Enduro a pé (foto: Elias Luiz)
A cada temporada estão surgindo novas empresas e novos rios operando rafting, motivados pela expansão desta atividade outdoor no Brasil. Este crescimento impulsiona a indústria nacional e diversas entidades começam a se preocupar em regular a atividade. O que não parece ser problema para as operadoras é encontrar mão-de-obra interessada em trabalhar como instrutor de rafting.
Não importa o sexo, a idade, a classe social, muito menos o grau de instrução ou a ocupação. Em comum, todo o instrutor tem uma satisfação danada naquilo que faz como uma atividade paralela ou de tempo integral. Mas de onde surgiu aquela pessoa que conduz a sua descida?
Tudo começou… – exatamente quando eles estavam no lugar do cliente. O primeiro contato com o rafting da maioria dos atuais instrutores não tinha como ser diferente: por ser uma atividade recente no Brasil, eles experimentaram a modalidade numa descida comercial. Fui convidado por um amigo a descer o rio Juquiá, em Juquitiba (SP). Fizemos e adoramos!, conta João Carlos Ramalho Júnior (Juneca), 30 anos, que se tornou e coordenador de rafting em Brotas (SP), além de tricampeão brasileiro com a equipe Canoar Master.
De segunda a sexta, Flávio Kamada, de 27 anos, é gerente de crédito. Nos fins de semana, ele ajuda outras pessoas a descobrir o esporte como ele. Minha primeira experiência foi em 94, também no Juquiá. Depois desci o mesmo rio outras duas vezes, conta. A paixão quase ficou pra trás… Após um longo período sem ter contato com o rafting, recebi um convite de um amigo para fazermos em Brotas. Foi uma descida tão gostosa que quisemos ir de novo no período da tarde. Um mês depois desci o rio do Peixe (Socorro) e não parei mais.
A prima foi responsável pela entrada de Karla Gonçalves, 21 anos, neste grupo. Tive incentivo de uma prima que foi a primeira instrutora feminina do Brasil, a Fátima de Oliveira. Mas o que mais me cativou foi o contato direto com a natureza e a sensação de total liberdade quando estou dentro de um rio ao descer uma corredeira. É inexplicável! Chego até me esquecer da vida fora dele.
É certo que a maioria dos instrutores é do sexo masculino, mas se engana quem pensa que o rafting é um Clube do Bolinha. Vai estar equivocado também se achar que é necessário muita força física para conduzir um bote. Se ao descer um rio você se deparar com uma instrutora, não se preocupe, as suas chances de virar o bote certamente serão muito menores.
O caminho – Os interessados em trabalhar com rafting precisam freqüentar cursos de formação de instrutores. Quem é aprovado passa a fazer um estágio na operadora. É dali que saem os instrutores para iniciar o aprendizado profissional em rios com corredeiras mais tranqüilas (classes I e II). E as atribuições não se limitam a conduzir botes. A logística, nem sempre simples, de transporte (de botes e clientes), organização e manutenção dos equipamentos empregados e recepção dos clientes tornam a atividade um tanto complexa.
A recompensa por tanto esforço? Seguramente não é só a financeira, pois a maioria ainda tem que se dividir entre o rafting e um emprego convencional. Afinal, o que dá prazer em exercer esta atividade? Contato com as pessoas e com a natureza é a resposta quase unânime. Posso dividir isso com pessoas dos 8 aos 80 anos, explica Marcelo Caetano dos Santos (o Coquinho), 30 anos. Juneca completa: Trabalhamos em um ramo em que todos os clientes já chegam felizes.
A primeira vez – Conduzir um bote com clientes pela primeira vez é um experiência muito especial. Mesmo que tudo ocorra bem e que você saiba que está preparado, paira no ar uma certa tensão. Minha primeira descida como instrutor ocorreu em um dia que o rio estava em um nível muito acima do normal e no meu bote ainda estavam duas pessoas que não sabiam nadar, lembra Flávio. Mas a descida foi um sucesso e os clientes adoraram a experiência.
Mesmo depois de superada a estréia, ninguém está livre de outros sustos ou vivências emocionantes. Uma descida que me deu uma certa lição de vida foi quando levei em meu bote um paraplégico que só tinha movimentos da cintura para cima. Ele estava tão feliz por terem dado aquela oportunidade para ele de fazer o rafting que parecia uma criança, brincando dentro do bote com seus amigos e principalmente comigo (toda hora ele tentava me jogar água), conta Juneca. Uma hora ele olhou pra mim e disse: Cara… eu vejo que você é feliz fazendo isso …não é? Eu olhei bem pra ele (que estava do meu lado) e abri um sorriso enorme. Ele já respondeu: Sabia!
Depois dessa história, fica uma reflexão: o que você faria se ganhasse muito dinheiro? Mudava de vida? Largava tudo o que está fazendo? Estes amigos aqui continuariam a fazer a mesma coisa. Talvez com maior freqüência, conhecendo rios pelo mundo todo, mas o importante é que eles são muito felizes no que fazem. Ser um instrutor é pertencer a uma família que busca amizade, aventura, mas principalmente qualidade de vida.
Newton Nagumo, colaborador da Webventure, é instrutor e atleta da equipe de rafting Canoar Projeto Apó, revelação do Brasileiro 2000. |
Este texto foi escrito por: Newton Nagumo
Last modified: outubro 6, 2000