muito bom.

Rochambeau / Georgetown – Após abastecer o FK-9, decolamos às 8horas. Foi um vôo com condições de visibilidade bastante ruins, com muitos desvios na rota em função das formações de nuvens pesadas e possibilidade de chuvas fortes. Sobre Zanderyj, no Suriname, desviamos para o mar à procura de melhores condições de vôo visual. O GPS foi muito útil. Pousamos em Timehri.

No aeroporto internacional da cidade de Georgetown, capital da República da Guiana, fomos recebidos pelo “handling agent”, previamente contratado para fazer os trâmites legais, pois os entraves da imigração local são complicados para quem não é “de casa”. Conseguimos guardar o FK-9 em um hangar sem portas e afastado do terminal de passageiros (diziam ser o melhor hangar disponível) e pagamos para os vigias noturnos, para evitar que curiosos mexessem no avião.

Georgetown – Neste dia “ficamos no chão”. O dia amanheceu sob chuva forte com trovoadas e teto baixo. Não havia condições para vôo visual. Fomos obrigados a adiar a viagem e permanecer na cidade de Georgetown por um dia inteiro, olhando para o céu na esperança de melhores condições. Somente no fim da tarde, conversando com nosso amigo Malcom Cheng-A-Sue, (presidente da AOPA Guiana), soubemos que o tempo poderia melhorar no dia seguinte.

Georgetown / Fort de France – Finalmente conseguimos decolar de Timehri, tomando a proa direta da ilha de Trinidad. Muitos desvios, principalmente na foz do rio Orenoco e sobre Trinidad, por causa de formações pesadas de nuvens. Sobre o mar o tempo estava melhor. Pousamos na ilha de Grenada, para reabastecimento. Já longe da meteorologia amazônica pudemos prosseguir à tarde para Fort de France, na ilha de Martinique.

Chegamos no final do dia e providenciamos a troca de óleo do motor. O aeroporto internacional é muito bom, e o pessoal é atencioso e cortês. O mecânico da Air France, que nos ajudou na troca do óleo do motor, foi rápido e eficiente. Ficamos em um ótimo hotel na cidade. Imigração rápida. Meteoro e plano de vôo em cinco minutos!

Fort de France / Punta Cana – Decolamos às 8h15 com destino à ilha de Nevis. Tivemos informações que o vulcão da ilha de Montserrat entrara em atividade. Como esta ilha estava na rota, desviamos para a direita, pois o vento soprava de Leste, empurrando as cinzas para a nossa rota. Foi uma oportunidade única ver um vulcão em erupção. Embora a ilha esteja quase que totalmente devastada, o visual é impressionante e nada pode descrever a devastação.

Abastecemos na ilha de Nevis e decolamos rumando para a República Dominicana, sobrevoando as ilhas de St. Kitts, St. Marteen, Tortola, passamos ao norte da ilha de St. Thomas, voamos ao longo da costa norte de Porto Rico e pousamos em Punta Cana, nosso destino final neste dia. Vôo visual, com muitos desvios das chuvas peadas próximas a Porto Rico e na chegada em Punta Cana.

Pouso muito “trabalhado”,devido à turbulência e rajadas de vento muito fortes. Pagam-se taxas para todos os serviços e o atendimento no aeroporto não está preparado para aeronaves particulares. É o reinado dos aviões comerciais, que trazem milhares de turistas por semana. Em compensação, nosso hotel era perfeito.

Punta Cana / Great Exuma – Saímos de Punta Cana com grande atraso devido à desorganização do abastecimento de combustível e à burocracia da policia, alfândega e plano de vôo. Não conseguimos informações meteorológicas da rota. Havia à nossa direita uma grande formação de chuvas, que nos impedia de tomar a proa direta para a ilha de Providenciales, nas Turks & Caicos Islands, nosso primeiro pouso do dia.

Finalmente, após percorrer quase toda a costa da República Dominicana, conseguimos girar um pouco à direita e começar a contornar esta grande formação. Mais adiante encontramos condições 100% com um céu de brigadeiro que nos proporcionou um visual fantástico do mar do Caribe.

Chegamos em Providenciales, como planejado. O pouso foi novamente muito “trabalhoso” por causa dos ventos fortes, próximo à cabeceira da pista. Reabastecemos o FK 9, e continuamos para Great Exuma, já nas ilhas Bahamas. Muitos desvios ao longo da rota por CU e alguns CB, mas com uma visão maravilhosa das ilhas e dos recifes de areias brancas com águas transparentes. Esta região é sem duvida única no mundo e vale a pena o sobrevôo. Pouso com vento forte. O hotel era muito bom.

