Webventure

Equipe baiana escreve sobre a final do Try On Adventure Meeting


Prova largou de madrugada e debaixo de chuva (foto: Cristina Degani/ www.webventure.com.br)

Confira aqui a galeria de fotos do evento!

A prova começou já na sexta, em um prólogo de vertical. Quatro competidores, um de cada equipe, duelariam em um sistema de cordas para decidir a ordem de largada. Como eu tinha mais experiência, fui o escolhido. Estava com uma dor de cabeça da zorra, mas não tinha jeito, já que durante o desafio, haveria transição de cordas e meus companheiros nunca haviam feito isto. Tinha uma ascensão, seguida de uma tirolesa positiva e depois, um rapel. Tive um azar danado pois caí na bateria junto com o Rafael da Lontra e o cara da Lobo Guará. Fiz a parada muito bem, sem me enrolar e cheguei praticamente empatado com o cara da Lobo Guará. A lontra ganhou o desafio. Largaríamos, portanto, na terceira bateria, às 04:55 da manha de sábado. Embarcamos nossos equipos no “buzú” da organização e partimos pra Paraibuna, pra assistirmos o breffing.

Após o breffing, Alan, Tati e Pedro dormiram que nem uma pedra em cima de umas esteiras. Só pra variar, não consegui dormir o que mais pra frente faria uma diferença muito grande.

Às 4:45, as equipes da primeira bateria perfilaram-se sob o pórtico de largada, debaixo de uma chuva que nos acompanharia praticamente durante toda a prova. A adrenalina estava a mil e o ambiente estava totalmente eletrizado. Lembro que o locutor estava instigando a galera fazendo a chamada das equipes e um rock pesado tocava a toda a altura.

A hora – Chegou nossa bateria. Largaríamos dez minutos atrás da galera da primeira bateria. Explodimos logo na largada e assumimos a primeira colocação da nossa bateria, pouco a frente da Landscape. A entrada da trilha estava um pouco difícil de achar, mas com habilidade na navegação, fizemos um trekking preciso e alcançamos a galera da segunda bateria. Muita gente se perdeu neste inicio. Largamos teoricamente em vigésimo e batemos o pc 1 já em décimo quinto.

Aqui começou a primeira sessão de tortura da prova pela qual passamos. Com pouco conhecimento de ducks, pegamos um que estava com a parte inferior furada e nem percebemos. Eu e Pedro estávamos neste duck e Alan e Tati em outro (pelo menos este estava legal). Quase fiquei louco, pois não entendia o porque de não conseguir fazer o leme. Durante o treino na Usp, consegui fazer o leme de primeira e já estava craque na parada. O danado insistia em pender pra direita. Estava fazendo muita força pra tentar controlar o bicho e logo meu ombro direito estava completamente tijolado.

Só me lembro de Pedrão tentando me confortar dizendo que era psicológico, que eu estava nervoso e era só me acalmar. Quando eu e Alan resolvemos trocar de posição, a ficha caiu: estávamos com um duck furado. Já estávamos longe pra voltarmos e a solução foi seguir em frente. Pra controlar o bichão, os caras tiveram que sentar na almofadas de encosto das costa e remar como se estivessem em uma canoa caiçara. O duck estava parecendo uma piscina de tanta água dentro. As equipes que passavam riam do nosso infortúnio e não acreditavam que estávamos conseguindo fazer o diacho ir pra frente.

Resultado: mesmo com toda a força feita por Alan no leme, nosso progresso era muito lento. Eu e Tati tínhamos que parar e esperar por eles toda hora e várias equipes nos passaram. Se não me engano, foram mais de cinco horas nesta agonia.

Depois de mais de vinte quilômetros, chegamos no pc 3 na vigésima terceira posição. Estávamos atrás dos Kabas meia hora, da galera da Terra uma hora e da galera da Tapuias uma hora e meia.

