Equipe australiana (foto: Oskar Kihlborg/ VOR)
Terminou no último sábado mais uma edição histórica da Volvo Ocean Race, que criou a nova vanguarda das competições de oceano, com o topo da tecnologia de construção naval, comunicação e navegação. Os protagonistas dessa história, os veleiros da classe VO70, criada especialmente para a regata, sagraram-se como os melhores veleiros de oceano do mundo.
A prova disso foi o recorde de singradura (milhas náuticas percorridas em 24 horas) quebrado repetidas vezes, mesmo ainda na fase de testes, marca que hoje pertence aos jovens velejadores do ABN Amro 2. No dia 12 de janeiro eles completaram 563 milhas (1.042 km).
Foi nessa equipe que aconteceu o fato mais marcante dessa edição da Volvo, a morte do velejador Hans Horrevoets, após ser levado por uma onda para fora do barco, no dia 18 de maio. O tempo mudou bruscamente e os velejadores desceram na cabine, um por um, para colocarem os equipamentos de segurança que poderiam prevenir o acidente. Hans seria o último, mas foi pego de surpresa.
O início – A saga dos sete veleiros ao redor do mundo começou no dia 5 de novembro do ano passado, com a in port race de Sanxenxo, regata local nos moldes olímpicos, um show para o público local que conta importantes pontos para as tripulações. A experiência de Torben Grael em regatas desse tipo foi o fator determinante para a consistência do Brasil 1 nas regatas locais, que ajudou a equipe alcançar a terceira colocação.
Depois, os veleiros se deslocaram para Vigo, também na Espanha, e largaram de lá para a primeira perna da competição, rumo à Cidade do Cabo, África do Sul. No segundo dia uma forte tempestade mostrou o potencial e as fraquezas dos VO70 para o mundo todo. Velocidades históricas foram atingidas o que depois de oito meses de regata se tornaria comum e dois veleiros tiveram sérios problemas estruturais, o Movistar e o Piratas do Caribe. Ambos tiveram que voltar para terra e receber reparos.
Desde a primeira perna foi levantada a única incerteza quanto ao projeto desses veleiros, que ainda permanece depois de oito meses de provas extremas da natureza: Será que os VO70 têm equilíbrio entre performance e segurança?
A organização afirma que sim, e que para a volta ao mundo de 2008 os veleiros permanecem os mesmos, com pequenas modificações. Mesmo assim, todos os veleiros apresentaram avarias graves em algum momento da regata, sendo que o Movistar afundou na sétima perna da regata, por um problema no sistema da quilha que encheu rapidamente o veleiro de água.
Essa é a primeira geração desses veleiros, provavelmente as próximas serão mais seguras, mas em oito meses e mais de 56 mil quilômetros percorridos, a dúvida sobre a segurança permanece.
Ao extremo – Vida ao extremo é o slogam da Volvo Ocean Race. E não poderia ser mais adequado. É a explicação de 100% dos velejadores quando perguntados o que acontece em uma regata como essa. As temperaturas são extremas, desde o calor escaldante e a falta de ventos na linha do Equador até o frio congelante do Cabo Horn, um dos pontos mais temidos do planeta, que merece um capítulo aparte. As condições de vida dentro do barco e as condições que a natureza impõem são igualmente extremas.
O Cabo Horn é o ponto mais ao sul da América do Sul, encontro do Oceano Atlântico e do Pacífico, ponto de convergência dos fortes ventos e correntes marítimas que são barrados pelo continente, dos dois lados, e empurrados para baixo. Os veleiros que passam por lá geralmente encontram forte neblina, ondas de cinco metros de altura, temperaturas próximas a zero grau e ventos fortíssimos. A chegada, vindo da Austrália, com ventos favor proporciona velocidades recordes, como os 41 nós (75,9 km/h) do ABN Amro 2. A saída, subindo o continente pelo Atlântico, é de ventos contra geralmente fracos.
