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São Paulo – Erechim: pedal e beleza pelo sul do país


Em Concórdia a caminho de Erechim. (foto: Arquivo Pessoal)

Depois de privilegiar o litoral Catarinense e conhecer a linda Florianópolis no ano de 2002, desta vez queríamos desbravar o interior de Santa Catarina e alcançar a cidade de Erechim, no Rio Grande do Sul.

Foi com esse objetivo que eu, Marcelo, 33 anos, analista de sistemas, Marcos, 29, engenheiro mecânico e Hugo, 39, metalúrgico, partimos na véspera do Natal de 2003 para mais uma aventura sobre duas rodas.

1º dia – Quarta-feira, 24/12/2003 De São Paulo/SP a Jacupiranga/SP 253Km

Mesmo com grande ameaça de chuva, saímos de casa em São Paulo às 6h30, quando tivemos como o primeiro desafio: vencer os 47 Km de trecho urbano.

As marginais do Rio Tietê, Pinheiros, e avenidas do bairro do Butantã. Tensão máxima devido ao grande volume de veículos muito próximos de nós o tempo todo! Chegando na BR116 – Rodovia Régis Bittencourt, via por onde pedalamos até Curitiba, pudemos contar com o acostamento e assim o tumulto dos carros daquele trânsito caótico diminuiu bastante (mesmo sabendo dos grandes riscos que esta estrada oferece).

Fizemos uma breve parada para lanche no Posto 22 já no município de Embú, depois passamos por Itapecerica, São Lourenço da Serra e Juquitiba. Chegando no distrito dos Barnabés, o verde já tomava conta das laterais da pista. Efetuamos a descida da serra do Cafezal, conhecida popularmente como “Serra do 90” (por estar a 90 Km do
centro de São Paulo), onde entre descidas e poucas subidas foram 30 Km que nos levaram quase ao nível do mar.

O nosso almoço foi servido na cidade de Pedro Barros com a parada no posto “O Fazendeiro”, Km 385 da Régis. Com uma ótima infra-estrutura e deliciosa comida, esse restaurante oferece boas condições de refeições para todos que passam viajando. O amigo Hugo que o diga, extremamente faminto, consumiu 1 kg de comida sem muito esforço!

Após o almoço e um breve descanso pedalamos na parte da tarde com o asfalto em condições ainda melhores e relevo favorável. Desta forma, não demorou muito para deixarmos para trás várias outras cidades: Miracatu, Biguá, Juquiá e Registro.

O primeiro dia de pedal terminou com pouco cansaço na cidade de Jacupiranga às 18h30. A 253 Km de São Paulo, Jacupiranga mostra-se com vários hotéis de boas acomodações. Nos hospedamos no hotel
“Edumar” próximo do centro da cidade e jantamos em um simples restaurante perto da rodoviária.

2º Dia De Jacupiranga/SP a Curitiba/PR 198 Km

O segundo dia amanhece ensolarado e com a promessa de muito calor (bem diferente do dia anterior). Tomamos um ótimo café da manhã no próprio hotel e pedalamos com facilidade até a cidade de Cajati. Em seguida, iniciamos a subida da serra do Azeite.

No total são 30 Km de serra onde 1/3 disso, cerca de 10 Km, é bem suave, e o restante um pouco mais severo. Mesmo assim é capaz de ser vencido por qualquer ciclista com um mínimo de preparação e condicionamento físico. Vencida a serra, fizemos uma parada no trevo da cidade de Barra do Turvo, onde reencontramos com os amigos Ari e Fábio (ciclistas que havíamos conhecido em 2002 quando passamos por ali com destino a Floripa).

Essa parada nos rendeu vários bate-papos, o consumo de lanches e sucos e algumas fotos. Pedalamos todos juntos até a divisa dos
estados de São Paulo e Paraná onde nos despedimos dos colegas e seguimos viagem.

Já no estado do Paraná o relevo melhora na chegada a Campina Grande
do Sul, ao contrário da qualidade do asfalto. Nesse trecho enfrentamos ventos fortes e uma fina garoa. Chegamos em Curitiba por volta das 19 horas, com relativo cansaço.

Nos instalamos no Hotel “Cristo Rei” em frente à estação Rodo-Ferroviária. Estabelecimento de acomodação simples, no entanto,
em boa localização para retomarmos o passeio no dia seguinte. Passeamos pelo Shopping Estação Plaza Show cujo ambiente estava ricamente decorado e cheio de pessoas alegres e simpáticas.

O jantar foi servido no Fast-food Girafas com uma comida saborosa que mereceu “replay”.

