Vitor em uma das escaladas no Aconcágua: assumir riscos faz parte da escalada sem guias (foto: Arquivo Webventure)
O acidente no monte Aconcágua com o casal de brasileiros, que culminou na morte do dentista Eduardo Alvarenga da Silva e no resgate da mulher dele a jornalista Rita Bragatto, não tem uma explicação e sim várias possibilidades a partir de um mesmo fato.
Essa é a avaliação do montanhista Vitor Negrete, colunista do Webventure, que escalou até o cume do Aconcágua por cinco vezes. Em 2002, ele fez a escalada na parede sul na companhia de Rodrigo Raineri. Em julho passado, ambos escalaram a montanha durante o inverno.
“É muito difícil avaliar ou julgar as atitudes de todos os envolvidos até que voltem (no caso, a mulher de Eduardo, Rita Bragatto)”, disse Vitor. “Quando estamos em uma situação extrema de alta montanha, o cansaço e o ar rarefeito fazem com que atitudes banais passem a ser muito difíceis”, acrescenta.
Rodrigo está na montanha – O guia e montanhista Rodrigo Raineri, que está com um grupo de clientes na montanha, falou hoje por telefone com Vitor do refúgio em Plaza de Mulas (acampamento base) e mencionou alguns fatores importantes neste acidente. Segundo Rodrigo, o casal teria chegado ao cume às 18 horas, desceu meia hora depois e pediu o resgate às 19 horas e não às 23 horas, como foi divulgado.
Sendo assim, uma das abordagens que está sendo considerada por montanhistas que ainda estão no acampamento base é que a equipe de resgate não agiu prontamente ao pedido de resgate.
Outra possibilidade é que, devido a distância do casal do abrigo principal, Plaza de Mulas (4.370m), o resgate seria perigoso para a própria equipe de socorristas. O casal encontrava-se na Canaleta (6.800m), o último obstáculo da rota normal em direção ao cume, ou seja, estavam a menos 200 metros do cume, e de 2 a 4 horas de descida até Berlin, o último refúgio desta via, a 5.780m.
Vitor contou ainda que, segundo informações de Rodrigo, os médicos do hotel refúgio em Plaza de Mulas declaram como causa da morte de Eduardo edema cerebral e hipotermia. O corpo de Eduardo foi levado para o IML de Mendoza, capital da Província, para necropsia, onde a causa da morte será novamente analisada.
É muito triste essa história toda e nesse momento o mais importante é nos solidarizarmos com as famílias, avalia Vitor Negrete. Tanto eu quanto o Rodrigo acreditamos que a escalada até o cume do Aconcágua, por não ser um desafio técnico, pode colocar muitas pessoas menos experientes em situações potencialmente perigosas, complementa.
Para isso, Vitor e Rodrigo aconselham subir a montanha com guias capacitados e empresas especializadas. Os escaladores têm o direito de irem sozinhos, mas devem estar dispostos a assumir riscos, complementa Vitor.
O Aconcágua é uma montanha potencialmente perigosa e eles estavam dentro do campo de fatalidades, explica, dizendo que a rota normal também pode ser complicada. A chegada ao cume é apenas metade da escalada. Na descida ainda devem sobrar suprimentos e disposição física.
Descida tem 80% dos acidentes – Estatísticas de montanha revelam que 80% dos acidentes em alta montanha acontecem na descida e o do casal natural de Sorocaba (SP) não foi diferente. Com problemas na descida, eles acabaram sofrendo com a baixa temperatura de 30 graus negativos, agravada por ventos fortes.
Em 2001, Vitor e Rodrigo tentaram escalar a parede sul do Aconcágua, antes da realização em 2002. Quando já tinham escalado 2/3 da via, decidiram descer porque sabiam que não teriam combustível do fogareiro (principalmente para derreter neve) e alimento para descer.
Em 1952, o suíço Raymond Lambert e o nepalês Tenzing Norgay estavam a 8,6 mil metros, aproximadamente, a apenas 250m do cume do Everest e voltaram. Sabiam que não conseguiriam regressar com vida da montanha mais alta do planeta. No ano seguinte, Tenzing Norgay voltou à montanha com Edmund Hillary e foram os dois primeiros a conquistarem o topo do mundo.
Este texto foi escrito por: Cristina Degani
Last modified: janeiro 10, 2005