
Aresta para o cume (foto: Fábio Couto Rosa)
A montanhista e colunista do Webventure Helena Coelho conta como foi a escalada ao Monte McKinley, no Alaska (EUA), expedição que fez logo após a tentativa de escalada sem oxigênio ao Everest neste ano. O McKinley (ou Denali) é a mais alta montanha da América do Norte e tem 6.190m. Saiba com ela como é a viagem até lá, quais são os requisitos para escalar a montanha e outras dicas e curiosidades contadas pela experiente montanhista.
Alaska… Sempre pensei em ir escalar o McKinley, mas não tinha nada definido. Até que surgiu a oportunidade. Dois brasileiros interessados em ir para lá praticamente me intimaram. Vamos com a gente. E lá fui eu procurar literatura, contatar amigos que já haviam ido para eu ter todas as informações necessárias. Afinal, eu tinha a responsabilidade de levar duas pessoas para lá.
Encaminhei ao Parque Nacional Denali com três meses de antecedência a solicitação juntamente com o currículo; ao receber a autorização e agendar previamente a palestra que seríamos obrigados a ter lá com o ranger, senti que o caminho para a montanha Denali, como é chamada por lá, com 6.190 metros de altitude e a mais alta da América do Norte – estava sendo trilhado.
Marquei de encontrar com os dois lá em Anchorage, uma vez que eu estaria vindo do Nepal… após um longo vôo, lá estava eu indo para o hotel que eu já havia reservado. Nos encontramos e já saímos para ver material compras e aluguel. Pode-se alugar e comprar tudo por lá. As raquetes para andar em neve fofa, as botas, os crampons, etc.
Em Anchorage, há grande e pequenas lojas de material para montanha para a gente perder a noção do tempo. Nem percebi que o dia estava indo. Afinal, lá, no verão não há noite.
Tratamos então de, já no dia seguinte, ir para Talkeetna, uma cidade a bem da verdade parece mais uma pequena e aconchegante vila a mais ou menos 4 horas de veículo que você contrata em Anchorage.
Aí, fomos imediatamente para a companhia aérea que nos levaria ao glaciar em um avião pequeno para 3 ou 4 pessoas com esqui abaixo das rodas. Pousa diretamente no glaciar. Claro que tivemos que esperar uns dois dias para voar, o tempo não andava lá essas coisas.
Fomos ao parque, onde nos registramos e ouvimos uma extensa palestra do ranger, explicando como era a montanha, mostrando fotos e dizendo das normas que vigoram por lá. Lá você não precisa ter guia para escalar, você pode escalar só ou com seus amigos. Mas, se você quiser dizer que tem guia, este deverá ser americano.
Todo o lixo deve ser trazido para baixo, os sacos plásticos que são usados para banheiro também devem ser ou atirados em alguma greta muito funda ou também trazidos para baixo. Mesmo o xixi não pode ser feito em qualquer lugar, pois senão em algum momento,quando estiver derretendo neve para fazer água, você poderá estar fervendo em sua panela o xixi de alguém…
Os espaços para as barracas só podem ser considerados de uso seu quando você montar a barraca. Não pode fazer reserva de espaço simplesmente colocando alguma sacola ou cordinha no local. Se ela não estiver montada, o espaço não será seu. Ah! Como seria bom se isso valesse para o Himalaia…
E, ainda no final, ele pergunta se a montanha é para você. Se você diz sim, está liberado para ir.
No local em que o aviãozinho aterrissa, você recebe o combustível e os trenós. Você, além de sua mochila, leva um trenó com parte da carga. A carga é bem grande, pois você terá que levar comida para uns 20 dias de expedição, além de combustível e, claro, o material todo para o acampamento e para a escalada: corda, cadeirinha, mosquetões, snowbar ou pregos para gelo, piqueta, material de acampamento, roupas, etc. Todo o período que você ficar na montanha, você estará acampando, escalando em glaciar.
Como não faz noite nesse período, nós chegamos já vestidos com roupas apropriadas, usando as botas duplas. Arrumamos nossas coisas nos trenós, colocamos os snowshoes – as raquetes – nas botas, nos encordamos e já começamos a nossa caminhada. Fomos para o primeiro acampamento a 2.300 m.
Tivemos que cavar, fazer muro com blocos de gelo para evitar os efeitos dos fortes ventos isso se repetiu em cada acampamento a 2.800 m, a 3.200 m, a 4.200 m de altitude onde fica o acampamento base, a 5.200 m onde fica o acampamento de altitude…
É uma rotina preparar bem o local de acampamento, pois, senão você poderá ficar sem a sua barraca. Nós avistamos uma voando do acampamento de 5.200 m que foi parar em uma greta quase 1.000 m abaixo.
Nevou praticamente todos os dias que lá estivemos; uns dias mais outros menos. Nos dias que fazia um pouco de bom tempo, nos deslocávamos para o acampamento seguinte. Quando chegamos no último campo, tivemos que ficar quatro dias esperando bom tempo. No quinto dia, havíamos definido como o dia do movimento: ou iríamos para cima ou para baixo, pois o nosso período já estava se esgotando…
No dia seguinte, às 6 horas, eu decidi que subiríamos. Após toda a demora para fazer água, tomar o café da manhã, saímos e nos colocamos na fila com mais umas 50 pessoas para subir para o Denali Pass. Na subida, várias pessoas desistiram por causa do mau tempo neve e vento branco. Eu, por ouvir um e outro dizendo que não estava tão frio, etc., resolvi apostar na subida, apesar da neve.
Quando chegamos quase na subida para a aresta do cume, tivemos a sorte de ter céu azul e nada de vento. Naquela altura, éramos apenas 11 pessoas subindo; os demais haviam realmente desistido. Fomos subindo a parede para a aresta e torcendo para que o tempo continuasse daquele jeito pelo menos mais algumas horas.
E deu certo. Subimos para a aresta – que é simplesmente maravilhosa e, claro, a parte mais exposta, com excelente tempo. Em alguns pontos, você tem que colocar um pé de cada lado da aresta. Fui ao cume juntamente com os dois. O visual é simplesmente maravilhoso… eu só posso dizer que a região é linda demais, a escalada é bem legal e que vale muito o esforço para se chegar lá.
A única nota ruim é que no acampamento de altitude, algum engraçadinho trocou o crampon novinho que o Fábio – um dos brasileiros que foi comigo – havia comprado por um já bastante usado, de outra marca e que saía toda hora do pé. Infelizmente, mesmo com todos os cuidados, há gente boa e gente nem tanto em todo lugar, mesmo no paraíso que é essa montanha.
Este texto foi escrito por: Helena Coelho
Last modified: julho 26, 2006