Cachoeira da Velha – Rio Novo (foto: Arquivo Pessoal/ Maurício Marengoni)
O aventureiro Maurício Marengoni relata sua expedição pelo Deserto do Jalapão, no Tocantins, após passar pela Chapada dos Veadeiros , em Goiás.
No dia 2 de Janeiro, embaixo de chuva, saímos de Alto Paraíso de Goiás rumo a Ponte Alta do Tocantins, o portal de entrada do Jalapão. A estrada é de pista simples e seguimos rumo Norte na GO-118 até Campos Belos, seguindo depois em direção a Arraias em Tocantins, usando a TO-296/BR-010, sempre rumo Norte. Chegando próximo a Paranã, continuamos na BR-010 e TO-050 rumo a Natividade e Chapada de Natividade. Logo depois de Chapada de Natividade, cerca de 10 km, há uma saída à direita para Pindorama de Tocantins: é uma estrada de terra, mas acredite, é a BR-010.
O trecho entre Pindorama do Tocantins e Ponte Alta do Tocantins esta sendo asfaltado, mas partes ainda são em estrada de terra. Todo este trecho de terra pode ser evitado seguindo até Porto Nacional e de lá para Ponte Alta, mas eu não resisto a uma estrada de terra nas férias, esta em particular pode ser feita, tranquilamente, com qualquer veículo. O trecho total tem cerca de 530 quilômetros e para fazer tudo em asfalto você pode acrescentar cerca de 200 quilômetros a mais. É necessário uma atenção extra porque Tocantins não usa o horário brasileiro de verão.
Chegamos em Ponte Alta do Tocantins por volta de 5h da tarde e, como não tínhamos almoçado ainda, fomos procurar um local para comer alguma coisa. Em Ponte Alta, não existem muitas opções e acabamos indo a uma lanchonete próximo a rodoviária (Skinão). Nos hospedamos na Pousada Planalto de Dona Lázara, que conhece tudo sobre o Jalapão. Acertamos um guia para nos acompanhar, um professor de escola de primeiro grau em um assentamento de Ponte Alta, Oziel, uma pessoa muito divertida e que nos acompanhou por todo este trecho da viagem.
Sobre o guia, é possível encontrar tracks de GPS da região, mas com poucos detalhes. Algumas atrações muito bonitas não possuem indicação e, se você não souber que ela existe, você acaba não conhecendo. Para nós, o guia foi bem útil (o custo foi de R$ 50,00 por dia). Uma coisa legal na região é que os guias podem dormir nas pousadas e, muitas vezes, se alimentam nos restaurantes de graça, sem custo extra para o turista.
No primeiro dia, resolvemos explorar os lados de Ponte Alta, seguimos na direção de Pindorama e depois na direção de Almas e Rio da Conceição, onde fica a cachoeira da Fumaça, no rio das Balsas (aproximadamente a 100 quilômetros de Ponte Alta). A cachoeira é bonita e fácil de ser encontrada. Chegando ao Rio das Balsas (é um rio largo com uma ponte de madeira), estacione o carro ao lado do rio e caminhe uns 200m para chegar à cachoeira. O rio possui locais para banho seguindo do lado esquerdo da ponte, antes de atravessá-la.
Há uma trilha que desce e passa por traz da cachoeira, porém, o IBAMA interditou a trilha (pelo menos é o que os guias e pessoal das pousadas estão dizendo). A questão pra mim é, porque interditar? Porque não arrumar a trilha de forma que ela não apresente perigo para o local e para os turistas? Esta é uma diferença muito grande entre locais públicos como este no Brasil e nos Estados Unidos/Europa. Lá, os locais são preservados, mas o público tem acesso. Aqui, o mais fácil é simplesmente interditar.
Da cachoeira da Fumaça voltamos e paramos na cachoeira do Soninho, uma cachoeira bonita e que parece pequena, mas que tem um canyon profundo. Para chegar à cachoeira do Soninho (já voltando para Ponte Alta), a entrada fica do lado esquerdo, uns 500m depois de passar a ponte do rio Soninho. O banho fica na parte de cima do rio (pare o carro próximo à ponte), inclusive com uma prainha. Uma coisa que parece comum na região é se levar uma churrasqueira portátil e preparar um churrasco nestes locais. A mim parece meio perigoso, principalmente na época de seca.
