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SOS Mata Atlântica acredita nas corridas de aventura e tem equipe própria para auxiliar nas ações ambientais


Zé Pupo (no leme à esq) é pioneiro nos esportes de aventura e na consciência com a natureza (foto: Ricardo Munhoz/ Divulgação)

A Fundação SOS Mata Atlântica acredita nas corridas de aventura como fomentadora de ações que possam auxiliar na preservação e conhecimento das áreas naturais. Na primeira grande prova de corrida de aventura do ano, a Brasil Wild etapa Monte Verde, que aconteceu no início de março, uma nova equipe de corrida de aventura surgiu no cenário nacional: a SOS Mata Atlântica.

Nova no nome, porém antiga nos integrantes: José Roberto Pupo, o capitão da equipe e idealizador do projeto, pratica corrida de aventura desde 2001 como atleta e acompanha o esporte há mais tempo. Hoje empresário, o canoísta é reconhecido mundialmente (foi técnico da seleção de canoagem nas Olimpíadas de Barcelona em 1992), já foi tricampeão brasileiro de rafting e participou de diversos campeonatos no mundo.

Na equipe, está também a personal trainner Cintya Gonçalves, que participa de provas multiesportivas desde há cinco anos. O canoísta Márcio Franco, um dos principais guias da Canoar, tem vários títulos em águas brancas e agora enfrenta as condições adversas das corridas de aventura.

A equipe não pára por aí: 10 pessoas empenhadas em correr ou ser apoio nas provas fazem parte da equipe SOS Mata Atlântica. O site oficial da equipe (www.equipesosmataatlantica.com.br) entra no ar no dia 4/4 e todas as informações esportivas e de educação ambiental serão registradas lá.

A ação está interligada ao Projeto Rede das Águas da Fundação SOS Mata Atlântica, que tem como objetivo monitorar a qualidade das águas de mais de 300 pontos no país. Hoje, a equipe é responsável por abrir novos pontos de monitoramento de água em seus locais de competição.

Contradição ou ação visionária? – Mas, por quê o empenho? Por que uma instituição séria, que existe há 18 anos com a missão de preservar a Mata Atlântica 7% da vegetação original iria apoiar e ceder seu nome para uma equipe cujo esporte tem “mitos” que causa impacto ambiental? Afinal, qual a opinião de um dos mais conhecidos ambientalistas do país, criador da principal ONG que protege esse ecossistema?

Foi em busca dessas respostas que a reportagem do Webventure entrevistou a autoridade do assunto: Mario Mantovani, diretor de mobilização da Fundação SOS Mata Atlântica. Ele falou em entrevista exclusiva sobre a importância da discussão ambiental nas corridas de aventura e afirmou que, atualmente, não se pode medir o impacto negativo das provas no território brasileiro.

Para Mantovani, o papel dos atletas de corrida de aventura é servir de referência para os outros. “Essa história de falar se há impacto ou não é demonizar uma atividade que precisa crescer, que vai levar os jovens para a saúde e não para o caminho das drogas”, afirma o diretor da SOS Mata Atlântica.

Confira a entrevista com Mario Mantovani e a reportagem especial sobre as ações da equipe SOS Mata Atlântica.

Webventure A Fundação SOS Mata Atlântica sempre quis fazer um trabalho ligado à área esportiva?
Mario Mantovani
Não vou dizer que sempre quisemos, este foi um caminho natural. A questão ambiental no Brasil é uma tendência. Hoje, não existe mais o lance de querer ou não ser ecologista.

A problemática não é para ficar apenas nas mãos de ambientalistas ou de políticos. Possuir uma atividade com esse enfoque é uma tendência. Dessa forma, a aproximação entre a questão da aventura e a própria fundação foi natural.

Atualmente, a questão ambiental está em todos os segmentos da sociedade como na educação, nas indústrias – que estão se adaptando mais rapidamente e que antes eram mais resistentes. Identificar-se com ela se tornou uma diferencial de mercado. Com esse panorama, mais e mais gente vem participando e faz com que haja uma certa mobilização pela questão da Mata Atlântica. Agora, chegou a hora das corridas de aventura, e que bom que a nossa equipe estava atenta e buscou esse diferencial ambiental.

Webventure Você acredita que o comportamento brasileiro mudou? Por quê?
Mantovani
Primeiro, o Brasil tem uma história de degradação que é cultural. Já começou sendo uma colônia que cresceu com o intuito de ser devastada. Antes, acreditava-se que Deus deu a natureza, então as pessoas faziam o que quisessem com ela. Com a informação cada vez maior, com toda a mobilização que houve, com as legislações, ocorreu uma mudança que foi incorporada pela sociedade, o que é bom.

Webventure A Fundação SOS Mata Atlântica patrocina o time?
Mantovani
Não damos dinheiro, nosso patrocínio é mais o moral. Junto com a equipe, nós iremos promover a questão da proteção da água (Projeto Rede das Águas). Quando falamos de Mata Atlântica, temos um problema seriíssimo porque hoje só 7% de nossa floresta original existe. Imagine que o turismo brasileiro acontece em cima desse pequeno espaço e que tem pessoas que não se tocaram ainda. Então a presença de mais pessoas que tenham o espírito de proteção e de mobilização nos ajuda muito.