3º Dia De Curitiba/PR a Jaraguá do Sul/SC 183 Km

Na manhã seguinte partimos de Curitiba sob tempo nublado e temperatura amena. Seguimos pela chamada avenida das Torres até São José dos Pinhais, onde alcançamos a rodovia BR376. O café da manhã só foi servido em uma lanchonete no início desta rodovia, onde fomos muito bem atendidos por uma sorridente gaúcha.

Depois do desjejum, descemos a serra do Mar para entrar no estado de Santa Catarina. Passamos pela cidade de Garuva e após alguns quilômetros chegamos na tão bela Joinville. Ela é linda! Muito arborizada, com ruas limpas e bem cuidadas, pessoas bonitas e arquitetura no estilo enxaimel, denunciando uma forte influência alemã.

Após o almoço em uma ampla lanchonete, nos dirigimos a uma concessionária Caloi a procura de novos raios para reparo na roda da bike de Marcos, que havia se danificado desde o dia anterior. Ocorre que eles tinham as peças, mas não poderiam consertá-la naquele momento devido a muitos serviços já acumulados na oficina.

Desta forma, fomos até a outra bicicletaria chamada BikeSport e logo tudo pode ser arranjado. Com o intercâmbio das duas lojas, uma cedendo as peças e a outra promovendo o conserto de forma eficiente, pudemos continuar o passeio que naquele dia só terminaria em Jaraguá do Sul. Ufa que sorte! Quem estiver de passagem pelas redondezas e precisar de qualquer apoio na “magrela” é só procurá-los.

Saímos de Joinville e pedalamos pela BR101 por uns 15 Km até mudarmos de rodovia rumo ao tão esperado interior Catarinense. Nesse ponto do passeio deixamos o nível do Mar e partimos para regiões mais altas. A estrada utilizada até Jaraguá do Sul, BR280 Rod. Prefeito Waldemar Grubba, é de faixa simples com boa qualidade de asfalto e acostamento.

No início das pedaladas por ela avistamos no horizonte uma tormenta que tomava forma. Pensamos: “Se chover tudo isso o caldo vai engrossar!”. E engrossou mesmo. Tivemos que pedalar sob fortes chuvas que cessaram somente quando chegamos em Guaramirim, uma cidade antes de Jaraguá.

Mesmo pedalando em tempo feio, ficamos impressionados com a vegetação exuberante às margens da estrada, isso sem contar com as imponentes montanhas emolduradas por um bloco de nuvens que de longe, encantam e assustam ao mesmo tempo. O término do terceiro dia de pedal ocorreu perto das 19h30 quando alcançamos o portal de Jaraguá, local muito atraente, bem receptivo e com todas as informações sobre a cidade e o que ela oferece enquanto polo de ecoturismo e esportes de ação.

Lá soubemos que desde o final do século XIX várias colonizações de origem européia, entre elas a alemã, italiana e a húngara se estabeleceram. Jaraguá possui infra-estrutura adequada para realização de eventos de até 1.000 pessoas, com uma capacidade hoteleira compatível (11 hotéis e cerca de 1.200 leitos).

O vale, as montanhas e o extenso rio Itapocu que o cercam, oferecem múltiplas possibilidades para a prática de diversos esportes alternativos, como: Lazer Aquático, Pesca, Observação de
animais, Off-Road, Motociclismo, Cicloturismo, Rapel/Cascading, Cavalgada, Escalada, Vôo-Livre, Caminhada/Trekking, Canoagem, Bóia-Cross, entre outros.

Fora tudo isso, pode-se ainda visitar o Museu Municipal Emílio da Silva, o bairro Garibaldi, a igreja Santo Estevão, o centro Cultural SCAR, o Parque Malwee e os diversos Picos, Morros e Cachoeiras da região. Nos hospedamos no Barra Velha Wille Hotel, onde além do ótimo atendimento, tivemos um belo desconto e contamos com uma ótima acomodação. Inclusive para nossas bikes.

Isto é, depois de lavarmos as mesmas na garagem do próprio hotel (sendo mais uma cortesia do gentil proprietário). Mais tarde a nossa fome foi “morta” na lanchonete de conveniência em um posto de gasolina bem ali em frente.

4º Dia – Sábado, 27/12/2003 De Jaraguá do Sul/SC a Pouso Redondo/SC 185Km

Às 7h30 depois de um rico e saboroso café da manhã a base de pães, café com leite e frutas no hotel Barra Velha, deixamos a cidade de Jaraguá. Andamos pela cidade até chegarmos na rodovia que nos levaria até Pomerode, município vizinho. Esta estrada também de pista simples e asfalto bom estava completamente deserta.

