Em 2014, depois de uma temporada em que mais de 25 atletas de wingsuit morreram em vários acidentes nos Alpes, Dean Potter conversou com a revista americana Outside sobre seu medo, risco e segurança.
Potter tentava construir uma segurança que era praticamente impossível em seu esporte preferido. Viveu de um jeito muito perigoso, mas que segundo ele era onde se sentia mais vivo.
No dia 16 de maio, Potter morreu em um salto do penhasco de Taft Point, localizado à beira de um cânion no Parque Nacional de Yosemite, nos Estados Unidos.
Sobre sentir medo
Muitas pessoas pensam que eu não sinto medo, mas eu sinto. O medo vale a pena porque ele me empurra para esses estados mais elevados de consciência, onde percebo mais. Eu fico mais atento e eu posso manter a calma.
Sobre segurança
Em 2013, mais de 25 pessoas morreram saltando de wingsuit voando na região dos Alpes. Isso me fez parar por cerca de um mês e meio, dar uma pausa, calcular e pensar: isso é realmente seguro? Se eu sobrevivi 1.000 de 1.000 vezes é por causa da segurança ou apenas tenho sorte?
Voltei prematuramente, com certeza. Eu estava desconfortável, com certeza. Eu não me diverti e me senti mal fisicamente. Em seguida, a boa vibe voltou, minhas baterias foram recarregadas e meus amigos estavam comigo. Eu e os três ou quatro caras que saltaram comigo, não entendíamos como as pessoas estavam morrendo. Voar 150 milhas por hora ao lado de uma parede é emocionante o suficiente, você não precisa tentar ser ainda mais machão.
Eu fico dentro de minhas capacidades e nunca vou para esses lugares que são muito duros para lidar. Se você se assustar demais isso poderia fazer você regressar alguns anos. Tem uma lição muito grande sobre escutar a si mesmo: forçar demais é andar para trás. Você pode desistir porque senão você não vai evoluir como gostaria. Para mim, se eu não sinto um projeto, eu não faço, é horrível forçar.
Sobre se aproximar da borda
Enquanto caminho até o precipício eu estou me preparando, tentando respirar e manter a calma. Você visualiza e trabalha o salto em sua cabeça primeiro. Quanto mais preparado você estiver, melhor. Às vezes eu anoto ou desenho. Eu sou muito visual. Eu tiro fotos e formo imagens em minha mente.
Eu tinha problemas com altura. Eu até me lembro de estar frustrado e chorando uma vez. Mas você fica mais confortável conforme pratica.
Talvez em um primeiro momento eu ainda fique nervoso mas não é possível ficar nervoso e com o coração acelerado e ainda fazer a sua arte com um nível elevado. Como a vida em geral, com qualquer uma dessas coisas extremas, você não pode estar no seu estado mais elevado se você está nervoso. Controlar isso é parte racional, parte necessidade. É melhor relaxar ou você vai sair do controle e estragar tudo. Toda a arte é sobre manter a calma.
Sobre gerenciar o medo
Eu me relaciono muito com a cultura japonesa. Eu estudo e leio sobre Miyamoto Musashi, um samurai e budista zen dos anos 60. Ele fala sobre agir sem nenhum pensamento e eu acho isso muito importante. Quando ele estava no campo de batalha, ele percebia que estava lendo a mente de seu oponente. Ele se conectava através da linguagem corporal e dos sentidos. Ao lutar contra outra pessoa ele não podia ganhar a não ser que entrasse sem pensamento consciente.
Então, quando eu subo, eu não penso: eu vou me apoiar nessa rocha, eu apenas faço. Para chegar ao nível de “não pensar” você tem que enraizá-lo em si mesmo, com treino e consistência. Se eu não escalo, salto ou ando em uma linha por algumas semanas ou dias, eu perco a confiança. Para recuperar é preciso praticar minha arte diariamente e fazer dela meu estilo de vida.
Sobre meditação
Toda vez que eu estou tendo alguma dificuldade eu foco na minha respiração e tento relaxar. Eu não sou muito bom em sentar no chão e meditar, tenho problemas com minha paciência, então uso essas habilidades de um jeito bem melhor quando estou me movimentando.
Minha mãe era professora de yoga e quando eu era criança ficava observando ela praticando e meditando. Eu e minhas duas irmãs ficávamos imitando ela e eu podia escutar a diferença na respiração dela.
No fim dos anos 90 eu escalei bastante com Jose Pereyra. Jose era muito estruturado em relação à sua meditação. Ele sempre sustentou que um estado elevado era um estilo de vida para ele. Para mim era mais uma forma de consertar e melhorar minha escalada. Jose faleceu em 2003 (durante uma escalada em Potrero Chico, no México). Ainda assim, sua influência tem sido muito forte para mim. Eu sempre me acalmo me movimentando e respirando.
Sobre envelhecer
O medo não é linear como a idade é. Eu tenho ciclos as vezes estou mais aventureiro ou mais conservador. Conforme fui ficando mais velho, fui percebendo que só porque eu posso fazer alguma coisa não significa que eu deveria fazer. Agora eu penso: é isso mesmo que eu quero fazer? Como eu quero usar minha única chance de viver? Eu sou mais preciso com minhas ações.
Este texto foi escrito por: Webventure
Last modified: maio 20, 2015