Caminhada para o cume do Cabeça de Dragão (foto: Danielle Pinto)
Quando o assunto é escalada em grandes paredes, o Rio de Janeiro é o estado brasileiro que concentra o maior número de longas vias. E Salinas ou Parque Estadual dos Três Picos, localizado entre as cidades de Teresópolis e Nova Friburgo , é um dos principais destinos para quem pratica esta modalidade de escalada.
A 180 quilômetros da capital, a região recebe esse nome por causa das três maiores montanhas o Pico Maior, com 2.365 metros de altitude, o Menor, com 2.310 metros, e o Médio, com 2.352 avistadas de longe pelas pessoas que chegam ali pelos povoados de São Lourenço ou Santa Cruz.
A entrada do parque, onde é necessário se registrar, fica a 4 quilômetros de Santa Cruz. É possível chegar de carro até a portaria. A partir daí, é mais 1 hora de caminhada até o Vale dos Deuses, onde há área de camping e de onde é possível avistar as montanhas Capacete (2.197 metros), Cabeça de Dragão (2.082) e Caixa de Fósforos (1.782).
E anote aí: um item indispensável para escalar na região é o Guia de Escalada da Região dos Três Picos (compre em www.publit.com.br), produzido por Sérgio Tartari. A riqueza de detalhes do livro ajuda na hora de localizar as linhas das vias e os poucos grampos existentes. É bom ter o croqui da via que você vai fazer durante a escalada.
A Face Leste do Pico Maior, com seus 700 metros de parede (grau da via: 5V A06+ E3), e a via Cerj, de 400 metros (5V A06+ E3), no Capacete, sãos as duas escaladas mais frequentadas no parque.
A Leste é o sonho de consumo de muito escalador e, para terminá-la, muita gente já pagou o preço de dormir uma noite nas alturas. Conquistada em 1974 por Guilherme Ribeiro de Menezes, José Bezerra Garrido, Waldo Ferreira Guimarães e Waldinar Santos de Menezes, a via é de dificuldade moderada. Mas, por ser longa (são 17 cordadas), a via exige boa orientação e escalada rápida. Na maior parte, a rota não passa de quarto grau, porém as proteções fixas estão longe uma da outra: em alguns trechos, existem apenas três, duas, ou até mesmo uma proteção por cordada de cerca de 50 metros. Ou seja, tecnicamente ela é fácil, mas é necessário ter cabeça tranquila para encarar a exposição, que chega a E3.
Escalar rápido e de forma segura é muito importante em Salinas, pois quando se chega ao cume, se está apenas na metade do caminho, pois a volta é demorada. Eu recomendo começar o mais cedo possível: nesta temporada, fiz três vezes o Pico Maior, e sempre começamos com o sol nascendo no horizonte.
A ideia era estar de volta à barraca ainda com luz caso algo dê errado na descida, como uma corda presa ou se o escalador se perder no rapel, é bom ter algum tempo de luz, para resolver o problema. Os locais aconselham estar no cume por volta da 1 hora da tarde. Já estive em Salinas três vezes, e em todas vi escaladores chegarem tarde demais no topo e depois terem de passar a noite dormindo mais perto das estrelas. A via mais usada de descida do Pico Maior é a Silvio Mendes, de 550 metros. Ela segue por uma sequencia de chaminés, e é bem grampeada, o que facilita a orientação.
Outra dica é escalar o Pico Maior e o Capacete com duas cordas de 60 metros, o que permite que o escalador desça, na maioria das vias, de qualquer ponto da parede.
Capacete
Eu aconselho escalar primeiro o Capacete antes de enfrentar o Pico Maior, já que as vias e o rapel nele são mais curtas. O acesso mais fácil para o cume é pela Rodolfo Chermont, 140 metros (4V A0 6+ E1), que também é a via de descida. E, como o cume do Capacete é grande, é interessante escalar primeiro a Rodolfo para conhecer o ponto onde começa o rapel.
Depois, faça a clássica Cerj, desfrutando de suas dez cordadas. A via tem dificuldade moderada e para os padrões de Salinas, é bem protegida (grau de exposição E2). E ainda é possível utilizar algumas proteções móveis. Esta é uma boa via para avaliar o entrosamento da dupla antes de ir às 17 cordadas do Pico Maior.
Os Três Picos oferecerem dezenas de vias de escalada. É tanta pedra que dá para passar meses escalando ali, sem repetir via. Depois de aclimatado, ou em uma segundo visita ao parque, vale provar outras linhas não tão frequentadas quanto a Leste e a Cerj.
