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Helena Deyama: “Não pode ter moleza só porque é mulher”


Piloto acredita que segredo é não desanimar com os obstáculos e dificuldades (foto: Theo Ribeiro/ www.webventure.com.br)

Piloto de rali, designer gráfica, artista plástica e diretora de uma empresa de publicidade e design gráfico. Helena Deyama é um exemplo de “mulher moderna”. Graças a muito esforço e determinação, se revezando entre diversas atividades, que ela conquistou seu espaço no off-road, até então dominado pelos homens. Prova de seu sucesso foi a conquista do Campeonato Brasileiro de Rally Cross-country ao lado da navegadora André Quintal, na categoria Super Production Diesel, em 2005, quando se tornou a primeira mulher do mundo a vencer uma competição de automobilismo.

“A conquista causou espanto para aqueles que ainda eram meio céticos pelo fato de eu ser a única mulher competindo neste meio tão competitivo, e alegria para tantos companheiros que me admiram e torcem por mim. Sem dúvida foi uma grande conquista para ganhar mais credibilidade no meio”, contou. No entanto, para chegar ao topo Deyama precisou enfrentar diversos desafios.

Sua carreira no esporte começou em 1995, quando participou dos primeiros raids e ralis. Em 1999, estreou na modalidade cross-country, e 2003 nos ralis de velocidade. A piloto participou sete vezes do tradicional Rally dos Sertões, terminando sempre entre os dez primeiros na categoria. Entre seus principais títulos estão a Copa Baja 2005, na categoria Super Production, e o Rally Terra Brasil 2004, na categoria Protótipos, além, é claro, do Brasileiro de Cross-country, em 2005.

Na entrevista que Helena Deyama cedeu ao Webventure na semana do Dia da Mulher, para falar sobre a participação feminina no esporte, a piloto contou sobre o início de sua carreira e as dificuldades que encontrou para cumprir seus objetivos. Dentre os principais obstáculos citados por Deyama estão o preconceito e a inexperiência. Para ela, o fato de ter que “provar sua capacidade para conquistar o respeito” é um problema que as mulheres enfrentam em todas as modalidades.

A piloto ainda falou sobre sua trajetória vitoriosa, como ganhou o respeito de seus colegas e patrocinadores e de que maneira as mulheres podem compensar a menor força física em relação aos homens. Para aquelas que ainda acreditam que pilotar é coisa para meninos, Helena, que é solteira e não tem filhos, fala sobre como levantar muita poeira sem perder a feminilidade, além de dar dicas para driblar questões femininas como a TPM durante treinamentos e competições. Segundo ela, ser mulher pode trazer muitas vantagens na hora de pilotar.

Confira abaixo a entrevista de Helena Deyama na íntegra:

Webventure – No off-road, um esporte dominado por homens, que tipo de dificuldades você encontrou por ser mulher quando começou?
Deyama – A primeira dificuldade é meio obvia, que é o preconceito pelo novo, pelo “diferente”, ou seja, eu era o peixinho fora d’água vista pelo ângulo daqueles que estavam no seu habitat natural. Daí vem a força de vontade para vencer a insegurança, o efeito psicológico de ter de mostrar do que é capaz. Aliás, este é um problema que todas as mulheres enfrentam em qualquer modalidade, tem de provar sua capacidade para conquistar o respeito.

A outra dificuldade foi a inexperiência, a falta de força física para enfrentar situações como trocar pneu, cavar ou empurrar para desencalhar um carro em situação adversa, operar equipamentos pesados, improvisar para reparar falhas mecânicas no meio da trilha, ou seja, todas as surpresas que você tem de estar preparado para enfrentar numa prova de off-road. Mas hoje me viro bem, aprendi muito com os companheiros de trilha, e já passei por muita encrenca sem me embaraçar.

Webventure – Quando se consagrou campeã brasileira de cross-country, em 2005, você acredita que tanto pilotos como patrocinadores tenham começado a te olhar com outros olhos?
Deyama – Com certeza é um título que comemorei muito, porque foi a consagração depois de muito esforço, determinação. Foi a realização de um sonho. A conquista causou espanto para aqueles que ainda eram meio céticos pelo fato de eu ser a única mulher competindo neste meio tão competitivo, e alegria para tantos companheiros que me admiram e torcem por mim. Sem dúvida foi uma grande conquista para ganhar mais credibilidade no meio.

Mas infelizmente o patrocínio continua difícil, talvez pelo fato do rali não ser um esporte bem divulgado no sentido comercial. Tento desenvolver um trabalho com empresas ligadas a produtos femininos, mas o interesse pelo rali ainda é uma coisa que tem de ser muito trabalhada.

