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Trilha na Pedra do Baú revolta montanhistas

Redação Webventure/ Montanhismo

Prefeito quer avaliar estragos depois que eles acontecerem (foto: Divulgação CMSM)
Prefeito quer avaliar estragos depois que eles acontecerem (foto: Divulgação CMSM)

A Secretaria de Turismo de São Bento do Sapucaí (SP), cidade onde se localiza a Pedra do Baú, irá promover um passeio pelas trilhas ao redor da montanha no final do mês de janeiro. Mas esse simples passeio de fim de semana está gerando uma grande discussão entre prefeitura e órgãos ligados à proteção ambiental.

Segundo a Secretaria de Turismo do município, o passeio vai partir do centro da cidade e seguir pelo asfalto, no bairro do Paiol Grande. Depois entrará em uma trilha até o pé da Pedra, contornar e sair no Bauzinho. Serão 19,5 quilômetros, uma caminhada de nível médio. A Prefeitura limitou as inscrições para até 300 pessoas.

“Não tem necessidade de colocar trezentas pessoas na trilha, tem estradas que circundam a Pedra que também são um passeio muito bom. O Clube de Montanhismo da Serra da Mantiqueira (CMSM) vai propor uma redução para 100 pessoas e para fazer o trajeto pelas estradas. Ou um grupo de 40 pessoas, divididos em sub-grupos de oito, com 10 minutos de diferença de saídas entre um e outro, para fazer uma trilha. O Clube vai inclusive se dispor a tentar conseguir voluntários para monitorar esse pessoal. Eu acho que assim é ‘menos pior’. Não concordo ainda com essa quantidade de pessoas na trilha, pois ela não comporta. Os estudos biológicos que estão sendo feitos mostram que ali é uma área muito frágil”, afirma Mônica Fillipini, coordenadora do Projeto do Baú e diretora de meio ambiente do CMSM.

Entidades – A Federação de Montanhismo do Estado de São Paulo (Femesp) e o Clube de Montanhismo da Serra da Mantiqueira (CMSM) estão indignados com a iniciativa da prefeitura em realizar o percurso. Ambas as entidades enviaram cartas (leia a íntegra das cartas na continuação desta matéria) à Secretaria de Turismo sugerindo mudanças na formulação do trajeto. Segundo as entidades, nos moldes em que foi proposto, o passeio causará grande impacto ambiental. “O lugar não comporta tudo isso de gente por dois motivos: pela questão ambiental, o Baú é muito delicado, é um ambiente frágil; e pela questão de segurança. Associações internacionais dizem que para se controlar um grupo em uma situação de emergência em uma montanha, é necessário um monitor para cada 6/8 pessoas. Estamos em uma época de chuvas torrenciais e as trilhas estão encharcadas. Está perigoso levar essa quantidade de pessoas”, explica Mônica.

Petronilha Ambrogi de Oliveira, Secretária de Turismo de São Bento do Sapucaí, afirma que a prefeitura está permitindo tal passeio, inclusive disponibilizando ambulância e policiamento. “É uma trilha protegida, mas não existem limitações sobre quantidade de pessoas. Somos uma área de proteção ambiental, mas não vai haver agressão com esse número de pessoas”, comenta a Secretária.

O prefeito da cidade, Osmar Meride, só vai medir as conseqüências após as pessoas passarem pelo local: “é a primeira vez, como eu vou saber se [vai destruir] não teve ainda? É meio difícil. Depois que acontecer, a gente vê as causas. Aborta ou não e institui outros caminhos no futuro. Vamos deixar acontecer e fazemos uma avaliação. Como terão outras trilhas, outras caminhadas, podemos modificar no futuro”, afirma o prefeito.

Segundo Eliseu Frechou, diretor técnico do CMSM, o prefeito prometeu em janeiro de 2006 a criação do Parque do Baú. Porém Meride afirma que a prefeitura ainda não tem o dinheiro necessário. “É uma verba que conseguimos pelo Comitê de Bacias, que ainda não saiu. A partir do momento que sair e for liberada, começaremos a fazer uma catalogação em cima da Pedra. Está parado na parte burocrática. Mas tem que começar de fato, isso está em pauta”, explica o prefeito.

Mariana Zuquim, vice-presidente da Femesp, afirma que ações como esta não podem danificar o ambiente. “O que a Femesp considera é que as atividades em áreas naturais tem que seguir os princípios de mínimo impacto do Programa Pega Leve, que seguimos. Esse tipo de atividade não está alinhada com esses princípios. Estaria em desacordo 300 pessoas passando ao mesmo tempo na trilha. Os organizadores do evento deveriam programar uma logística mais adequada, separar em grupos menores, enfim… tem uma série de medidas que eles poderiam tomar”, comenta.