Nesta temporada, durante estada de um mês no Vale dos Deuses, tive a oportunidade de conhecer outras vias. No Capacete, o segundo passo depois da Cerj seria a Kabong, de 450 metros (5VI E2). Apesar de ela ser tecnicamente mais difícil, seu grau de exposição é menor, o que torna a escalada tranquila.
Agora, se a empolgação for grande, vale tentar a Sólidas Ilusões, também de 450 metros (5V E3). Ela é mais comprometida que a Kabong, porém muito estética, com um lindo diedro em proteções móveis, na terceira cordada.
Já no Pico Maior, outra opção é a via Decadence Avec Elegance, de 700 metros (5VIIa E2). Ela segue tranquila até a nona cordada, mas depois vêm mais duas exigentes: a primeira um sexto grau de aderência e, depois, um sétimo grau com regletes. Muitos escaladores preferem subir a Decadence, já que nela não existem as duas chaminés da Leste.
A caminhada da entrada do parque até o Vale dos Deuses, com vista para os Três Picos e o Capacete, já vale a pena. O desnível é grande, mas o terreno é muito bom, seguindo por pastos e estrada de chão.
Já na parte alta, há o acesso para outras trilhas que levam ao cume das montanhas Pico Menor, Médio, Cabeça de Dragão e Caixa de Fósforos. A caminhada mais exigente é a que leva ao Médio: são cerca de 2 horas partindo do vale. No início, ela é a mesma que leva até a base da Face Leste do Pico Maior. Depois, a trilha segue para a esquerda, com placa indicativa na bifurcação.
Na sequencia, caminha-se um pouco na mata e, depois, por alguns trechos de rocha e alguns platôs que estão quase caindo. Este é o local mais enjoado do percurso, mas,para compensar, logo depois vem o lindo visual do cume.
Desse ponto, é possível avistar a Baia de Guanabara, o Dedo de Deus e o Morro dos Cabritos, em um mar de montanhas.
E o acesso ao cume do Pico Menor se dá pelo cume do Médio, através de uma crista que une os dois. Um ótimo passeio com direito a dois cumes no mesmo dia.
Já a caminhada até o cume da Cabeça de Dragão é menos exigente. Partindo do Vale dos Deuses, são de 45 minutos a 1 hora de caminhada. A trilha tem início logo atrás da área de camping e está sinalizada. Primeiro se segue por uma crista com inclinação constante, mas moderada em alguns trechos, é possível avistar a paisagem dos dois lados da crista. A vista do topo também é muito linda.
A Caixa de Fósforos é outra opção de caminhada bem tranquila. A montanha está localizada atrás do Capacete. Porém, para acessar o cume (a caixa propriamente dita) é necessário equipamento de escalada. Até a base da caixa são cerca de 30 minutos de caminhada.
No Parque Estadual dos Três Picos existem vários refúgios de montanha e pousadas, a maior parte localizada no Vale do Jaborandi e no Vale dos Três Picos. Além de cama e chuveiro quente, alguns lugares oferecem refeições. Os preços variam de 20 a 30 reais por pernoite.
O Refúgio das Águas (22 / 9857-9790; sergio_tartari@yahoo.com.br) é dos escaladores Sérgio Tartari e Rosane Nicolau. Morador da região de longa data, Tartari é responsável pela abertura de diversas vias, bem como uma ótima fonte de informações sobre o parque. No seu refúgio, experimente a deliciosa pizza feita no forno à lenha também tem há opção de usar a cozinha para a própria refeição.
Já o Restaurante Truta Arco Íris (22 / 2543-3666) é outra ótima opção para comer. O lugar, situado na estrada que dá acesso ao Vale dos Três Picos, oferece trutas criadas ali mesmo, o que garante peixe fresco sempre.
Agora se a ideia é pouco luxo e muita atividade, vale acampar no Vale dos Deuses. Isto encurta o caminho de acesso às montanhas, e não custa nada (o camping é de graça). Porém, sem chuveiro quente e tendo de encarar o frio intenso lá em cima. Na minha viagem, passamos alguns dias acampados no Vale dos Deuses e, quando batia o cansaço, descíamos para descansar no refúgio, tomar banho e comer pizza.
Este texto foi escrito por: Danielle Pinto
Last modified: setembro 8, 2011