Passamos pela Pedra Furada (voltando para Ponte Alta, fica do lado direito uns 12 quilômetros da estrada que liga Ponte Alta a Pindorama), imperdível, onde fizemos um lanche e logo tivemos que sair, pois a chuva estava armando. Voltamos a Ponte Alta e seguimos neste dia ainda até o canyon do Sussuapara, que fica no caminho para Mateiros e tem placa indicando o local. Um canyon pequeno, mas bonito, e que possui indicação na beira da rodovia que vai para Mateiros. Visitamos o local embaixo de chuva e depois voltamos para a pousada para um banho quente e depois para umas comprinhas de artesanato local de capim dourado.
O dia amanheceu com sol e seguimos para Mateiros pela TO-030 (estrada de terra). Iria ser um longo dia, a primeira parada foi a cachoeira do Lajeado (fica do lado direito da estrada a uns 20 quilômetros de Ponte Alta, não possui indicação). A cachoeira do Lajeado possui diversas quedas, excelente para banho. Leve um saco plástico para proteger a máquina fotográfica, pois é difícil descer os vários níveis da cachoeira sem molhar a câmera. O poço da cachoeira, lá em baixo, é fundo e de água cristalina, o acesso é mergulhando da laje (coisa de 4m) ou uma trilha do lado esquerdo da cachoeira. O trecho de acesso para o Lajeado é uma estrada de areião, em que é necessário cuidado se estiver com carro comum. Se tiver chovido muito, aconselho não arriscar.
A segunda parada neste dia foi na cachoeira da Velha, no rio Novo. O acesso é fácil, após a subida de uma serrinha (único trecho da TO com uns 30m de asfalto, a cerca de 80 quilômetros de Ponte Alta), na bifurcação, siga pela esquerda e rode mais uns 30 quilômetros, para ir a Mateiros (você terá que voltar pela mesma estrada). Esta é a maior cachoeira do Jalapão, o rio é bem largo e a cachoeira é impressionante.
O acesso é por uma estrada ruim, mas acessível a qualquer veiculo. O local para banho é uma prainha que fica um quilômetro a frente, onde há uma trilha da cachoeira da Velha até a prainha. A trilha estava em condições precárias, porém o acesso é possível. Paramos na prainha onde fizemos um lanche antes de seguir viagem.
No retorno da prainha/cachoeira da Velha, pegamos um atalho por uma trilha de areia solta (não use se estiver com carro comum) que economizou alguns quilômetros até Mateiros. A última parada do dia foram as Dunas (entrada de R$ 5,00 por pessoa). As Dunas são formadas por uma areia alaranjada e fina que é transportada da Serra do Espírito Santo até ali pelo vento. A formação é bonita, mas se você conhece as dunas do Rio Grande do Norte ou do Ceará, com certeza vai se decepcionar um pouco, pois as Dunas do Jalapão são bem menores, mas de um colorido intenso.
É incrível como alguns turistas brasileiros são mal educados. As pessoas vão a um local como este para observar a natureza e, embora existam diversas placas instruindo o turista a não subir/descer as dunas pela parte frontal, vários o fazem só pra tirar uma foto, não percebem que estão reduzindo a altura da duna lentamente, enfim…
As dunas são locais onde as pessoas geralmente vão para ver o por do sol. Nós não acreditamos muito, pois o céu estava bem encoberto e resolvemos seguir para Mateiros (já era quase 7h da noite). O acesso às Dunas é indicado na TO, a estradinha, nesta época do ano, é de areia solta e alta (carros comuns terão dificuldade).
Seguimos para Mateiros, a uns 30 quilômetros das Dunas, e fomos jantar uma comida caseira no restaurante de Dona Rosa, também imperdível. Ficamos hospedados na Pousada Panela de Ferro, sem a menor dúvida a melhor de toda a viagem, não apenas em termos de instalações, mas também com relação ao café da manhã. O mangulão servido no café da manha é delicioso. Não se espante com o site da pousada que tem alguns erros de português e fique hospedado por lá.
