Ainda não está provada a relação entre as correntes do oceano e o enrolar das trepadeiras. (foto: Arquivo pessoal)
Para quem anda no meio do mato, é comum procurar por aves, borboletas, por alguma pegada, ou por enormes e magníficas árvores. Mas ninguém procura por trepadeiras. Elas simplesmente não chamam a atenção.
Sempre há quem se lembre que elas dão o golpe nas árvores que investem em toneladas de tecido de sustentação, vulgarmente conhecidos como madeira, para conseguirem atingir a copa, enquanto as trepadeiras, sem praticamente nenhum investimento e muito mais rapidamente, se enrolam nas árvores e atingem a mesma posição e as vezes até roubam um pouco da luz da sua escora. Mas esta história já é conhecida.
Do que pouca gente se dá conta é para que lado as trepadeiras se enrolam. Afinal, crescem a partir do chão e se enrolam para algum lado. Mas para que lado? Acompanhando no sentido do crescimento da planta, ou seja, de baixo para cima, elas podem ir se enrolando no sentido horário (veja ao lado a figura A) ou no sentido anti-horário (veja ao lado a figura B).
Para que lado? – Elas só não podem ir flutuando para cima. Na verdade, algumas trepadeiras, como o maracujá, não se enrolam, mas se escoram sobre a vegetação usando gavinhas. Mas aqui não estamos falando destas, mas sim das que se enrolam.
A primeira reação das pessoas quando eu pergunto para que lado as trepadeiras se enrolam é pensar que tanto faz. Elas se enrolam e pronto. Em seguida, me dizem que deve ser meio a meio. “Algumas vão se enrolar para um lado, outras para o outro”, dizem. Mas não é meio a meio.
As trepadeiras se enrolam mais para um lado que para o outro. Pelo menos aqui nos trópicos. Na Mata Atlântica e em boa parte da floresta Amazônica brasileira, as trepadeiras se enrolam bem mais no sentido anti-horário. Elas brotam do solo e vão subindo pela direita dos troncos.
O mais intrigante, porém, é que há uma diferença no sentido em que estas plantas se enrolam dependendo do local. Aqui, a tendência é para o sentido anti-horário. Já na América Central e em outros lugares do hemisfério norte, as trepadeiras se enrolam mais no sentido horário.
O motivo ainda é desconhecido, mas há um fenômeno que coincide com as observações. Os oceanos e as grandes massas de ar giram no sentido anti-horário no hemisfério sul e no sentido horário no hemisfério norte. Este movimento é provocado pela rotação e pelo formato da Terra, conhecido como efeito Coriolis ou força centrífuga composta.
Como funciona o efeito – Devido à rotação da Terra, a velocidade na Linha do Equador é muito grande, diminuindo em direção aos pólos. No Equador, a Terra tem uma circunferência leste-oeste de cerca de 40.000 km. Como a Terra dá uma volta a cada 24 horas, uma pessoa no Equador viaja aproximadamente a 1.600 km/h em relação ao eixo da Terra. Sobre os trópicos, a velocidade desta pessoa cai para cerca de 1.200 km/h e para 500 km/h nos círculos polares. A 5 km do pólo, a velocidade de rotação seria de apenas 1 km/h. E, sobre o pólo, esta pessoa estaria praticamente parada em relação ao movimento de quem viaja sobre o Equador.
Devido à inércia, quem se afasta da Linha do Equador está a uma velocidade maior que a Terra sob os seus pés. Neste sentido, estando mais depressa que o movimento de rotação da Terra, tenderá a ir para o leste, se adiantando (confira ao lado a figura C e o mapa das correntes do Atlântico) à rotação.
Enquanto isto, quem se aproxima do Equador, está a uma velocidade menor que a Terra sob seus pés e estando mais devagar que esta, tenderá a ir para o oeste, se atrasando (confira ao lado a figura C e o mapa das correntes do Atlântico) em relação à rotação.
Desta forma, uma corrente oceânica no Atlântico Sul tenderá para leste quando estiver se movendo para o sul. Quando for para o norte, tenderá para oeste, girando todo o oceano no sentido anti-horário. No Atlântico Norte, as correntes que se afastam do Equador em direção ao norte tenderão para leste, enquanto as que vão para o sul tenderão para oeste, girando todo o oceano no sentido horário.
Este mesmo efeito age sobre as massas de ar, criando os ventos alísios e, em uma escala bem menor, intefere na água, que desce pelo ralo, e, quem sabe, também aja sobre o crescimento e o enrolar de trepadeiras.
Apesar de parecer improvável que este fenômeno, que atua em uma escala global, possa influenciar a vida de uma simples plantinha, vale lembrar que este mesmo efeito faz com que a água desça pelo ralo de uma pia girando no sentido anti-horário na maior parte do Brasil e no sentido contrário nos Estados Unidos e na Europa.
Nunca se sabe… – A correlação entre o enrolar das trepadeiras e o efeito Coriolis é muito forte, indicando que deve haver uma importante conexão entre ambos. Provavelmente o efeito Coriolis, de alguma forma, atua realmente sobre o crescimento destas plantas. Ele pode deslocar o hormônio de crescimento depositando-o mais em um lado que no outro, ou inclinar a mole e frágil planta, fazendo-a crescer mais para um lado.
Mas vale sempre lembrar que pode também ser apenas uma coincidência, sem haver nenhuma relação de causa e efeito entre Coriolis e estas trepadeiras. Nunca se sabe…
Este texto foi escrito por: Cláudio Patto
Last modified: fevereiro 15, 2002