Ocorre neste trecho à alternância de construções suntuosas com casas humildes e com pano de fundo, imensas montanhas cobertas por muito verde e grandes rochas. Além disso, há mais um fato marcante: a predominância étnica de alemães e descendentes. Volta e meia aparecem
edificações da Igreja Luterana. Andamos cerca de 25 Km em trecho plano com o sol começando a brilhar fortemente, até que fomos surpreendidos por um “respeitável” aclive de forte inclinação que nos obrigou a buscar socorro em marchas mais leves, que até então não tinham sido utilizadas na viagem.

Após essa “parede”, descemos tudo que subimos até chegarmos na cidade mais “alem㔠do Brasil, Pomerode. Esse título é facilmente constatado por quem adentra a cidade. A maioria das pessoas tem pele muito clara e cabelos loiros. Sem muito esforço é possível encontrar gente conversando em alemão nas ruas, inclusive as próprias crianças. Além dessa peculiaridade é importante lembrar que Pomerode é lindíssima! A única coisa que não nos agradou foi o calçamento das ruas, sendo todo em paralelepípedos.

Com isso, a velocidade média ficou nos ínfimos 17 Km por hora! Depois de Pomerode veio Timbó (cidade também em paralelepípedos), trevo de Indaial e em seguida acessamos a rodovia BR470, via extremamente arborizada e de acostamento regular. Com o passar dos quilômetros a fome chega e as Bananas Passas que havíamos comprado em Barra do turvo nos sustentam. Passamos pelo trevo de Rodeio, depois por Ascurra e então chegamos na pequena cidade de Apiúna.

Procurando por um bom restaurante, acabamos almoçando no “Dois Bernardi”. Ótima escolha! Os proprietários bem receptivos se interessaram pelo nosso passeio e nos receberam muito bem! Comemos boa refeição ouvindo as dicas e sugestões das condições de estradas que estavam por vir, inclusive sobre uma tal Serra da Santa, que segundo eles, seria de extrema dificuldade. No entanto, se fosse mesmo de “sangrar” as pernas, esta viria somente no dia seguinte.

De Apiúna até o trevo de Ibirama a natureza não poupou esforços para
transformar o lugar num cenário lindo: estradas estreitas e tortuosas
contornando paisagens de campos verdes e pequenas fazendas iluminadas pelo sol forte e um céu azul fantástico. Havia também um toque de requinte do rio Itajaí-Açu que volta e meia margeava a rodovia. Que lugar impressionante!

Passamos ainda por Lontras e a grande Rio do Sul onde fizemos nova parada para hidratação, o sol estava torrando! As pedaladas terminaram na atraente cidade de Pouso Redondo, depois de cruzarmos a pequena Agronômica e o trevo de Trombudo Central. Eram 18:30 horas quando nos hospedamos no hotel “Scóz” que fica bem próximo da pista. Ao anoitecer, Pouso Redondo se torna mais alegre com uma festa que ocorre na praça da matriz tocando muitas músicas gaúchas.

Nós fomos presenciar a beleza da igreja e a grande animação entre
os moradores. Voltamos para jantar no restaurante do próprio hotel onde mais uma vez fomos informados sobre a destemida Serra da Santa que logo cedo teríamos que enfrentar. Momentos depois caímos na cama onde desmaiamos.

5º Dia Domingo, 28/12/2003 – De Pouso Redondo/SC a Joaçaba/SC 198Km

Deixamos Pouso Redondo às 7:00 horas após saborearmos um ótimo café da manhã. O sol estava irradiante e a temperatura em elevação. Além de estarmos um pouco temerosos com a alardeada Serra da Santa, sabíamos que os dois próximos dias seriam os mais críticos: as próximas cidades ficam em altitudes superiores das já percorridas e o aumento do desgaste físico com o acúmulo dos dias pedalados. De qualquer forma, avançamos contando com boas condições de rodagem, asfalto bom, lindas paisagens do campo e aclives de leve dificuldade. Depois de alguns quilômetros chegamos na Serra da Santa.

O aclive começa de maneira suave, mas aos poucos vai apertando. No entanto, com marcha leve e ritmo moderado vamos subindo sem maiores desgastes. Passadas boas pedaladas avistamos a imagem da Santa que dá nome a serra: “Santa Salete”.

Nesse ponto as subidas são bem íngremes! Com mais 5 Km de duras pedaladas concluímos a “escalada”. Tão logo vencida, vieram mais duas
outras serras. Tivemos que tomar mais fôlego para vencê-las.

