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Expedição de caiaque chega em Natal

Acompanhe a seguir o relato da expedição dos dois remadores brasileiros de Recife até Fortaleza. No texto abaixo a dupla conta sobre a passagem por Natal e as amizades feitas pelo caminho

Dia 25 – Saímos cedo de João Pessoa, que nos agradou bastante como cidade
grande, em um clima bem tranqüilo, e rumamos norte com proteção da barreira de recifes até sair deles e pegar o mar um pouco mais mexido, mas nada de muito agitado. Na praia de Lucena paramos para um almoço e ficamos acompanhando a comunidade pescando com uma técnica que há muito não se vê em São Paulo: uma jangada leva uma rede de 90 braças para fora e os pescadores as puxam com cordas de volta pra praia, trazendo bastante sargaço e camarões e peixes.

Como o dia tinha rendido bem, demos um belo relax na praia e seguimos pra praia de Coqueirinho mais tarde. Uns 3 km antes veio uma surpresa: deveríamos entrar na baia da praia de Coqueirinho, mas havia uma barreira de corais que não acabava nunca e o mar explodindo alto e bem agitado. Quando uma onda maior nos levantava, dava pra ver uma lagoa calma e tranqüila depois dos recifes. Encontramos afinal a entrada e paramos até numa prainha atrás dos recifes pra descansar um pouco. Por sorte, tínhamos passado apenas um pouco da praia de Coqueirinho, que não possui luz elétrica e é bem pouco movimentada (como a gente gosta!).

Dona Maria, de 82 anos e muito engraçada, fez um peixinho frito com arroz pra gente e dormimos felizes da vida, debaixo de um ranchinho de palha dela. Nesse dia o Agnaldo jurou que tinha visto uma foca (e das grandes!) sair da água, do lado do caiaque. Depois que fomos ligar os pontos: perto de Coqueirinho está a Barra de Mamanguape, uma base de preservação do Peixe boi, que tem quase uma tonelada e vive nos rios, mas sai pro mar tb. Dona Maria nos falou que provavelmente era o Xuxu, o peixe boi mais antigo da reserva, que vive solto. 42 km de percurso.

Dia 26 – Acordamos às cinco, como todo mundo aqui, pois já ta claro, e em meia
hora de remada passamos por Baía da Traição, que é totalmente turística. Incrível como Coqueirinho permanece quase selvagem, sendo tão perto de Traição…

A parte da manhã foi um desafio contra o sono… pouco vento, muito sol, um bafo danado e uma praia bem bonita, com falésias, mas com ondas violentas. Resolvemos não arriscar uma parada e continuamos por seis intermináveis horas, com vagas grandes até a primeira praia de RN, Sagi. A primeira vista, parecia que o mar não estava muito amigável, mas depois vimos umas jangadinhas e barcos de pesca ancorados atrás dos recifes e deduzimos que daria para aportar, que até que foi tranqüilo. A saída é que pegou! As ondas estavam com um metro de altura, quebrando bastante forte e na primeira tentativa, tivemos que desistir e voltar, pra tirar a água do barco que tinha inundado.

Na segunda, empurrei o barco contra as ondas, já com o Agnaldo a postos e de saia vestida, quando entraram 3 ondas gigantes, que o golpearam no peito sem dó. Como o barco meio alagado, o coração na boca, conseguimos sair e foi quando demos conta que tínhamos perdido um membro da expedição: a minha carranquinha de tantos anos e viagens não resistiu o impacto das ondas e se foi… Morreu lutando bravamente! Fizemos um minuto
de silêncio pra ela…

De acordo com os caiçaras de Sagi, a Barra de Cunhaú deveria estar muito perigosa e nos recomendaram entrar em Sibaúma. Chegamos em Cunhaú as 5 da tarde, achamos até uma possibilidade de entrada meio apertada nos recifes, mas demarcada por um pau e resolvemos checar mais pra frente, quando nos demos conta que já estava quase escuro e não seria nada confortável, ter que encontrar a próxima entrada no escuro. Optamos voltar um pouco e entrar na primeira entrada mesmo. Já escuro, dona Nova nos levou para a futura pousada do Sr Humberto, que nos recebeu muito bem e demos várias risadas com os
projetos mirabolantes da pousada. O povo daqui realmente é muito hospitaleiro.

A intenção era ter chegado em Pipa, mas já tínhamos remado 58km no dia, deduzi que fiz algum erro no calculo das distancias pela carta náutica, que não traz todas as praias. O próximo dia que seria de descanso, resolvemos então ir até Pipa.