No terceiro dia, levamos o nosso guia para fazer um passeio novo, que ele ainda não conhecia. Fomos fazer a trilha da Serra do Espírito Santo (volte pela TO uns 27 quilômetros no sentido de Ponte Alta, o acesso à trilha fica à diretia). A trilha esta bem indicada e começa com uma subida puxada e depois mais três quilômetros de caminhada até o mirante principal. Lá de cima é possível ver as Dunas e ter uma visão panorâmica muito legal do Jalapão. O trecho foi percorrido em cerca de duas horas.
De lá retornamos a Mateiros para um almoço no restaurante da Dona Rosa e, após o almoço, fomos conhecer o povoado da Mumbuca (seguir, a partir de Mateiros, no sentido de São Felix do Tocantins, existem indicações na TO) local de origem do artesanato do Capim Dourado, bastante explorado na região e que surgiu no povoado através do esforço de Dona Miuda, que faleceu em Novembro de 2010, mas os artesãos locais continuam com seu trabalho e o local merece ser visitado.
Para fechar o dia, fomos visitar o fervedouro de Mateiros (R$ 5,00 por pessoa), que fica na mesma estrada que leva ao Povoado da Mumbuca. O fervedouro é basicamente uma mina com grande volume de água e um fundo de areia fina. Na região central da mina, a água se mistura com a areia e altera a densidade do líquido (Conclusão: as pessoas não afundam). A sensação é estranha a princípio, pois não se sente o fundo do lago, mas o corpo de recusa a afundar, é muito legal e tem que ser conhecido, nunca havia visto um local assim.
Na volta pegamos a chuva do dia, descansamos um pouco na pousada e saímos para comer uma pizza na única pizzaria de Mateiros (Pizzaria Carioca). A pizza é boa e resolveu o problema, mas leve a sua cerveja, ele não vende na pizzaria.
A idéia era dar a volta no Deserto do Jalapão. A maioria das pessoas retorna de Mateiros para Ponte Alta (160 quilômetros por terra) e depois seguem para Porto Nacional. Nós queríamos conhecer o resto do deserto e seguimos para São Felix do Tocantins. A primeira parada foi na Cachoeira do Formiga. A entrada é em uma estrada bem em frente a um posto do Parque Estadual do Jalapão. A cachoeira é simples, mas eu nunca vi uma água tão cristalina. O poço da cachoeira tem pelo menos 3,5m de profundidade e a gente vê as pedras do fundo. É possível ainda tomar um ótimo banho de hidro massagem na cachoeira, outra atração imperdível.
De lá, seguimos então para São Felix onde almoçamos no restaurante Jalapão, comida caseira muito boa também . Em São Felix fomos conhecer o fervedouro de lá: a idéia é a mesma, mas eu achei o fervedouro de São Felix mais bonito (ele é aberto e o sol bate no lago, o visual em si é diferente). A idéia do fervedouro é exatamente a mesma. O nome fervedouro vem do fato de que a água subindo constantemente forma bolhas de ar e revolve na superfície da mesma forma que água fervendo.
Depois do fervedouro, fomos conhecer a prainha de São Felix, que fica no rio do Sono, um local bonito e agradável que tem estrutura para acampamento e um banho de rio bem tranquilo. Da prainha, seguimos para Novo Acordo. No caminho, há uma serra que pode ser visitada, há uma trilha para um mirante e uma lanchonete na base. Nós não paramos porque tivemos um pneu furado e queríamos chegar em Palmas no final do dia.
A cidade de Novo Acordo é maior que Ponte Alta do Tocantins e possui uma estrutura melhor. Segundo moradores locais, existem atrações em propriedades particulares, mas o acesso é proibido – uma pena, pois a cidade oferece uma estrutura melhor para os turistas, mas não há muito o que fazer hoje por lá.