Partimos forte para um trekking. De cara, escalaminhamos um morro muito íngreme e nos deparamos com duas opções de caminho: a primeira e mais óbvia seria um single por cima de uma serra (acredito que a maioria das equipas optou por esta pois o caminho estava mais óbvio) e a segunda seria descermos o morro pela outra face e encontrarmos com um estradão de barro (eu havia sugerido este antes da prova pois o deslocamento seria muito mais rápido).

Pedrão foi genial e pegamos um atalho por um pasto e encontramos mais rápido o estradão. Quando chegamos nele, foi só alegria. Enquanto a galera fazia um trekking puxado, corríamos feito loucos por uma estrada que era na sua maioria descida. Batemos o pc 4 já em décimo sétimo e na frente dos Kabas.

Logo que saímos do pc 4, os Kabas e mais outra equipe chegaram. Foi legal o pega que fizemos pois não estávamos dispostos a entregar nossa posição. Corremos forte, inclusive nas subidas mais suaves e conseguimos abrir uma boa vantagem. Este trekking foi puxado, com muitas subidas punks o que me fez lembrar da prova do Brasil Wild. Passamos por dentro de um chiqueiro, escalaminhamos morros e descemos por ladeiras íngremes enlameadas.

Mais tortura – Na aproximação do pc 5, cometemos um pequeno erro e tivemos que dar uma pequena volta. Batemos ele em décimo quarto, se não me engano e partimos pra uma bike insana, que se configurou na segunda sessão de tortura da prova.

Quando peguei a bike, percebi que Mateus havia esquecido de colocar as sapatilhas nos pedais. Este at não teria apoio. Mas pra minha sorte, isto se mostrou a coisa certa pois mais empurramos a bike do que pedalamos. Erramos o caminho e tivemos que dar uma varada por um single trekking insano pra chegarmos no pé da serra que teríamos que escalar (com as bikes). Antes disso, perdemos um pouco de tempo, pois meu pneu havia furado. Acho que nem o pico do gavião, no Brasil Wild, se compara com a serra que subimos.

Pra piorar, devido a chuva que insistia em cair, o que era estrada virou um lamaçal. Parecia muito o trecho final da prova em SFC, só que a diferença era que era uma subida. Superado esta sessão, batemos o pc 6 na décima sexta posição.

Começamos a descer a serra e, mais uma vez, o cara lá de cima resolveu testar nossos brios. O cabo de aço do freio traseiro de Tati arrebentou. Alan trocou de bike com ela e me deu a sua mochila. Com a chuva forte e o deslocamento lento, já que nas descidas ele tinha que descer da bike, o frio bateu muito forte. Foi aí que ele começou a fazer o frei usando a sola de seu tênis. Pra chegar no pc sete, escalapedalamos um morro completamente enlameado até chegar em uma represa. Encostamos na galera da Terra e devido à rápida transição, os passamos.

Aqui, a equipe se separava. Dois integrantes ficariam no pc descansando e dois partiriam para uma escalaminhada rumo ao pc 8, do vertical. Esta escalaminhada foi completamente insana. Quem participou da Cacrrasco, foi parecida com a escalada do morro da cobra. Eu e Alan chegamos nas cordas antes da galera da Terra e rapidamente fizemos o vert. Voltamos para o pc sete, nos alimentamos com um miojão quentinho e delicioso, acordamos Tati e Pedro e partimos rumo a à terceira sessão de tortura, uma bike miserável rumo ao pc 9.

Pelo mapa, parecia que a esta perna de bike duraria duas horas. Ledo engano. Muitas subidas e lama nos atrasaram bastante. Em uma descida, nossa guerreira perdeu os freios já completamente gastos e saiu gritando: To sem freio, uaiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiii! O pânico foi geral. Gritávamos pra ela colocar o pé no pneu traseiro mais não adiantava. Era uma ladeira muito íngreme e a solução que ela encontrou foi se jogar em um mato que beirava a estrada. Fez-se um silêncio de uns dois segundos. Ela se levantou. Apertamos o quanto pode os freios e partimos. A galera da Terra colou novamente e ficamos em um pega insano até o pc 9.