Dia 27 – Tomamos um café da manhã tranqüilos e nos informamos como sair da barra de Cunhaú, que da terra não parecia estar muito grande, apesar da previsão das ondas ser de mais de 2 metros. Preparamos tudo e fomos saindo pelo canal com maré enchente. O canal foi se estreitando e as arrebentações do lado direito e esquerdo começaram a se aproximar bastante, com um tamanho já bastante considerável (já passando pro assustador), apesar de não tão forte. Foi quando um vagalhão enorme estourou uns 20 metros na nossa frente e nos arrastou de ré de volta, capotando o barco.

Agarramos os remos e o barco, para tentar não perder nada, enquanto outras ondas atropelavam a gente. O Agnaldo subiu no caiaque alagado e eu fiquei de ancora de proa, pra não deixar o barco virar de lado pra ondas e devagar fomos voltando na barra, até eu conseguir entrar no caiaque alagado tb e voltarmos são e salvos pra terra firme! Foi um susto danado! Santo Marcos, projetista da Original Kayaks, que além dos compartimentos de carga, projetou mais duas câmeras estanques somente para flutuação, que nos salvou a pele. Mesmo com o barco totalmente submergido e com uns 200 litros de água, conseguimos retornar à terra, com o Juatinga são e salvo!

Resolvemos sair então pela entrada que entramos e realmente foi muito mais fácil, quando demos volta por fora da barra é que pudemos ver o tamanho das ondas! Cruz credo! O mar tinha crescido consideravelmente e as 10 começou a ventar forte (uns 20 nós) e vira e mexe uma vaga passava por cima do caiaque, mas sem muito perigo. Chegamos na Pipa após duas horas mas não nos animamos de ficar por ali, com aquele volume incrível de turistas.

Seguimos então pra Tibau do Sul, lugar bem mais tranqüilo e com uma lagoa linda. Apesar do terror dos caiçaras de Pipa, dizendo que a barra de Tibau era pior do que a de Cunhaú, demos a sorte de ver uma lancha saindo dela, que nos mostrou o caminho e entramos bem tranqüilos. O Farmácia, um surfista paulista radicado há muito tempo no local nos recebeu muito bem tb e voltamos a Pipa para dar uma voltinha. 25 km no dia.

Dia 28 sábado – Saímos de Tibau do Sul, da casa do Farmácia, com tudo favorável: corrente do rio vazando pra fora e vento em popa de sul. Ufa! Rasgamos os mares com a vela cheia até as falésias de Tabatinga e paramos para um almoço e descanso.O mar já está bem mais tranqüilo.

Tínhamos combinado de nos encontrar com um amigo canoísta de Natal,o Airton, na praia de Pirangi do Sul e já avistamos o carro e o caiaque em cima na praia de Tabatinga. Ele acabou nos acompanhando num trecho entre Pirangi e a praia de Cotovelo e aí passamos pela Barreira do Inferno (base aeronáutica de lançamento de foguetes e treinamentos), cuja entrada e parada na praia é proibida. Um helicóptero veio até dar uma olhada no “torpedo amarelo” que estava cruzando os mares da base militar!

Nessa tarde pegamos a maior ventania da viagem até agora e o mar estava totalmente a favor, fazendo as maiores velocidades da viagem: 16km/h! Só diversão! Surfamos ondas tão compridas, que só ficávamos dando risada! Entramos no rio Potengi, em Natal, passamos por baixo da ponte gigante que vão inaugurar em breve e fomos recebidos por Airton e Ricardo, o diretor de vela do Iate Clube de Natal, que nos recepcionaram muito bem.

Tivemos atendimento VIP e até lavamos o barco e os equipos. Obrigado a todos em Natal! E Airton até nos presenteou com o melhor hotel na viagem até agora. Na recepção nos perguntaram se iríamos usar o cofre e caímos na risada! só se fosse pra guardar o resto do provolone do almoço… Combinamos de sair à noite, deitamos um pouco pra descansar e quando abrimos os olhos, já tava de manhã… 58 km navegados. Pelo vento favorável, decidimos emendar 2 dias e tirar o domingo de folga em Natal.

Dia 29 domingo – Dia de folga!
Acordamos mais tarde, escrevi todo o diário atrasado, tomamos um mega café da manhã e fomos pra Genipabu, andar de sandboard. Alugamos uma prancha e deu pra se divertir bastante. Inclusive filmamos até umas video cassetadas que ficaram bem boas! Fomos almoçar num restaurante regional nordestino excelente, o Mangai. Fomos pro Iate Clube fazer os reparos na base da vela e conhecemos um casal de alemães, que já estão no mar desde 81, num veleiro de madeira de 1920.

Eles são músicos e vão parando pelos bares da vida, pra tirar um din din e continuam a sua jornada por onde o vento os levar… Pode ser que nos encontremos de novo em Fortaleza. Combinamos amanhã de passar no barco deles antes de sair.

Este texto foi escrito por: Agnaldo Gomes e Christian Fuchs