Amyr Klink concluiu no último sábado (6/4) a etapa experimental da viagem à China, parte do projeto Petrobras Global, que tem objetivo final de chegar à Àsia através do Ártico. Foram 68 dias de tempestades, frio e ondas na Antártica, à bordo do Paratii 2, até a chegada ao Rio de Janeiro.
O Paratii 2 é o veleiro mais bem preparado do mundo. Tenho orgulho desta máquina impressionante, afirmou Amyr Klink na entrevista coletiva de ontem (7/04), na Marina da Glória (RJ). Durante a viagem de volta ao Brasil, o Paratii 2 perdeu o leme principal.
Tenho certeza de que 99% dos barcos teriam ligado o rádio na freqüência de socorro para pedir reboque. Pois voltamos para casa com os dois lemes secundários maravilhosamente bem, conta Klink que, no entanto, ainda pretende aperfeiçoar o sistema de banho quente do barco, que não funcionou como deveria durante os dois meses no continente gelado.
Tripulação – Fabio Tozzi, José Fernandes e Marcos Hurodovich, tripulantes do Paratii 2, também mereceram elogios do exigente comandante.
Espero que eles continuem comigo para futuras viagens, disse Klink, que deve partir rumo à China em maio do ano que vem.
O Paratii 2 ficará atracado na Marina da Glória durante os próximos 15 dias, já que será exibido no Rio Boat Show, que acontece de 12 a 21 de abril.
A viagem – “Foi meu sexto verão na Antártica e, olhando de fora, parece que é fácil. Mas não é. Encontramos muitas dificuldades, o que fez da viagem um teste especial. Para começar, saímos do Brasil em fevereiro, quando todo mundo já está voltando da Antártica. Foi a primeira vez em muito tempo que não houve verão por lá e as condições climáticas e de mar foram rigorosíssimas, o que proporcionou um excelente teste para o Paratii 2.
Tinha muito gelo, muito vento. Chegamos a velejar a 12 nós com visibilidade zero. Se alguma coisa falhasse perderia não só o barco e dez anos de trabalho, mas também os amigos. Entramos em áreas não cartografadas. Atracamos o barco em pedaços de gelo e descemeos como se estivéssemos na Marina da Glória. O Paratii 2 é perigoso: ele é um barco tão bom que parece que tudo é fácil. Talvez por isso a tripulação não tenha consciência das dificuldades que passamos. Mas sou cuidadoso, sei controlar até onde devo ir.”
Rio de Janeiro – “Esta foi a primeira vez que cheguei de viagem no Rio de Janeiro. Nós, paulistas, sempre pegamos no pé dos cariocas mas uma coisa admito: foi um prazer entrar no Brasil pelo Rio. É a cidade mais espetacular do planeta.”
Tensão – “Depois de tanto tempo no mar, a gente quer descarregar. Não sou de beber, mas ontem (sábado) queria ter tomado um porre. Só não enchi a cara porque a Marina e as crianças estavam aqui.”
Viagem à China – “Em outubro, pretendo iniciar a segunda etapa da Viagem à China, que é fazer um novo contorno da Antártica dentro da convergência antártica. O único barco que fez isso até hoje foi o Paratizinho, há três anos. Mas durante três dias não consegui me manter dentro da convergência antártica e acho que, hoje, o único barco no mundo pronto para fazer isso sem transformar a viagem numa aventura é o Paratii 2.
É uma região de ondas gigantes, de 25, 30 metros. Não existem imagens dessas ondulações monumentais e quero registrá-las. Esta segunda fase deverá durar 60 dias. Depois, em maio, deveremos começar a subida rumo ao Ártico para chegar à China.”
Volta para casa – “Há oito dias estávamos na convergência Antártica. Chegávamos a pegar 10 horas de escuridão total durante o dia, com visibilidade zero, ventos e ondas fortes. Mudar o ambiente radicalmente em uma semana é um privilégio e devemos isso ao Paratii 2. Ele tem uma velocidade impressionante.”
Paratii 2 – “É uma máquina bonita. Não sou ufanista, mas dá um orgulho tremendo dizer que o projeto do Paratii é 100% brasileiro. Estive em contato com grandes barcos polares na Antártica, com grandes personalidades do mundo náutico, e todos ficaram impressionados em ver um barco como o Paratii 2 e saber que ele é brasileiro.
Há um certo desdém em relação ao que vem da América do Sul. Pretendo usá-lo para charters científicos, pois ele vai tão longe quanto os grandes quebra-gelos e tem custo baixo. É um barco ousado e me senti orgulhoso do reconhecimento dos navegadores que operam na Antártica
neste verão. Minha tias acham que perdi um parafuso, que tenho relações sexuais com pinguins e focas. Mas não é nada disso. Gosto do desafio de encontrar soluções simples para as coisas.”
Construção do barco – “Com a experiência que tenho, podia ficar fazendo o feijão com arroz e botar dinheiro no bolso. Podia usar as palestras para engordar minha conta. Mas enterrei todos os centavos que ganhei com as palestras no Paratii 2 e não me arrependo nada. Dei quase 1200 palestras e 70% do barco foi pago com dinheiro delas. Foi um projeto de quase dez anos e agora dá para mostrar o resultado.
Se, no começo, tivesse aperecido um Cristo para financiar o Paratii 2, com certeza ele seria uma porcaria. As dificuldades me permitiram fazer bom uso dos recursos.”
Tripulação – “Eles sofreram mais do que eu. Talvez o Paratii 2 tenha levado à Antártica a menor tripulação este ano. Mas foi uma equipe excepcional. Às vezes chamam o Fabio de médico, o Zezinho de cozinheiro e o Marcão de mecânico. Mas o Fabio é um comandante que é médico, o Zezinho é um comandante que cozinha e o Marcão é um comandante que é mecânico.
São excepcionais. Pretendo que eles continuem comigo nas demais etapas da Viagem à China.”
Solitário – “Gosto de navegar em solitário e vou continuar velejando sozinho. É um exercício bonito, que requer mais planejamento. Mas também gosto de estar acompanhado. Marina, minha mulher, veleja melhor do que eu. Sempre saímos juntos.”
Tecnologias – “O Paratii 2 foi inspirado no Antartica, do Peter Blake. Mas o veleiro dele é complicado. Já o Paratii 2 não tem chumbo, não tem lastro. Tem uma quilha retrátil que nos permite ir aonde nenhum outro veleiro chega.
Há cinco dias, perdi o leme principal. 99% dos barcos teriam ligado o rádio na freqüência de socorro para pedir reboque. Pois voltamos para casa com os dois lemes seundários maravilhosamente bem.”
Antártica – “A Antártica virou um foco de atenção de todo o mundo. Embora pareça distante, o que acontece lá afeta diretamente o Hemisfério Sul. Há discussões ambientais importantíssimas. O problema do buraco na camada de ozônio existe e deve ser considerado. Esse verão, em especial, foi ruim para a fauna de lá, sobretudo para as aves. Todos os filhotes de pinguins morrerão por causa do frio e, por conta disso, haverá um decréscimo na população de pinguins. São coisas da natureza.”
Este texto foi escrito por: Webventure
Last modified: abril 8, 2002