Batemos praticamente juntos o pc nove e rumamos para o dez, para mais uma sessão de tortura. Nada que eu tenha feito ou pedalado se compara com o que estava á nossa frente. Simplesmente, teríamos que subir por uma das faces da Serra do Mar, os inúmeros morros que a compõe e descermos os mesmo morros, que desta vez, sem freios, debaixo de uma chuva e com muitas valetas e barro. Foi massacrante. Animal. Quase sobrehumano.

Sem freio – Nossa guerreira teve uma baixa psicológica e tive que dar muita atenção a ela. Mas manteve-se firme Acredito que era mais medo do que cansaço. Estava realmente muito perigoso, mas estávamos completamente determinados a completar a prova. Passamos por uma equipe que estava trocando as pastilhas de freio e a menina deles me disse que éramos loucos de descermos as pirambas sem freios. Disse ainda que a coisa ia piorar mais pra frente e que era pra tomarmos muito cuidado pois as valetas eram enormes. Alan e Pedro foram na frente e eu fiquei com Tati, trabalhando o psicológico dela.

Em uma descida, ela não conseguiu controlar a bike e caiu em uma valeta. Foi um tombo feio onde ela bateu a virilha no quadro da bike. Chorou bastante e sentia muitas dores. Ajudei ela a se levantar e disse que faltava pouco (uma mentirinha nestas horas é perfeitamente aceitável). Ainda faltava muita bike e o stress de descer as pirambas já estava se tornando insuportável. Esta não foi, definitivamente, uma prova pra quem queria se divertir ou fazer eco turismo. Foi uma prova massacrante.

Estava bem fisicamente, porém, as duas noites sem dormir agora estavam pesando. Não conseguia enxergar nada mais além de dois metros. Estava completamente sem freios, com um sono insuportável e ainda tinha que dar toda a atenção do mundo pra nossa guerreira que estava com medo do desafio. Tinha momentos que fechava os olhos por alguns segundos e quando abria, estava quase fora da estrada. Tive algumas alucinações. Por duas vezes enxerguei Mateus e cheguei a acreditar que havíamos finalmente chegado ao pc 10.

Toda hora via pessoas atravessando a estrada e tomava um susto danado. Alan, quando parava pra nos esperar, também dormia em pé. O frio era intenso e estávamos completamente encharcados. Porém, estávamos determinados a alcançar o pc 10. Já estava pensando em uma solução pra continuarmos na prova já que estávamos muito debilitados. Tinha que dormir nem que fosse meia hora. Finalmente, depois de toda tortura alcançamos o pc 10 na décima primeira posição.

Devia ser umas quatro da matina. Nos alimentamos muito e tiramos uma soneca dentro do porta mala de uma Palio Weekkend. Nem sei como conseguimos esta façanha. Mateus nos acordaria quando o dia começasse a raiar pra partimos para mais umas seis horas de trekking. Fechei os olhos e dormi quase que instantaneamente.Quando Mateus nos acordou, parecia que havíamos dormido apenas um minuto, mas na verdade, já havia se passado 55 minutos. O frio era quase insuportável.

Eu fui o primeiro a levantar e o acompanhei até o pc pra pegar umas dicas sobre o desafio que nos aguardava: um single trekking por dentro da Serra do Mar. Tremia tanto que parecia que estava tendo um ataque epilético. Foi muito casca grossa, mas a medida que ia me aquecendo, as energias iam voltando. Nos alimentamos e partimos muito animados pro pc 11 que estava pertinho do dez e tinha a função de balizar o início do single trekking. Quando estávamos saindo do pc 10, a Terra (PE) estava chegando.

Galera, este single foi simplesmente animal. Desceríamos a Serra do Mar por dentro da Mata-Atlântica, por dentro da selva mesmo. Ficamos três horas dentro do mato, cruzando rios, passamos ao lado de uma cachoeira belíssma e ouvindo o canto de pássaros. Foi um momento duro, um trekking muito puxado, mas que nos deu a verdadeira sensação de estarmos em uma corrida de aventura. Um verdadeiro jungle-trekking. Foi um momento que jamais esquecerei na minha vida. Pedro demonstrou muita habilidade, pois, toda hora a trilha parecia sumir e ele, com seus conhecimentos da Chapada Diamantina, parecia um farejador de trilhas. Me ensinou por exemplo, que analisando as raízes, da pra saber se a galera passou ou não por ali. Foi um momento único.

