Jeferson Biela no primeiro salto (foto: Arquivo Pessoal)
Lembro-me bem do que fiz com o primeiro pagamento que recebi do meu primeiro trabalho registrado em carteira. Não sei ao certo quanto foi, só sei que era o suficiente para pagar uma das parcelas do curso que há anos sonhava fazer: O de pára-quedismo. Também não quis esperar muito economizando dinheiro para pagar a vista, pois caso acontece alguma coisa errada não teria gastado tanto dinheiro assim.
Chegando ao hangar, a primeira vista o que mais me chamou a atenção não foi necessariamente os equipamentos e aparatos tecnológicos do esporte, mas sim uma loira excepcionalmente linda que estava lidando com algumas ferramentas e tudo o mais. Perguntei a um dos rapazes encarregados pela dobragem dos paraquedas “quem era a gatinha” e ele limitou-se a responder – “é a minha namorada, por quê?” E para a minha infelicidade fiquei sabendo que esse era o cara que iria dobrar o meu paraquedas…
Já iniciado o curso, e após ter levado uma bronca por ter dito “pular” e não “saltar” – pois quem pula é só pipoca e perereca – o instrutor perguntou a cada um de nós, alunos, a razão de estarmos aqui. As respostas foram as mais variadas possíveis, desde provar algo a si mesmo, superar o medo de altura e até mesmo fim de namoro, falta de sentido na vida etc. Incrível. Na minha vez, pensei, pense, e respondi que era mesmo pelo desafio irracional com o intuito de manter uma postura machista e ignorante inerente a minha própria natureza desprezível – afinal sou um homem. (não foram bem essas as palavras, mas algo do tipo)
Opção – Optei pelo salto individual acompanhado por dois instrutores, um de cada lado, apenas orientando. O salto duplo teria sido bem mais simples e barato, mas com certeza não estaria compartilhando essa aventura com vocês nesse momento, pois não acho que me sentiria muito honrado em contar que tinha outro cara agarrado em mim (e por trás, o que é pior!). Treinos, treinos, técnicas e procedimentos vistos e revistos exaustivamente por todo o final de semana para que tudo saísse perfeito durante o salto.
No domingo, sorteio para ver quem iria primeiro – obviamente eu fui o escolhido – foto com a turma para a posteridade e embarque no Cessna azul de reputação um tanto duvidosa. No avião estavam empilhados o piloto, os dois instrutores que iriam me acompanhar e um senhor, com seus quase 60 anos de idade e já muito experiente nesse esporte, o que fez com que se esvaísse toda a minha arrogância por estar vivendo essa experiência. Decolamos. O avião custou a subir os quase 10.000 pés (quase meia hora de vôo) até o instrutor dar um tapinha nas costas do piloto e gritar “corta” para o motor desacelerar e podermos nos posicionar.
Saímos do avião e, já em posição de “sela, projetei-me ao vazio. A sensação é extrema, impossível de reproduzir em palavras. Os sons e pensamentos desaparecem por completo, você passa a fazer parte de uma outra dimensão, bem além do real. Gritar é o meio de exteriorizar toda a adrenalina liberada até chegar o momento em que os instrutores exigem a sua atenção, fazem de tudo para trazer fragmentos do nosso consciente à realidade para poderem passar as instruções praticadas no solo.
Sinais com as mãos mostram o posicionamento ideal, tanto das pernas quanto dos braços e a atenção que se deve ter com o marcação do altímetro. 5.000 pés, hora de acionar o punho e sentir o impacto causado pelo velame inflado. Meu Deus! O visual é lindo, mas tenho que me ater aos procedimentos.
Problemas – E como não poderia deixar de ser, identifiquei quase todos os problemas possíveis, começando pelo “twist” (ou linhas enroladas) que resolve-se simplesmente chutando o ar para desmanchar. Em seguido percebi que um dos gomos do velame não estava inflado, então puxei os dois manobradores para baixo e senti uma freiada brusca, ao mesmo tempo em que o gomo problemático inflava-se novamente. Agora sim, tranquilidade para poder curtir o visual e brincar com os comandos dos manobradores.
Alguns longos minutos se passaram até o primeiro contato pelo rádio dando Ok e passando as coordenadas para o pouso. Vento de nariz, tensão constante com o chão crescente a minha frente. Manobradores rapidamente posicionados para baixo, velame recolhido, freiada súbita e contato com o solo seguido de tropeção e um fantástico mergulho de cabeça naquele solo lunar do campo de aviação. Pude perceber que a desaceleração não foi suficiente para evitar a minha aterrisagem desastrada, mas foi muito divertido assim mesmo.
Posso dizer sem dúvida nenhuma que foram os trinta segundos mais caros, porém mais emocionantes de toda a minha vida!
Este texto foi escrito por: Jeferson Biela