Dando continuidade ao nosso bate papo sobre o regulamento do Rally Paris-Dakar, vamos falar um pouco sobre como são as divisões da categoria Carros. A indústria automobilística percebeu o valor comercial da vitória no deserto e passou a investir pesado na prova. Na terceira edição, em 1981, os exércitos começaram a ser montados e a partir de então fábricas como a Mitsubishi, Porsche, Mercedes, Range Rover, Lada, Renault, Toyota, Peugeot, Citroën e outros preparadores passaram a investir somas consideráveis, desenvolvendo, testando e corrigindo seus protótipos. Também foram montadas, planejadas e preparadas as equipes de apoio. Estes times chegavam a envolver 50 pessoas, 10 caminhões de assistência, dois carros de assistência rápida e quatro carros de ponta. Algo em torno de 15 milhões de dólares anuais.
Aqui é bom lembrar que o Dakar não é feito apenas de gigantes. Na verdade o grande número de competidores é que faz a festa. O Dakar de 1988 bateu o recorde de número de participantes: 603 veículos (183 motos, 311 carros e 109 caminhões) deram a largada e somente 151 chegaram às praias de Dakar, capital do Senegal. Com base nesta estatística, já dá para entender porque cada concorrente que cruza a linha final já se sente um vitorioso, independentemente da sua classificação.
A organização sentiu a necessidade de premiar várias categorias, como no Campeonato Mundial de Rally de Velocidade, e também de incentivar a utilização de carros praticamente originais, vislumbrando o interesse dos construtores nos seus produtos de série. Assim, durante anos, a categoria carros foi dividida em T1 Maratona, para carros praticamente originais de série, somente com os equipamentos de segurança, a T2 para carros superpreparados, e a T3, onde participavam os protótipos.
Procurando seguir a tendência mundial de redução de custos e diminuição das velocidades, em 94 proibiram a utilização de motores gasolina com turbo, e a potência máxima foi limitada a 300 hp. Mas a maior surpresa aconteceu após o Dakar de 1996, quando ficou estabelecido que as fábricas não poderiam mais correr na categoria T3, a dos protótipos. Na época eram duas as grandes favoritas. A Mitsubishi rapidamente incorporou sua tecnologia num carro de série e passou a competir na categoria T2. Por outro lado, o exército vermelho da Citroën ficou a pé. A fábrica francesa não produzia modelos de série com tração nas quatro rodas e praticamente foi impedida de participar da prova. Justamente um time compatriota da organização, tradicional e vencedor da edição anterior. Aliás, das três edições anteriores. Numa comparação horrível, era como tirar a Ferrari da Fórmula 1.
O choque foi absorvido e o francês Jean Louis Schlesser viu a oportunidade de dar o pulo do gato. Estudou o regulamento, montou uma oficina e construiu um buggy com apoio de outra montadora francesa, a Renault, passando a ser um bicho papão, correndo numa classe especial para buggies com tração 4×2. Para atrair os americanos foi criada a classe especial de Protrucks, que são aquelas gaiolas em formas de picape que correm no deserto americano e do México.
Esta idéia de limitar a participação de fábricas na prova também teve o objetivo de atrair outros fabricantes de veículos off-road. Isso deu resultado. E como o segmento 4×4 está crescendo mundialmente, sua participação na frota mundial é cada vez maior, para este ano a TSO (organização do Paris-Dakar) resolveu inovar. Ela decidiu diminuir o número de categorias e mudar os nomes, visando uma maior facilidade na divulgação e identificação das mesmas. A categoria T1 Maratona passa a se chamar Categoria Produção. Em termos de regulamento nada muda, apenas o nome. A Categoria T2 e a categoria T3, além dos buggies e Protrucks, passam a formar apenas uma categoria, a Super Production. O regulamento será uma mescla do máximo em cada categoria. Ou seja, vale tudo.
Como antes, estas categorias também são divididas em motores gasolina e diesel. Para nós brasileiros isso pode soar estranho, mas o fato é que na Europa não existem restrições para a produção e comercialização de carros com motor diesel. Enquanto no Brasil praticamente apenas picapes e sport utilities podem rodar com este combustível, no velho mundo a oferta de produtos é imensa, desde um veículo econômico a carros de alto luxo.
Resumindo, dez categorias foram fundidas em apenas quatro. Para nós da Equipe Petrobras Lubrax isto se tornou o desafio maior, já que na edição anterior da prova investimos pesado na construção de um Mitsubishi Pajero Full com motor diesel para a categoria T2. Na categoria Super Production Diesel o número de concorrentes será maior, e protótipos passam a duelar conosco. Como nosso carro já estava pronto, seria financeiramente inviável iniciar a construção de outro para tirar proveito do novo regulamento. Então tratamos de desenvolvê-lo ao máximo. Afinal de contas, começar do zero sempre traz surpresa indesejável devido à falta de quilômetros rodados. E, por outro lado, em janeiro de 2001, enquanto estivemos na prova, sempre andamos na frente.
Mas vamos planejar o futuro, já que a própria história do Dakar mostra que não basta se superar. É preciso saber inovar. Diz um antigo provérbio chinês: Se não mudarmos nossa direção, acabaremos por chegar ao nosso objetivo inicial.
Até a próxima!
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André Azevedo, 42, e Klever Kolberg, 39, são pilotos da Equipe Petrobras Lubrax e participam do rali Paris-Dakar há 15 anos.
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Este texto foi escrito por: André Azevedo e Klever Kolberg, da Equipe Petrobras Lubrax
Last modified: dezembro 10, 2001