Carro da Prop Car (foto: )
São Paulo Rômullo Tadeu Melo e Silva tem tudo para ser o segundo piloto negro na história da Fórmula-3 Sul-Americana. A confirmação pode acontecer ainda nesta sexta-feira, justamente no dia em que ele completa 21 anos. Rômullo tenta acertar contrato para correr pela Prop Car Light nesta temporada e promete dar trabalho na mais tradicional categoria continental. O outro piloto negro da F-3 foi Affonso Rangel, que participou da temporada de 1989.
Determinação ninguém pode negar que Rômullo tem de sobra. Nascido em Marabá, no Pará, um estado sem qualquer tradição no automobilismo, ele vem de família de classe média e durante a semana trabalha como vendedor de bilhetes no metrô de Brasília.
O nosso Brasil é curioso, pois num País com maioria de negros, mulatos, índios, mestiços, vou ser o segundo piloto negro na história da Fórmula-3 Sul-Americana. Sou, talvez, o único piloto pobre e devo essa oportunidade a Deus, diz Rômullo numa demonstração de sua religiosidade.
Integrante do grupo evangélico Atletas de Cristo, ainda não conseguiu todo o dinheiro para correr a temporada da F-3 Sul-Americana. Assim, ele não esperava essa oportunidade tão cedo. A idéia surgiu de sua ex-namorada, Karina Amaral, que um dia resolveu mandar um email para Dárcio dos Santos, tio de Rubens Barrichello e dono da Prop Car, pedindo uma chance para Rômullo.
Na resposta, o Dárcio disse que já me conhecia e que era para eu ligar para ele. Quando falou que eu precisaria de dinheiro, pensei, meu pai não é milionário, não é dono de nada, minha mãe é funcionária pública e também não tem dinheiro. Aí, meti as caras, consegui alguma coisa e estou aguardando outras respostas para tornar realidade este sonho, disse Rômullo que deve estrear na F-3 Sul-Americana na primeira das nove rodadas duplas marcada para dias 12 e 13 de abril em Campo Grande, Mato Grosso do Sul.
Devido ao trabalho do pai, engenheiro de Furnas, Rômullo nunca conseguiu fixar residência por muito tempo e mudou de cidade e estado com muita freqüência. Depois do Pará, passou pelo Rio, pelo Paraná e, antes de se firmar em Brasília, morou em Lorena, cidade do Vale do Paraíba, no interior de São Paulo.
Em Lorena não tinha kartódromo e eu já era fissurado em automobilismo. Aí, com 12 anos, viajava até Guaratinguetá para ver algumas corridas. Nos treinos eu era o único na arquibancada.
Essa vigília solitária nos autódromos lhe rendeu um convite para ver como funcionava uma equipe dentro do box. Imediatamente Rômullo aceitou.
Quando senti o clima e vi aquilo tudo, disse para mim mesmo: É isso o que eu quero para a minha vida!.
Quando se mudou para Brasília, a primeira atitude do jovem foi pegar a lista telefônica, descobrir o número do autódromo da capital do Brasil, pegar o endereço, informações de como se dirigir para lá. Ali, ele chegava às 6 horas da manhã e passava o dia vendo os carros andarem pela pista do autódromo, administrado por seu maior ídolo no automobilismo: o tricampeão mundial de Fórmula-1 Nelson Piquet.
Aconteceu o mesmo que em Interlagos. Os caras me chamaram para o box e me convidaram para ser auxiliar de mecânico. Além de me darem almoço, eles iam me pagar R$ 30 por dia. Era isso o que eu queria, fazer o que gostava e ainda ganhar. Mas o meu sonho mesmo era pilotar um carro.
Não tardou muito para surgir a primeira e inesquecível oportunidade. Dedicado, Rômullo assimilava o trabalho e todas as dicas técnicas ensinadas pelos experientes mecânicos, que conhecem o kart como poucos. Um dia, um amigo de Rômullo, Vitor Vieira, resolveu dar a sonhada chance para o garoto.
Ele é um funcionário público que me deu a oportunidade da minha vida. Eu não tinha macacão, sapatilha, luva, capacete, nada. Usei um macacão mais curto e tive de guiar de tênis mesmo, pois a sapatilha era pequena. Todos ficaram espantados com os tempos que virei, pois foram iguais aos da corrida que tinha acontecido ali na semana anterior.
No ano passado, Rômullo esteve na Europa para aprender um pouco mais sobre automobilismo e andou num Fórmula Renault na França, guiou um kart na Itália e pilotou um Fórmula-3 na Inglaterra, bastante parecido com o da F-3 Sul-Americana.
É gozado, mas algumas vezes na Europa eu chegava na pista e as pessoas perguntavam se eu era mecânico. Quando vestia o macacão, até as garotas vinham para cima!, se diverte.
O determinado Rômullo Tadeu Melo e Silva pretende incluir seu nome entre os atletas negros brasileiros que fizeram sucesso pelo mundo e que tinham em comum o popular sobrenome Silva. Da relação fazem parte o bicampeão olímpico do salto triplo Adhemar Ferreira da Silva e os velocistas Robson Caetano da Silva e Claudinei Quirino da Silva. Outro que levava um dos mais comuns sobrenomes brasileiros era o tricampeão mundial de Fórmula-1 Ayrton Senna da Silva.
Se deixarem, eu chego lá!, completa o esperançoso piloto.
A Fórmula-3 Sul-Americana tem organização da Vicar Promoções e supervisão da Confederação Sul-Americana de Automobilismo. O patrocínio é da Pirelli.
Este texto foi escrito por: Milton Alves e José Eduardo