Great Exuma / Fort Lauderdale – Decolamos logo cedo com destino à Florida, sem muitas informações meteorológicas. Após uma hora de vôo e muitos desvios, pousamos na pequena ilha de Staniel Cay, devido à “muralha” de tempo ruim com chuva forte em nossa rota. Amarramos o avião, pois a pessoa que nos recebeu na pista de pouso da ilhota informou que o mau-tempo deveria durar cerca de 12 horas.

A ilha Staniel Cay não tem mais do que 100 habitantes e quase nenhuma infraestrutura. O único hotel não dispunha de quartos. Existe em toda a ilha somente um “orelhão” telefônico, com grande limitação para realizar ligações internacionais. Tivemos a impressão de estar perdidos no mundo, sem acomodações para a noite e sem poder falar com o Brasil.

O jeito foi esperar com paciência. Felizmente após algumas horas, mas ainda sob chuva forte, fomos informados pelo dono do único hotel que, na ilha próxima, denominada Black Point, havia uma pequena pensão com um quarto disponível. Esperamos até às 15 horas, quando a chuva deu uma acalmada. Decolamos com destino a Black Point, mas, para nossa surpresa, o tempo no setor noroeste, nossa rota para a Flórida, estava limpo.

Decidimos continuar até a ilha de Andros mantendo condições Visuais. As condições no caminho melhoraram ainda mais, e sobre Andros pedimos autorização para “Miami Radio”, para entrada no espaço aéreo americano conseguindo chegar em Fort Lauderdale, às 18h30.

Pousamos para os tramites alfandegários nos Estados Unidos. Salvamos assim um dia que parecia perdido. Após meia hora (trabalho muito simples e desenrolado), decolamos para o Fort Lauderdale Executive Airport . Pousamos às 19h20. Taxiamos para o hangar da Banyan Air Services, onde fomos recebidos com um tapete vermelho (praxe local oferecida até para a nossa pequena, mas valente, aeronave).

Fort Lauderdale – Avião em manutenção para troca de altímetro. Decidimos instalar um altímetro sensível com dois ponteiros, por ser mais adequado para o vôo. A meteorologia no interior dos Estados Unidos não permitia nossa saída para Oshkosh. Surgia neste momento a preocupação com a data de chegada na feira, pois tínhamos ainda três dias de vôo até lá. Em todo os USA havia muita chuva com trovoadas, alagamentos e até alguns tornados.

Nova tentativa – Decolamos logo cedo, mas perto de Vero Beach, ainda na Flórida. Retornamos devido ao mau tempo. Começamos a pensar em ir para a feira de Oshkosh de avião comercial, pois estavam previstos mais dias de mau tempo ao longo da nossa rota, sem possibilidade de desvios.

Não queríamos perder a feira de jeito nenhum! Com a tentativa de vôo frustrada, pegamos então um avião comercial e chegamos à noite em Oshkosh. Foi uma decisão correta baseada na prudência, porque as más condições meteorológicas previstas se confirmaram.Visitamos a feira no sábado e no domingo.Assim terminou nosso vôo, em 27 de julho de 2001. Nossas atividades profissionais nos obrigavam a estar no Brasil no dia 1º de Agosto. O nosso valoroso e fiel FK9, U-5242, está retornando para o Brasil dentro de um “container” e estará pronto para mais uma “aventura” no próximo ano.

Agradecimentos – Para comunicações foram instalados dois rádios VHF da marca BECKER AVIONICS, um dos nossos patrocinadores. Cada um de nós levava no próprio pulso um relógio com ELT em 121.5MHz, marca BREITLING EMERGENCY, série especial “ORBITER”, cedidos pela BREITLING e pela NATAN que também patrocinaram o vôo. Nossas roupas foram fornecidas pela rede de lojas TRACK & FIELD de São Paulo, que também nos apoiou.

Um laptop para o cálculo e acompanhamento da navegação, bem como os equipamentos para fotos e vídeo digitais sobre a viagem, foram fornecidos pela empresa LAPTOP SHOP de São Paulo. A RALLYE DESIGN modificou os assentos do FK9 permitindo que ficássemos confortavelmente sentados por muitas horas de vôo. O representante do FK9 no Brasil, a empresa ALPHA BRAVO do Rio de Janeiro, colaborou na instalação do tanque extra, na instalação dos rádios mencionados acima, e nos deu todo o apoio na obtenção dos documentos da aeronave, para que pudéssemos realizar o vôo dentro das datas previstas.

Obrigado a todos.

Este texto foi escrito por: Michele Perrone

Last modified: janeiro 9, 2002

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Redação Webventure
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