Ninguém aprende a pedalar e logo em seguida se inscreve no Tour de France. A mesma coisa vale para qualquer esporte e, em especial, para corridas de aventura.
Para correr a Expedição Mata Atlântica é preciso muita resistência, força muscular e força de vontade. O pior de tudo, todos atletas concordam com isso, é ficar sem dormir depois de um dia inteiro de cansaço. Para isso, infelizmente, não há treinos.
Tomando a Expedição Mata Atlântica do ano passado como exemplo, vimos que as equipes que se saíram melhor não foram aquelas com os atletas melhor preparados, por incrível que pareça. Ao invés, foram aquelas cujos atletas tinham larga experiência em provas de longa, longuíssima, distância e tinham habilidade em mountain bike, trekking e orientação. Não adianta pedalar 2.000 quilômetros por mês no asfalto porque andar na terra, por trilhas, é outro esporte. Também não adianta correr uma maratona por mês porque na hora de andar sobre pedras, atravessar rios e dunas carregando uma mochila, o maratonista prega antes do trekker.
Como diz o Giorgio, meu bom amigo e companheiro de equipe:
– Treinamento para uma corrida como a EMA é um estilo de vida.
Nada mais verdadeiro. Mas é claro que a regularidade é essencial. No mundo dos esportes, nada vem sem dor. Quem não pratica um esporte de forma competitiva, pelo menos cinco vezes por semana, no mínimo duas horas por dia de segunda a sexta e puxadas mais longas nos finais de semana, não pode esperar muito numa corrida como a EMA.
Para quem quer ter uma noção do que é uma rotina de treino, clique na minha tabela de treino de Julho para ter uma idéia. Não sou atleta profissional, trabalho dez horas por dia de terno e gravata, fico preso no trânsito e muitas vezes sou obrigado a comer um sanduíche para não morrer de fome – maus exemplos – mas sou o mais regular que posso. Meus companheiros de equipe têm mais tempo e, no caso da Adriana, mais compromisso com o esporte – ela é mountain biker profissional.
É impossível treinar tudo e ainda por cima treinar bem. Em agosto comprei uma canoa canadense da Opium, fábrica do Fábio Paiva, de Santos, que fornece embarcações para a Expedição Mata Atlântica, assim poderemos remar de vez em quando também.
Entrosamento da equipe
Uma coisa é estar em forma, outra é estar em sintonia. O ideal seria que eu e minha equipe nos víssemos ou falássemos ao telefone pelo menos dia sim e dia não. Mas eu, o Bill e o Reginaldo moramos em São Paulo, enquanto o resto da moçada mora em Campos do Jordão. Sempre que posso passo o fim de semana lá, treino com eles e conversamos sobre a corrida; durante a semana ligo para cada um, ou eles me ligam, pelo menos uma vez.
No ano passado, depois de terminada a corrida, eu estava conversando com um atleta de uma equipe que se desmanchou ainda no meio da prova. Incompatibilidade de gênios sobre pressão. O cara me disse:
– Duro não foi remar, caminhar e pedalar três dias. Foi agüentar os outros dois!
Acho que depois, mais calmo e descansado, ele entendeu que a exaustão destruiu a relação que eles tinham, seja ela qual fosse. Mas conversando com ele mais um pouco, descobri que eles mal se conheciam, tinham pouco em comum e se juntaram dois meses antes para correr a EMA. O resultado era previsível: desastre.
Úlitimo passo: diversão
Juntando tudo que eu disse aqui, a mensagem final nesta introdução é simples: corridas de aventura já são extenuantes demais sem a pressão da cobrança, não importa de que lado ela venha.
É preciso se divertir se preparando para a prova, como é preciso se divertir durante ela. Quem correu o ano passado e não percebeu a beleza da vista ao amanhecer, do topo da Ilhabela; ou não ficou encantado com a limpeza da água nos rios que cruzamos; ou ainda não sorriu de felicidade descendo de bicicleta a maravilhosa estrada da Petrobrás, que desce a serra no meio da mata atlântica até Caraguatatuba, simplesmente perdeu o melhor da corrida!
Este texto foi escrito por: Guilherme Cavallari
Last modified: setembro 16, 1999