De Novo Acordo até Palmas, o acesso é por asfalto, porém não existe uma sinalização adequada. Na cidade de Aparecida do Rio Negro, tivemos que perguntar mais de uma vez como sair em direção a Palmas. Chegamos em Palmas por volta de 9h da noite. Palmas possui uma infraestrutura de cidade grande, vários hotéis e restaurantes, é só escolher um que agrade, ficamos no Hotel Fit, simples, limpo e com um preço adequado (R$ 150,00 por casal com café da manhã).
Saímos de Palmas e seguimos em direção a Porto Nacional, atravessamos o Rio e seguimos pela TO para Brejinho de Nazaré e Aliança do Tocantins onde pegamos a BR 153 (Belém Brasília). Que estrada horrível, muitos caminhões, muitas vezes andando em comboio, com cinco a seis caminhões, muito difícil de serem ultrapassados. E com infinitos buracos.
Depois de Jaraguá, seguimos na direção de Petrolina de Goiás até a chegada em Goiânia, onde paramos para passar a noite. Ficamos hospedados no hotel Íbis. No dia seguinte, seguimos na direção de São Paulo. A estrada tem pista dupla, mas aqui e acolá tem buracos bem grandes.
A ponte, já próximo à divisa com Minas Gerais, está em obras e o trânsito é controlado passando um lado de cada vez. Quando se entra em Minas Gerais é uma aventura: as estradas do Jalapão são melhores. Eu segui em direção a Uberlândia e depois Uberaba e finalmente a Anhanguera até São Paulo.
Segundo informações locais, o nome Jalapão vem de uma planta que era abundante na região, chamada de Jalapa, e que pode ser vista em alguns locais. As vias que interligam as cidades do Jalapão e algumas estradas mais importantes são de cascalho e na época da seca fica um poeirão e muita costelinha (na época das chuvas tem lama). Os acessos aos atrativos locais são, em geral, de areia solta e não recomendado a veículos comuns (note que arrumar um trator para reboque não é uma tarefa trivial, você pode ter que caminhar mais de 20 quilômetros) ate a sede de alguma fazenda e ainda vai ter que pagar algo em torno de R$ 150,00).
As cachoeiras do Jalapão são menores que aquelas que vimos na Chapada dos Veadeiros, mas nem por isso menos bonitas e possuem um toque mais selvagem. Uma facilidade do Jalapão são os acessos. Você consegue chegar de carro bem próximo aos locais e as trilhas tem de 200 a 500m, bem diferente dos quase seis quilômetros de trilha do Parque Nacional da Chapada dos Veadeiros. Se você não possui aquele preparo físico, o Jalapão é para você.
A estrutura de restaurantes, bancos, sinal de celular entre outras coisas ainda é bem precária no Jalapão, leve dinheiro, poucos locais aceitam cartão de crédito e/ou cheque.
Embora se pague para entrar nas propriedades que tem algum atrativo (não são todas), não existe estrutura alguma (banheiro, local para troca de roupa, local para venda de água ou algum lanche), bem diferente, por exemplo, de locais em Bonito, MS.
A época ideal para ir a estes locais é uma questão de escolha. Na seca, as cachoeiras estão com menos água e a vegetação está seca e possivelmente queimada. Nesta época do ano, o visual é mais bonito, mas corre-se o risco da chuva. Pretendemos voltar por lá num período de seca para comparar. No total, rodamos cerca de 5.300quilômetros: foram 1.250 quilômetros para chegar a Alto Paraíso, mais 550 quilômetros de Alto Paraíso a Ponte Alta e, de Palmas a São Paulo, foram 1.900 quilômetros. A diferença foi o que rodei na Chapada e no Jalapão. O custo da viagem ficou, na média, R$ 200,00 por pessoa por dia entre combustível, hospedagem, alimentação e gastos gerais. Só não entrou nesta conta as compras que fizemos durante a viagem.
Meu nome é Maurício Marengoni, sou professor universitário, tenho 51 anos e fiz esta viagem em uma Mitsubishi Pajero TR4, sempre com minha companheira Karla. Para maiores informações sobre a viagem e dicas, por favor, entre em contato pelo e-mail: mmarengoni@hotmail.com.
Este texto foi escrito por: Maurício Marengoni
Last modified: fevereiro 8, 2011