Pedalávamos sempre de maneira calma e paciente visando poupar energia. Fora um início de dia penoso! Alcançando uma região mais plana, chegamos ao cruzamento da BR470 com a BR116, onde no posto Serrana fizemos um ótimo lanche.

Depois de passarmos pelas cidades de Curitibanos, Brunópolis e Campos Novos, a qualidade do asfalto caiu bastante. Em dado momento, um casal num Gol Branco vindos coincidentemente de São Paulo, nos aborda pedindo informações. Admiram-se com nosso passeio e disposição e nos desejam boa sorte! Prosseguimos meio irritados com a estrada que naquele ponto estava com péssimo acostamento. Com visível cansaço cruzamos as cidades de Erval Velho e Erval do Oeste, quando despencamos por mais de 4 Km numa “assustadora” descida que “daria o que falar” se tivéssemos que subi-la.

Ao final desta chegamos em Joaçaba, perto das 19h40 horas. A cidade de Joaçaba fica numa espécie de “fosso” ao redor de imensas montanhas. Pedalamos até o centro quando fomos abordados por Bruno e seus amigos, ciclistas locais que quiseram saber detalhes do nosso passeio. Nos indicaram um bom hotel chamado “Oeste” e mais tarde voltaram para continuar a conversa no Bar e lanchonete “Petiskos”.

6º Dia Segunda-feira, 29/12/2004 – De Joaçaba/SC a Erechim/RS 143Km

Na manhã de Segunda-feira quando acordamos, havia um Breakfast pra ninguém botar defeito: pães, bolos, café com leite e sucos. Tudo estava uma delícia! Comemos bastante de modo a nos nutrir fortemente e garantir bom rendimento físico para a sucessão de aclives que certamente viriam logo no início do dia. Nos despedimos de Joaçaba às 8:15 da manhã e partimos rumo ao estado do Rio Grande do Sul. Depois de um total de 28 Km pedalados, mudamos de rodovia e seguimos para Jaborá (que em Tupi-Guarani significa “Aquele que faz”), onde do trevo até o centro da cidade foram 8 Km consecutivos descendo uma
linda serra e apreciando as belezas naturais da região.

Semelhante a Joaçaba, Jaborá se encontra num vale e ao seu redor existem muitos morros e grandes matas. Apesar de pequena, a cidade é muito simpática e seus moradores são predominantemente Italianos e descendentes. Depois de uma breve parada para lanche, retomamos as pedaladas e logo chegamos ao distrito de Planalto, que faz parte do município de Concórdia. Mais alguns quilômetros e acessamos a BR153 Rodovia Transbrasiliana, que nos levaria até nosso destino na cidade de Erechim. Passamos pelo trevo de Concórdia, de Piratuba e então chegamos à divisa de Estados de Santa Catarina e Rio Grande do Sul.

O rio Uruguai separa os estados e uma ponte de 630 metros os liga. A
visão é deslumbrante! Cruzamos a ponte e nos hidratamos em uma lanchonete ao lado do rio. Depois encaramos ainda fortes aclives que nos forçaram a um novo break para beber mais água no Restaurante e Lanchonete “Caminho do Mercosul”.

Nitidamente cansados, alcançamos a cidade de Erechim perto das 18h00 com o sol ainda brilhando fortemente. Não conseguíamos esconder a satisfação e alegria de termos concluído outro longo passeio de bike depois de muita luta e perseverança. Nossos Ciclocomputadores Pequenos aparelhos que traduzem todas as pedaladas em números, indicavam 1.160 Km percorridos depois de 6 dias de pedal. E de fato, sabíamos que cada pedalada tinha valido a pena…

Para conhecer toda a cidade de Erechim é muito fácil, basta ir até o
Departamento Municipal de Turismo e Eventos próximo da rodoviária, onde vários atendentes muito educados fornecem todos os detalhes sobre: onde comer, onde comprar, como se locomover, o que fazer a pé, de ônibus ou de automóvel e principalmente onde ficar.

Durante nosso retorno para casa no ônibus que nos trouxe para São Paulo, mais uma vez constatamos que para se aproveitar o máximo de um passeio ou viagem de bicicleta, não importa para onde você vai ou quão rápido é sua velocidade. O importante é apreciar os inúmeros lugares belíssimos que existem por aí, o calor humano das pessoas tão atenciosas e receptivas e, sobretudo, receber de braços abertos o sol que nos revitaliza e a brisa que anuncia novos ares.

Até o próximo passeio…

Este texto foi escrito por: Marcelo Santos e Marcos de Castro