O francês Jean-Louis Schlesser chegou ao Paris-Dakar um ano antes da gente. Eu e o André temos 13 participações e o Jean Louis, 14. Quando o piloto trocou os circuitos fechados pelas areias do deserto, ele vinha de uma carreira cheia de sucessos – o último fora a conquista do Campeonato Mundial de Sport Protótipo.
Das pistas Schlesser trouxe um importante background: ele é um piloto arrojado, sabe andar rápido e acertar carros. E muito mais do que isso: tem a competência para montar uma equipe de talentos, chegando a buscar os melhores do mundo, sem se importar com a bandeira ou custos, para construir carros vencedores. Em suas primeiras aparições no Dakar ficou distante de bons resultados. Mas de sua carreira triunfante no asfalto ele também trouxe o prestígio, atraindo a mídia e, portanto, os patrocinadores.
Como nós começamos correndo no Dakar com motos, Schlesser não significava um adversário. A estratégia adotada por ele e o destaque que recebia da imprensa chamaram a atenção. Em 1992 ele decidiu participar da prova com buggies, na época construídos por terceiros. Um erro primário o fez abandonar o rali nas grandes dunas: esqueceu de equipar o carro com pranchas para desatolar, imprescindíveis para sair das armadilhas da areia fofa, ainda mais com um veículo com tração em apenas duas rodas.
No ano seguinte, aos trancos e barrancos, ele chegou ao final numa péssima classificação, mas como apenas dois buggies completaram o percurso, ele ainda levou um troféu. Na entrega de prêmios nós o procuramos e pareceu lógico perguntar-lhe por que ele decidira participar com aquele tipo de carro, que não tinha a menor chance de vencer o rali. E ele nos respondeu que se tratava de um desafio, além do que construir carros com tração nas duas rodas seria mais barato do que com tração nas quatro.
De lá para cá as coisas mudaram bastante. O regulamento limitou muito a preparação dos carros 4×4 e por outro lado Schlesser passou a construir caríssimos bólidos 4×2 e, aos poucos, foi beliscando uma posição no pódio. Chegou a fazer papel ridículo, mas aí ele começou a mostrar outras qualidades, como a perseverança. Depois também a capacidade de interpretar um regulamento, conquistar parceiros (hoje ele é patrocinado por uma das maiores montadoras da frança e do mundo, por uma fabricante de pneus, pela petrolífera estatal francesa e pela maior indústria tabaqueira da frança). Ou seja, dinheiro deixou de ser problema.
Schlesser conquistou o Dakar 1999, a Copa do Mundo de Cross Country Rally 1999 e o bi no Dakar em 2000. E rumava em direção à conquista do bi na Copa do Mundo, quando em setembro, participando do Master Rally (antigo Paris-Moscou-Pequim, que agora liga Paris a Istambul) capotou. Resultado: uma fratura na coluna. Ele está se recuperando e deverá estar presente no Dakar para tentar o tri. Mas o deserto irá cuidar de apagar qualquer facilidade que se encontre pelo caminho.
André Azevedo, 41, e Klever Kolberg, 38, são pilotos da Equipe Petrobras Lubrax e participam do rali Paris-Dakar há 13 anos.
Este texto foi escrito por: André Azevedo e Klever Kolberg