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Rota dos Tropeiros: Aventura em duas rodas na Serra do Mar


Passeio foi até São Luís do Paraitinga (foto: Amigos da Bike)

Sabadão de sol, muito sol. O dia mais quente do ano até então. Vinte bikers, incluindo eu, se juntaram na frente de um posto de gasolina na entrada de Natividade da Serra (SP) para a largada da Expedição Rota dos Tropeiros – Serra do Mar, organizada pelo Gonga, responsável também pelas provas do Big Biker. À minha volta eu via um grupo bem heterogêneo, de idades variando entre 25 e 52. Nas planilhas que cada um de nós levávamos as bifurcações e quilometragem dos dois dias de pedal: 56 km e 30 km.

Acostumado com largadas de corridas, sempre fico impressionado com a tranqüilidade dos eventos não competitivos. O Gonga não apitou, não tocou sirene, não deu tiro para o alto. Dez horas da manhã e cada um começou como quis, sem pressa, ainda batendo papo e fotos, cada um no seu ritmo. Casais que pedalavam juntos deram-se beijinhos, amigos saíram lado a lado, os mais treinados explodiram na frente. Mountain bike não competitivo é assim: sem estresse.

Todas as caras – Diferente de uma corrida, o público que freqüenta esse tipo de evento também é distinto e variado entre si. As bikes são diferentes. Tinha gente com bolsa de guidão, pedal plataforma de plástico, muito firma-pé, bagageiros em bikes superleves, mochilas de todos os tamanhos nas costas. As formas físicas também eram variadas. Havia atletas, esportistas de fim de semana, gente nitidamente fora de forma e a turma do “eu pedalo para beber cerveja”. Cada um na sua. Todo muito alegre e bem disposto.

Eu sempre digo que mesmo não estando em boa forma física, qualquer um que encara um final de semana de sol na cabeça, poeira, horas em cima de um selim, morro acima e morro abaixo, suor caindo nos olhos, mosquitos, carrapatos, espinhos e ainda chama isso de “diversão” é um guerreiro. Nós, mountain bikers, somos todos guerreiros. Temos o espírito elástico que aceita o desconforto com um sorriso no rosto. Portanto, eu não via gordos ou magros, velhos ou jovens, homens ou mulheres. Eu via apenas mountain bikers.

As planilhas do Gonga estavam perfeitas. Não demorou nada e saímos do asfalto e pegamos a tão desejada terra. Não faltaram bicas para o abastecimento de água. A região é pouco povoada, pedalávamos muito sem ver uma casa, fazenda e muito menos carros ou motos. Seguíamos em direção a São Luis do Paraitinga. No começo do pedal os grupos ainda se encontravam, os mais rápidos esperavam em alguma sombra o segundo e terceiro pelotão. Atrás vinham mais dois ou três grupos e o Gonga fechando tudo.

Com pouco mais de 13 km rodados havia uma indicação na planilha: “refresque-se”. Era uma cachoeira com um poço e banheiras cavadas na pedra pela água numa perfeita hidromassagem. Como eu estava no primeiro grupo, meia hora à frente dos demais participantes, acompanhando dois bikers da região, tirei toda a roupa e, peladão, caí na água. O calor estava matador. Depois descobri que a temperatura era de 37º C e sem uma nuvem no céu. Nadamos por mais de meia hora, até o segundo grupo chegar e cair na piscina natural também.

De volta na bike, recomposto, refrescado, imaginei se faria a mesma coisa numa competição, brigando por um lugar no podium. Jamais! Depois imaginei quantas cachoeiras como aquela eu já não deveria ter passado, sem perceber, nas corridas que participei. Muitas! Eu sei que são emoções diferentes, que competir também é legal, mas começo a acreditar que medalha nenhuma vale o prazer de um bom banho de cachoeira. Não consigo imaginar recompensa maior.

Eu não conhecia a cidade. Fiquei encantado. Toda restaurada e repleta de prédios históricos, dava vontade de passar alguns dias só visitando ruas e conhecendo pessoas. Ouvi dizer que o carnaval lá é nacionalmente famoso e as pousadas e hotéis lotam com meses de antecedência. A organização da expedição reservou almoço e um bom hotel com jantar e café da manhã para todos os participantes. Tudo de primeira. De repente a inscrição da viagem ficou barata diante do tanto que foi oferecido.

Um a um os companheiros chegavam, suados, cansados, felizes. O menos desidratado tomou dois litros de tudo o que o restaurante tinha. Quem disse que no mountain bike não competitivo não tem desafio? Todo mundo tinha uma história para contar, um downhill animal que fez, uma subida onde quase enfartou, a bica d’água mais fresca do mundo, etc. Quem pedala duro sabe como é.

Fomos para o hotel. Quartos duplos e triplos. Bom chuveiro, boas camas, lençóis novos e limpos. A chance de conhecer melhor as pessoas, bater papo. Ninguém conseguiu dormir muito cedo, apesar do cansaço e do longo dia. Para que dormir numa aventura dessas?

A volta – Domingão de sol, muito sol, de novo. Os 30 quilômetros que nos separavam de Natividade da Serra reservavam deliciosas surpresas. Cruzamos propriedades particulares, fazendas, carvoarias, vários quilômetros em singletrack, uphills e downshills técnicos e terminamos cruzando um braço da represa em um pequeno barco da prefeitura movido por um motor a Diesel. A água tão limpa, verde esmeralda e fresca que, chegando de volta à cidade eu não resisti e passei quase meia hora nadando e me refrescando, enquanto esperava o resto do pessoal chegar.

Assim é o mountain bike não competitivo: cheio de desafios e recompensas. Com tanta diversão, quem precisa de podium?

Este texto foi escrito por: Guilherme Cavallari – Amigos da Bike