Webventure – Você acredita que o fato de haver poucas mulheres no esporte se deve a falta de interesse delas pelo off-road?
Deyama – No universo das mulheres que tenho tido contato, acho que o fato não é falta de interesse, porque todas as que conhecem um pouco do esporte ficam fissuradas e dizem sonhar em serem pilotos como eu. Mas as pessoas não tem muita informação sobre o esporte.

Despertado o interesse, tem de se apaixonar, ir atrás, não desanimar com os obstáculos e dificuldades, lutar para conseguir o que quer. Além disso, é um esporte que exige independência financeira, por ter um custo alto, e também de tempo, porque estamos sempre viajando e envolvidos com diversos eventos. Então, a mulher tem de ser muito independente e o fato de ter filhos, marido, complica um pouco.

E fora tudo isso, muitas dizem não ter coragem. Isso é característica da fragilidade feminina, por isso eu faço questão de incentivá-las, dizendo que se eu, que sou tão pequena, frágil e feminina, tenho coragem (aliás, é difícil eu ter medo de qualquer coisa), todas elas podem vencer esta barreira.

Webventure – Em um de seus depoimentos você disse que a menor força física das mulheres em relação aos homens é compensada “com maior determinação, disciplina, técnica, estratégia e concentração”. Você poderia explicar melhor quais são os artifícios que a mulher tem para compensar a força física?
Deyama – Para compensar o menor porte físico, treino pesado, musculação, natação e corrida. Me alimento com muito critério, e cuido da cabeça, ou seja, do lado espiritual, sentimental e psicológico. Não perco oportunidade de treinar, aprender, perguntar, me desenvolver. Não pode ter moleza só porque é mulher, tem de ter mesmo toda esta determinação, disciplina e dedicação.

As técnicas e estratégias durante as competições eu vou criando com a experiência, mas para isso preciso estar esperta, um simples vacilo pode colocar tudo a perder. Nisso as mulheres levam vantagem, porque é uma característica feminina pensar em várias coisas ao mesmo tempo, se organizar, ter calma na hora do apuro e ser mais cautelosa. Além do “jeitinho” feminino de fazer as coisas.

Webventure – Os fatores como TPM, a tensão pré-menstrual, menstruação e gravidez afetam de alguma maneira o desempenho da mulher no off-road?
Deyama – Esse é um capítulo muito sério e importante. Não há como negar que mais que todas as outras diferenças, as mulheres são fisiologicamente muito diferente dos homens. Não dá para alterar nosso ciclo sem efeitos colaterais.

Felizmente não sei o que é TPM, mas ficar menstruada durante um rali é um problema sério. Além de ter de ficar praticamente o dia inteiro dentro do carro, pilotando no meio do mato e não ter as condições de higiene propícias para o período, nosso organismo reage de forma diferente a pressão, a temperatura do corpo, a resistência, tudo se altera. Acho que é o problema mais complicado de se lidar.

Mesmo sem a menstruação, o simples fato de fazer xixi já é um problema. Quanto à gravidez, exige uma mudança radical em todas as atividades em função do bebê. Então está fora de cogitação continuar no esporte.

Webventure – Baseada na sua grande experiência como piloto, que tipo de dicas você daria para as mulheres que se interessam em iniciar uma carreira no off-road?
Deyama – Sobre os treinamentos, tem de começar pelo treinamento pessoal. Quando pensava em começar, procurei cursos, mas foi difícil encontrar alguma coisa na área. Então a dica é andar com pessoal mais experiente e confiável, comprar seu próprio 4×4 e começar a aprender na prática. Acho importante começar em trilhas com amigos, para conhecer o equipamento e aprender técnicas off-road.

Outra dica é pesquisar na internet e em revistas especializadas para saber o que acontece no mundo off road e escolher a modalidade que mais lhe agrada, que podem ser expedições, trilhas, passeios, eventos, Raids, Rally de Regularidade ou Rally Cross Country, entre outras.Eu comecei com trilhas, expedições e Raids. São modalidades com menos risco e aprende-se muito. Só depois que fui para competições de velocidade, como o Rally dos Sertões, o Rally Cross Country e o Rally de Velocidade.

Outra dica legal é escolher a marca de 4×4 que mais lhe atrai e participar dos ralis monomarcas. Hoje existem alguns muito bem organizados e de baixo custo, voltados para confraternizar e fidelizar os cliente.

Este texto foi escrito por: Roberta Spiandorim