O prefeito explica que haverá um cuidado com a região. “Vamos tentar preservar qualquer movimentação fora da trilha. Pretende-se tomar o máximo cuidado possível. Todas as pessoas que estão envolvidas nisso tem um cuidado para não deteriorar a trilha, os locais que estão sendo preservados.”

Histórico – Na década de 40, São Bento do Sapucaí foi o maior exportador de bananas do Brasil. Boa parte da região foi desmatada e deu lugar a plantação de banana. Nos dias de hoje, o desmatamento diminuiu e as entidades tentam preservar o pouco que resta.

Segundo Mônica Fillipini, a Pedra do Baú fica no meio de um corredor de dois biomas: campos de altitude e Mata Atlântica de altitude. “Tem-se ali um corredor ecológico muito grande. Para colocar 40, 50 pessoas em uma trilha em um fim de semana é muita coisa. 300 então é de arrepiar. Os danos que pode vir a causar na região são muito grandes. Só que a Prefeitura de São Bento não tem noção. Dessa vez eles não me consultaram e estou tentando remendar agora”, afirma.

“Não estamos tão preocupados pois a divulgação foi tão mal feita que não achamos que aparecerá muita gente”, completa Mônica.

Abaixo, a íntegra da carta enviada nesta segunda-feira (22) pela Femesp a Sra. Petronilha Ambrogi de Oliveira, Secretária de Turismo de São Bento do Sapucaí.

Por meio de circular elaborada pela Secretaria de Turismo, Cultura, Esporte e Lazer de São Bento do Sapucaí, tomamos ciência da 1ª Trilha Ecológica – Caminhada Pedra do Baú, a se realizar no dia 28 de janeiro de 2007. A circular prevê até 300 pessoas para o evento, que caminharão por trilha até a Pedra do Baú, motivo pelo qual gostaríamos de efetuar algumas considerações:

1. Julgamos importante que o Complexo da Pedra do Baú receba atenção da Prefeitura Municipal de São Bento do Sapucaí, porém vemos com receio a realização de um evento deste porte em uma área não adaptada para receber grande quantidade de turistas simultaneamente.

2. Atividades em áreas naturais devem buscar reduzir ao mínimo o impacto no meio ambiente. Os princípios de mínimo impacto que a FEMESP segue e pratica estão expressos no programa Pega Leve! (www.pegaleve.org.br). Dentre eles, gostaríamos de destacar o item “Planejamento é fundamental” que recomenda “viaje em grupos pequenos de até 10 pessoas – grupos menores se harmonizam melhor com a natureza e causam menos impacto”. Nesse sentido, gostaríamos de ser informados das medidas que a Prefeitura de São Bento do Sapucaí está tomando para minimizar o impacto na trilha, decorrente do evento.

3. A comunidade montanhista freqüentadora da região está organizada no Clube de Montanhismo da Serra da Mantiqueira – CMSM, que é filiado à FEMESP e, portanto, praticante dos princípios de mínimo impacto do Pega Leve!. Assim, quando da realização de eventos como a 1ª Trilha Ecológica – Caminhada Pedra do Baú, recomendamos que o CMSM seja consultado para contribuir no seu planejamento. Destacamos que o CMSM tem trabalhado pela preservação das trilhas da região da Pedra do Baú através do Programa Adote uma Montanha da Confederação Brasileira de Montanhismo e Escalada – CBME. Estes trabalhos ocorrem desde 2002, de forma totalmente voluntária, recuperando e mantendo as trilhas em que o evento em pauta está planejado.

Certos de contarmos com a sua colaboração, agradecemos desde já e aproveitamos a oportunidade para reafirmar nossos votos de elevada estima e consideração.

Atenciosamente,

Silverio Nery
FEMESP Presidente

Abaixo a íntegra da carta do Clube de Montanhismo da Serra da Mantiqueira (CMSM), enviado nesta segunda-feira (22) a Sra. Petronilha Ambrogi de Oliveira, Secretária de Turismo de São Bento do Sapucaí.

Vemos através desta manifestar nossa preocupação com as informações a respeito do evento entitulado “ 1ª Trilha Ecológica Caminhada Pedra do Baú “ a ser realizada no dia 28 de janeiro de 2007. Acreditamos que como está formatado como está, este evento oferece riscos ambientais e aos participantes. Assim oferecendo alternativas para e voluntários para que a atividade prevista dentro de padrões aceitáveis de impacto.

