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Preservar e trabalhar pelo Parque Nacional de Itatiaia


O caminho é tortuoso mas a persistência nos dará resultados valiosos diz Silverio (foto: Gustavo Mansur)

O presidente da CBME (Confederação Brasileira de Montanhismo e Escalada) e da Femesp (Federação de Montanhismo do Estado de São Paulo), Silverio Nery, fala neste artigo sobre o aniversário de 69 anos do Parque Nacional de Itatiaia, das comemorações no ano que vem do primeiro parque nacional do país e o que representa o planalto de Itatiaia para as muitas gerações de montanhistas.

Silverio também fala das ações que a Femesp e Femerj (Federação de Esportes do Estado do Rio de Janeiro) têm realizado e a espera para que as sugestões das duas federações sejam aceitas e levadas adiante pela nova administração do parque.

No dia 14 de junho o Parque Nacional do Itatiaia comemorou 69 anos de sua fundação. A Femesp e a Femerj estiveram presentes através de seus diretores Milton Dines e Daniela Albuquerque, respectivamente, mais uma vez reforçando os laços que unem o parque aos montanhistas.

Durante a cerimônia o chefe do Parque, Walter Behr anunciou o lançamento do folder Trilhas do Planalto, elaborado por voluntários do CEU – Centro Excursionista Universitário (www.ceubrasil.org.br) em razão da parceria entre o PNI e a Femesp e a Femerj. Pela primeira vez no país temos um documento desse tipo, em que as principais trilhas e acessos do Planalto do Itatiaia são apresentados sobre uma carta topográfica em escala.

O folder inclui ainda um modelo digital do terreno para evidenciar o relevo acidentado, fotos dos principais atrativos, a descrição de cada trilha e dicas sobre mínimo impacto. Com a distribuição aos visitantes do planalto, estou certo de que serão reduzidos os riscos de acidentes e a experiência dos visitantes será enriquecida com informações precisas e valiosas. É importante também registrar o apoio da Curtlo, que abraçou a idéia junto conosco e patrocinou a impressão dessa edição.

70 anos – No próximo ano teremos o aniversário de 70 anos de fundação do parque e talvez este seja um bom momento para refletir sobre a relação dos montanhistas com o PNI. Minha relação com o parque tem sabor de descoberta e nem é tão antiga. Foi por volta de 1987 que “descobri” o Agulhas Negras e o Prateleiras, com meu amigo Manoel Morgado, numa excursão de um final de semana.

Subimos o Prateleiras no sábado pela “via normal” e descemos pela “via do cavalinho”. No domingo, subimos o Agulhas pela via Pontal e descemos pela Normal. Foi uma das experiências mais marcantes da minha vida, ali descobri que tinha “jeito” para escalada e curti demais o ambiente, a exposição e o incrível visual.

É muito provável que inúmeros montanhistas, antes e depois de mim, tenham passado por experiência semelhante. A região do Planalto de Itatiaia é um catalisador dessas sensações e por isso é considerada um dos berços do montanhismo brasileiro, principalmente na sua vertente mais clássica, a das escaladas “quase” alpinas, envolvendo caminhadas de aproximação e escaladas longas e expostas.

Embora tecnicamente as montanhas ali não sejam muito exigentes, os fatores clima, logística e exposição oferecem um sabor especial a qualquer excursão no Planalto, raramente encontrável em outra região de montanha brasileira.

Essa constatação nos remete ao papel relevante do PNI na formação dos montanhistas. No Brasil são raros os locais em que se encontram essas condições, o que faz da região do planalto um campo-escola importantíssimo, pela escassez de opções. O montanhismo é uma atividade eminentemente prática e, como tal, seu aprendizado somente acontece em locais que oferecem as dificuldades adequadas ao nível dos aspirantes. Nesse sentido, Itatiaia é único.

Nada mais natural, portanto, que as Federações de Montanhismo dirigissem suas atenções para o PNI, buscando estreitar o relacionamento institucional com o IBAMA, que administra o Parque. Em 2003, cerca de um ano após a fundação da Femesp e três da fundação da Femerj, as duas federações assinaram um termo de cooperação com o PNI, um documento genérico de cooperação técnica, através do qual propusemos várias ações, sempre buscando uma visitação mais racional do parque, com a abertura das travessias mais longas, instalação de campings selvagens, sinalização de trilhas, etc.