A perna que passou pelo Cabo Horn foi a mais longa desta edição, com mais de 20 dias de duração, e terminou no Rio de Janeiro. Segundo alguns velejadores estrangeiros, foi a melhor parada até então. A regata local na Baía de Guanabara atraiu cerca de 500 barcos de espectadores e conferiu para a vela nacional a primeira transmissão televisiva ao vivo. Naquele momento, com certeza, quem ainda não conhecia o esporte a vela passou a conhecer. A in port do Rio de Janeiro também teve cobertura on line do Webventure, e você pode ver ao clicar no link.
Sete equipes começaram a edição 2005-2006 da Volvo Ocean Race, mas a regata foi disputada na maior parte do tempo por seis barcos. A primeira equipe australiana na Volvo começou a regata sem saber se conseguiria concluir por falta de patrocínio. Começou como Premier Challenge, mudou de nome para um pool de empresas e terminou como Brunel, a única que ficou até o fim. Eles fizeram apenas as pernas mais curtas da regata e ficaram em último na classficação.
Já o espanhol Movistar, um dos primeiros barcos a ficar prontos, teve um longo período de testes, chegou a ser cotado como favorito, mas uma série de problemas na estrutura desde o começo da regata impediram o barco de chegar até o fim. O Movistar, do comandante Bouwe Bekking, quase afundou na primeira perna, quase afundou no Cabo Horn e realmente afundou no Atlântico Norte. Mesmo assim ficou em sexto lugar.
O veleiro sueco patrocinado pela Ericsson reuniu os velejadores mais experientes em regatas de volta ao mundo para essa edição da Volvo. Chegou a ter na perna entre o Rio de Janeiro e Baltimore, nos EUA, o campeão e o vice da Volvo Ocean Race 2001-2002, John Kosteki e Neal McDonnald, respectivamente. Não chegou a ter sérios problemas estruturais durante a regata, mas também não conseguiu bons resultados. Terminou em quinto.
O Brasil 1 foi um dos projetos de maior sucesso dessa edição da Volvo. Com seis velejadores brasileiros, experientes em Olimpíadas, e quatro estrangeiros com experiência em volta ao mundo, a equipe brasileira conseguiu um equilíbrio de capacidades, resultados, experiências, desastres e sucessos que levou o país ao primeiro pódio da regata, com o terceiro lugar. No comando, Torben Grael, o maior velejador olímpico de todos os tempos. O Brasil 1 teve seu mastro quebrado em três partes na chegada à Austrália e teve que cruzar o país por terra. A regularidade de bons resultados nas regatas locais e a vitória na oitava perna garantiram o terceiro lugar.
O Piratas do Caribe uniu um grande investimento dos estúdios Disney ao comando de Paul Cayard, um dos melhores velejadores profissionais da atualidade. Mesmo indo para água às vésperas da estréia, a equipe conseguiu entrosamento e costume com o barco durante a regata e ficou com o segundo lugar.
O Team ABN Amro entrou com dois veleiros competindo. E isso foi decisivo. Agora, ao final da regata, pode-se dizer que ela já foi ganha antes do começo. O ABN Amro 2, construído primeiro, foi o primeiro barco a ir para água, com a tripulação principal. Os velejadores deram praticamente uma volta ao mundo para treinar e verificar tudo o que poderia melhorar no projeto.
Então, foi construído o ABN Amro 1, com importantes melhorias, que desempenhou uma performance visivelmente superior aos concorrentes, principalmente em ventos fortes. Da metade da regata para frente, todos os velejadores concordaram que seria praticamente impossível bater o ABN 1 e que a briga ficaria para o segundo lugar.
Nessa briga estavam jovens velejadores, amadores e profissionais, selecionados em várias partes do mundo, para tripular o ABN Amro 2. Entre eles, Lucas Brun, brasileiro de 23 anos. Uma campanha de altos e baixos levou a equipe ao quarto lugar, mas muitos velejadores já estão empregados e partem na próxima semana para os sindicatos da Americas Cup. O ABN 2 foi para esses velejadores o passaporte para a elite da vela mundial.
Este texto foi escrito por: Daniel Costa