Segundo as informações que dispomos, este evento reunirá até 300 pessoas que percorrerão entre outros, a trilha de acesso a Pedra do Baú.

Nossa preocupação é com o impacto ambiental e aos riscos a que aos participantes estarão sujeitos, devido exatamente a dimensão prevista do evento, incompatível com o local para onde está previsto a passagem das pessoas.

A região da Pedra do Baú é frágil. Apesar de seu valor paisagístico que a eleva a condição de Monumento Natural do Brasil, não existem medidas concretas para organizar sua visitação, que tem ocorrido de forma lamentável. Pessoalmente freqüento a Pedra do Baú a mais de 20 anos. Neste espaço de tempo que é relativamente curto, pude observar um processo de degradação intenso, e que se mantido neste ritmo, tornará a Pedra do Baú um local de valor sensivelmente mais reduzido para as próximas gerações, ou mesmo nos próximos anos.

Se este evento intitulado “ 1ª Trilha Ecológica Caminhada Pedra do Baú“ ocorrer da forma como tem sido divulgado, será mais um impacto a contribuir com a intensa degradação que a Pedra do Baú vem sofrendo, além de ser uma fonte de riscos aos participantes do evento. As razões disto estão escritas em qualquer manual de gestão ambiental e ou manuais de condução ecoturismo, independente de autor (vide, por exemplo, o manual “Pega Leva” utilizado pela FEMESP) e são conhecidas empiricamente por qualquer pessoa que acompanha o que acontece em locais frágeis que sofrem com visitação intensa.

A cada a dia a Pedra do Baú perde parte do seu valor paisagístico, turístico, esportivo e ecológico. O povo de São Bento do Sapucaí tem um tesouro em seu quintal. Precisa cuidar direito do patrimônio que está sob sua responsabilidade, que não é só seu, mas é do Brasil e do Mundo.

Coerentes com isso, recomendamos fortemente uma mudança na natureza do evento que há de se realizar. Que realmente mereça ser chamado de “Trilha Ecológica”. Sugerimos 2 formatos para realizar este evento a contento:

*Opção A.)* Reduzir para cerca de 100 pessoas o número de pessoas prevista, seguindo com estas apenas pela estrada de acesso, pelo planalto, sem utilizar trilhas, utilizando cerca de 10 monitores para organizar o grupo.

Uma vez no estacionamento do Bauzinho, o acesso deve ser limitado ao mirante do Bauzinho, com grupos pequenos e sempre acompanhados por monitores. No máximo 15 pessoas por grupo acompanhados por pelo menos 2 monitores com permanência de 30 minutos de cada vez.

Lembramos que a concentração de cerca de 100 pessoas no estacionamento do Bauzinho será um transtorno de qualquer maneira, prejudicando a visitação dos turistas e esportistas que vão de carro e outros meios ao local. Assim recomendamos a passagem pelo estacionamento com grupos limitados a 15 pessoas de cada vez, que ficariam no máximo 30 minutos no local, evitando aglomerações maiores que 30 pessoas de cada vez. Pelo número de pessoas que passarão no dia pelo local, também será necessário a instalação de um banheiro químico e se tomar medidas relativas a lixo e outros.

*Opção B.)* Vir pela trilha prevista, mas reduzir os participantes a no máximo 40, além de haver acompanhamento de pelo menos 1 monitor para cada 6 pessoas no máximo, com distanciamento de 10 minutos entre o grupo conduzido por cada monitor.

Pode-se alegar que em vários momentos a visitação espontânea, por grupos não organizados a Pedra do Baú supere os números e o impacto que recomendamos acima. Isto ocorre porque não existe uma gestão da visitação a Pedra do Baú. Mas este fato não pode ser usado para que incentivemos práticas equivocadas.

O CMSM coloca-se a disposição para apoiar a organização deste evento, procurando entre seus associados pessoas capacitadas para trabalhar voluntariamente como monitores na condução dos participantes, desde que se siga as recomendações acima, ou caso os organizadores do evento adotem qualquer outro formato compatível com as práticas de mínimo impacto.

Assina: Udo Alexandre Wagner
Presidente do CMSM
Clube de Montanhismo da Serra da Mantiqueira

Este texto foi escrito por: Thiago Padovanni

Last modified: janeiro 22, 2007

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