Trilhando – Infelizmente desde lá esbarramos na burocracia, nas mudanças de diretoria e nas conseqüentes dificuldades de se manter um planejamento de médio prazo. É bom que se diga, nas Federações somos poucos e dependemos de trabalho voluntário.

Precisamos medir muito bem os resultados de nosso empenho para evitar desperdício dessa mão-de-obra preciosa. Sem alguma garantia ou ao menos indicação de que nossos projetos resultarão em ações, algumas vezes optamos por nos empenhar em outras frentes, em busca de resultados concretos.

Desde a assinatura do nosso convênio, o PNI já mudou duas vezes de chefia. O Leo Nascimento, que assinou o termo original foi sucedido pelo Henrique Zaluar e agora está à frente do PNI o Walter Behr. Os processos de mudança de chefia foram lentos, com longos períodos de indefinição, durante os quais nada pudemos fazer de prático. Infelizmente.

Entretanto, com a chegada do Walter alguma coisa mudou. Ele se firmou na chefia e por enquanto não vemos sinais de novas mudanças. Ele demonstra ter planos de médio prazo evidenciados no Programa 70 Anos do Parque – e tem se empenhado bastante para fazer esses planos virarem realidade.

Talvez essa opinião não seja unânime, mas para nós que estamos vindo de quase 3 anos de indefinições, a situação atual permite uma atuação mais objetiva e planejada das Federações, sempre focada na conservação do patrimônio natural inestimável do Itatiaia e no atendimento das antigas reivindicações dos Montanhistas.

Idéias e ações – Os primeiros resultados positivos já começam a aparecer. Desde outubro do ano passado Femesp, a Femerj e o Gean (Grupo Excursionista Agulhas Negras, filiado à Femerj) fazem parte do Conselho Consultivo do PNI e da Câmara Técnica de Turismo de Montanha, dois fóruns permanentes em que são discutidos e avaliados os vários temas relativos ao uso público do parque.

Com isso pudemos executar várias ações, nem sempre com resultados visíveis, mas todas elas bastante positivas. Podemos destacar, por exemplo, a assessoria na certificação de monitores, a elaboração de projetos de arquitetura para reforma do Abrigo Rebouças, o projeto de reforma e sinalização de trilhas do Planalto e a já mencionada elaboração do folder Trilhas do Planalto, este último, de fato, o resultado mais visível de nossa atuação até o momento.

As ações já concluídas visam o benefício de todos os visitantes do PNI e a implementação de alguns projetos depende das possibilidades e prioridades da administração do parque, envolvendo a contratação de profissionais e a existência de recursos ($$).

Nossas ações agora devem priorizar temas voltados mais diretamente aos interesses dos montanhistas e aos principais temas já sugeridos formalmente à Câmara Técnica. Dentre eles, a implementação de um local de acampamento adequado no Planalto e a abertura de uma ou mais travessias do PNI para montanhistas, a exemplo do que acontece no Parque Nacional da Serra dos Órgãos e sua travessia principal, a clássica Peterê (Petrópolis-Teresópolis).

O caminho é tortuoso e o trabalho, por vezes árduo e pouco reconhecido. Temos participado de reuniões aos sábados na parte baixa do parque, em dias ensolarados em que a maioria das pessoas preferiria estar descansando ou praticando atividades de lazer. Entretanto sabemos que nossa presença é importante e que a persistência acabará nos trazendo resultados valiosos e duradouros.

Creio que estamos vivendo um bom momento no PNI e vamos procurar aproveitá-lo da melhor maneira possível. Vamos torcer para que o caminho continue aberto, difícil como sempre, mas aberto, para que possamos contribuir com as transformações que sonhamos para Itatiaia.

Para que o parque, e especialmente o Planalto do Itatiaia, possam ser plenamente utilizados, com acampamentos simples e estruturados de forma a garantir o menor impacto possível ao meio ambiente, com trilhas sinalizadas e bem mantidas, com as clássicas travessias longas abertas e adequadamente manejadas e que, enfim, o Itatiaia possa fazer jus à sua vocação geográfica, como acontece com os demais parques de montanha pelo mundo.

Este texto foi escrito por: Silverio Nery, presidente da CBME e Femesp