O fim – Saímos da floresta e encontramos com a equipe médica que nos deu a notícia que éramos a última equipe que completaria a prova. Nos deram os parabéns e disseram que havíamos sido verdadeiros guerreiros pois a prova havia sido realmente dura e que completá-la, por si só, seria uma vitória.

Pensamos que a tortura havia acabado, mas, mais uma vez, a prova havia reservado uma surpresa nos seu final. Pra batermos o último pc antes da chegada, o pc 12, teríamos que escalar um morro animal, por uma trilha enlameada e íngreme. A parada era tão casca grossa que não acreditamos quando nos deparamos com a trilha. Mas, a esta altura, nada nos deteria.

Começamos a subir na boa e meu joelho, que tinha agüentado o suplício, começou a chiar. Quando chegamos finalmente no pc 12, percebemos que ainda havia mais uns três morros piores que este pra escalarmos e desescalarmos antes de chegarmos na praia de Maresias. Nunca senti tanta dor na minha vida. Meu joelho latejava, mas eu pensava comigo: “você superou tudo e não vai ser agora que vai desistir”. Ouvíamos o barulho das ondas arrebentando nos rochedos enquanto subíamos, às vezes de quatro, a trilha enlameada.

Superados os quatro morros, demos de cara uma visão muito próxima do paraíso, a praia de Maresias lá embaixo, a Serra do Mar que parecia avançar sobre o mar, a Ilhabela ao fundo e a sensação de dever cumprido. Foi inesquecível. Imagens que ficarão gravadas pra sempre na minha memória. Pegamos a estrada rumo à praia de maresias e, quando chegamos nela, demos uma corridinha rumo ao pórtico de chegada. Mateus veio ao nosso encontro e nos demos as mãos e cruzamos a linha debaixo de muitos aplausos. Foi inesquecível.

Esta prova nos deu a noção exata do que deve ser uma prova de aventura, em todos os seus sentidos. Demonstramos muita garra pra superar todos os imprevistos, alguns típicos de qualquer corrida e outros oriundos simplesmente do azar. Me ensinou que o auto controle é fundamental em uma prova de aventura pois quando o físico não segura, cabe ao cérebro a tarefa de nos impulsionar rumo a chegada.

Saímos dela mais forte do que entramos. Me ensinou que não se deve desistir de uma prova sem antes chegar ao pc, pois lá, com todo a apoio, suas energias são renovadas e a confiança reestabelecida. O papel do apoio, em uma prova destas é importantíssimo e Mateus foi crucial pra completarmos a prova.

Com toda sua energia, era impossível não se contagiar. Contamos com o apoio também de Sabrina, uma amiga de Pedro que mora em Campinas que, com muita atenção, cuidou muito bem de nós.

Garra – Das quarenta e cinco equipes que largaram, somente onze cruzaram a linha de chegada, o que demonstra a magnitude do desafio que encaramos. Fomos a única equipe do nordeste a completar a prova e, se não me engano, a sexta equipe que disputava a final do Try On, de quinze. Em algumas conversas com a galera de sampa, eles nos confessaram que esta prova foi realmente diferenciada no quesito dificuldade. Se pudesse resumir em uma palavra esta prova, com certeza seria GARRA.

Gostaria de agradecer a todos aqueles que acreditaram em nossa equipe e nos ajudaram nesta empreitada, buscamos ao máximo representar bem nossa comunidade diante da nata do esporte. Temos ainda muito a evoluir, mas como já havia escrito antes, estamos no caminho certo. Um abraço a todos e lembrem-se: PIOR É NA GUERRA.”

Este texto foi escrito por: Gaia, da equipe Gantuá