Acampamento em Whiskey Bridge (foto: Arquivo Pessoal/ Fabio Zander)
Já passou da meia noite e de dentro de minha barraca escuto meio assustado aos estrondos da montanha a nossa frente. Assim foi o dia inteiro no acampamento em Whiskey Bridge acompanhando de uma distância segura o deslizamento de pedras, rochas e lama. A espera de melhores condições climáticas para continuarmos com a pedalada. Vamos nos acostumando com o som, mas na escuridão da noite, que hoje não está estrelada, a coisa fica mais assustadora. Parece que a barraca será soterrada a qualquer momento.
Estou guiando um grupo de seis ciclistas e a nossa disposição um time de apoio para montar e desmontar acampamento, cozinhar e transportar as nossas coisas. Estou na Cordilheira do Himalaia na região de Ladakh no norte da Índia, também conhecida como a Tibete Indiana onde milhares de tibetanos se refugiam. A nossa pedalada começou em Manali e o objetivo era de chegar em Leh, atravessando os maiores passos do planeta de bicicleta.
São no total seis passos a serem transpostos: Rothang (3.985 metros), Baralacha (4.880 metros), Nikli (4.972 metros), Lachalung (5.065 metros), Taglang (5.370 metros), Kardung (5.606 metros). O Rothang, o Baralacha, o Nikli e o Lachalung nós conseguimos. Os outros não foram possíveis, pois a chuva não tem parado e partes da estrada literalmente sumiram. Estivemos no Himalaia bem no início das fortes chuvas que inundaram e destruíram parte do Paquistão e o norte da Índia.
No limite – Para mim um grande desafio como chefe de expedição, coordenando tudo e tomando certas decisões para o grupo. Com ajuda do chefe da equipe de apoio, que é local, me facilitou para analisar situações e mais tarde cancelar parte da pedalada, evitando riscos. Nunca passei grandes riscos com o grupo, exceto um dia em que tivemos um momento no qual não havia escolha ou alternativas e apenas continuar. Estávamos retornando com o nosso micro ônibus 4×4 com destino a Manali e num determinado momento e trecho, nos vimos em meio a um deslizamento de pedras, rochas e lama. As pedras cruzavam nossa frente e a parte de trás do carro, algumas se chocavam na lateral do veículo.
Que sensação horrível! A esquerda o deslizamento vindo da montanha. No meio nosso carro e a estrada estreita, sem possibilidades de retorno ou volta. A direita um desfiladeiro e o rio lá embaixo a centenas de metros. O motorista indiano seguiu acelerando e orando alto para o seu Deus e nós atrás, assustados, calados e enterrados nos assentos, acompanhando toda a situação sem poder fazer nada. O trecho foi transposto em poucos, mas longos minutos. Uma experiência forte para todos e inesquecível. Uma demonstração da força da natureza e de como somos pequenos e frágeis apesar de tudo que aprontamos com o nosso planeta.
Voltamos a Europa sem ter chego a cidade de Leh, mas no ano que vem retorno guiando um novo grupo e espero dessa vez chegar ao destino final e fechar com chave de ouro a subida ao passo mais alto do planeta, o Kardung com os seus 5.606 metros de altura.
Este texto foi escrito por: Fabio Zander