Webventure Discute-se muito sobre o impacto negativo que as corridas de aventura causam no meio ambiente. A Fundação SOS Mata Atlântica não concorda com isso?
Mantovani
Há tão poucas corridas de aventura no Brasil que isso é inexpressivo. Talvez daqui a 10 anos, se juntarmos todas as equipes, seria ótimo discutirmos o impacto. Hoje é positivismo, não tem o menor sentido levantar essa problemática no Brasil.

Webventure Mas você não teme cometer um erro e daqui a 10 anos os resultados aparecerem?
Mantovani
Não. Creio que daqui a 10 anos as pessoas estarão melhores do que hoje e que vão levar muito mais em consideração as questões ambientais. Se muitas equipes não o fazem hoje, é porque ainda não tiveram essa sacada como teve o nosso time.

Para mim, o papel de nossos corredores é servir de referência para os outros. Essa história de falar se há impacto ou não é demonizar uma atividade que precisa crescer, que vai levar os jovens para a saúde e não para o caminho das drogas.

Webventure Você diz isso porque quem corre atualmente, o público das corridas de aventura, são os jovens da classe média?
Mantovani
Ainda bem que começa com a classe média alta, daqui a pouco virão as pessoas de baixa renda. Hoje o pobre corre atrás da vida. Nós estamos falando de um país com grandes iniqüidades, onde as pessoas têm problemas de sobrevivência.

Oitenta por cento da população brasileira vive com até um salário mínimo. Não estamos falando de uma atividade universal, não é como o futebol, que todo mundo pratica, mas sim de esporte que é de um segmento pequeno, de zero vírgula qualquer coisa. Se esse grupo fizer bem a sua parte, se o cara que é pobre começar a separar o seu lixo, cada um fará o que lhe cabe.

No dia em que as corridas de aventura chegarem às classes C, D, E, F na verdade, nem consigo estratificar a população brasileira, que hoje em dia se divide em é pobre e o resto e é rico é o resto havendo uma boa referência, tanto fará ser rico ou o pobre.

Webventure E como melhorar isso na sua opinião?
Mantovani
O importante para esse esporte é criar uma ideologia de valorizar a questão ambiental e é isso que nós estamos fazendo. Hoje, um dos grandes problemas é que as pessoas não convivem com natureza, os parques são do Estado não nossos. Na Costa Rica, Austrália, Nova Zelândia e nos EUA, os cidadãos se apropriam dos parques. Alguém vai precisar mudar essa postura e é bom que uma equipe começou a fazer isso.

Webventure Mas como um time ensinará uma população inteira a se apropriar do meio ambiente?
Mantovani
Não vai. Acho que isso seria uma grande pretensão, um absurdo. Estamos falando de um segmento, quem se comunica com a população brasileira é a SOS Mata Atlântica (Fundação). Quem deveria fazer isso são os ministérios e que não fazem, e não só o do Meio Ambiente.

Por exemplo, no âmbito do da Educação e Cultura (MEC), desde 1987, a Constituição tornou obrigatório o ensino da educação ambiental e até agora isso não existe. Obrigação tem todo mundo e quem deveria fazer algo, não faz. Então, o cidadão brasileiro precisar tomar as suas atitudes. Se os meus amigos que estão ao meu redor gostam de correr provas de aventura e fazem isso, eu já começo a mudar. Porque daí, o meu irmão, meu pai e a minha tia também vão aprender a cuidar da natureza.

Webventure Seria como um catalizador de ações?
Mantovani
Na verdade, é como jogar uma pedra na água, os círculos vão se ampliando. O nosso time, o SOS Mata Atlântica, é uma pedrinha, a menor delas, e está lá formando vários círculos. Ela irá se unir com a outra que jogamos das associações dos catadores de lixo, com as crianças que estão monitorando água, com as pessoas que fazem as suas reservas particulares de patrocínio natural. Resumindo, essas idéias são pedrinhas que caíram na água e que em algum momento terão intersecções. Elas é que formam essa cultura de proteção.

Webventure Além do Projeto Rede nas Águas, a SOS Mata Atlântica pretende fazer outras intervenções junto ao time?
Mantovani
Estaremos atentos às oportunidades. O que acho legal nessa equipe é que com o término da expedição (corrida de aventura), a ação não vai embora, como às vezes vemos as pessoas levando alimentos, distribuindo para a população e sabe-se quando vão voltar.

Nossos atletas deixam um kit de análise de água, que os alunos da rede pública terão acesso durante no mínimo dois anos. Essa criançada poderá interagir com mais 10 mil outras com quem já trabalhamos e em nossos projetos mundiais. Isso é muito legal, dar continuidade à idéia. Educação ambiental e a luta pelo meio ambiente não são um evento como um show, é um trabalho de continuidade, um aprofundamento de postura.

Webventure O que você espera com o empréstimo do nome da fundação a uma equipe de corrida de aventura?
Mantovani
Que eles ganhem todas (risos). Esperamos que essa consciência seja incorporada por todos times. A equipe SOS Mata Atlântica é um primeiro teste, uma primeira referência. Estou vibrando só com a idéia de saber que eles estão levando esse conceito para as corridas de aventura.

Gostaríamos que isso fosse entendido por todo mundo que participa e que leve ganhos para a sociedade. Adoraria que daqui a dois ou três anos isso não fosse um diferencial, que alguém anunciasse que todas as equipes do Brasil têm programas de educação ambiental.

  • Confira aqui a reportagem especial sobre as ações da equipe SOS Mata Atlântica.

    Para saber mais sobre a ONG, acesse o site da Fundação SOS Mata Atlântica.

    Este texto foi escrito por: Debora de Lucas