Caminho para Cambará do Sul (RS). (foto: Arquivo pessoal)
Foram 18 dias na estrada e percorridos 505 km só de bicicleta. A viagem saiu melhor que minhas expectativas e tudo ocorreu da forma mais tranqüila possível. Os lugares são maravilhosos e o povo foi o mais receptivo e atencioso que já conheci no Brasil.
O maior diferencial para mim neste roteiro foi o frio. Cerca de cinco graus positivos (cumulado com o forte vento que soprava) que me obrigavam a vestir quase todas as roupas que trazia nos alforjes. Nunca usei tanta roupa para pedalar.
A viagem começou em Lages, estado de Santa Catarina. Logo no início senti que conseguiria manter ritmo bom, mesmo com o peso da bagagem que levava na bicicleta. Dei início a uma escalada suave e prazerosa pela deserta Rodovia das Araucárias. A estrada, concluída recentemente, é muito bonita e com altas paisagens da árvore-símbolo da região.
Vento e sensação térmica – Ao mesmo tempo em que o sol se punha no horizonte, o frio caiu para três graus e a sensação térmica provocada pelo forte vento baixou esse valor para patamares negativos, o que pude sentir quando pegava vento contra principalmente em momentos de declive.
Cheguei a Urupema (SC), uma localidade muito simples a 1.425 metros de altitude, um dos lugares onde são registradas as temperaturas mais baixas do Brasil. No dia seguinte, o tempo deu uma virada brusca, amanhecendo chuvoso. Como não havia previsão de mudança para os próximos dias, fui obrigado a pegar um ônibus até Urubici (SC).
Urubici é também uma cidade simples, com uma avenida principal onde tudo fica relativamente próximo. Trata-se de um lugar onde se encontram os melhores pontos turísticos da Serra Catarinense, o que me rendeu três dias de pedal.
Passei também pela Serra do Corvo Branco, numa estrada incrível que possui as curvas das mais fechadas possíveis e uma fenda no meio da serra, que foi cortada à base de picareta e dinamite.
Abaixo de zero – Conheci o famoso Morro da Igreja, situado na área do Parque Nacional de São Joaquim e considerado o ponto culminante da região sul do Brasil, com 1.828 metros de altitude. Ali neva constantemente todo inverno, além de ser o lugar onde foi registrada a temperatura mais baixa do Brasil (17 graus negativos). Por fim, conheci a cachoeira do Avencal, com uma incrível queda de 100 metros. Realmente um lugar incrível que merece muitos dias para desfrutá-lo.
Partindo de Urubici, pedalei até Bom Jardim da Serra (SC), com fortes subidas no início da pedalada. Procurei manter o ritmo mais lento e usei as marchas mais leves possíveis para não me desgastar no meio da escalada.
Fora do mapa – No dia seguinte, o destino foi descer a sinuosa e emocionante Serra do Rio do Rastro até a cidade de Lauro Müller, e depois voltar de ônibus pela mesma estrada até Bom Jardim da Serra. Muito divertido descer a serra, parando várias vezes para curtir a paisagem através dos inúmeros mirantes que a estrada possui.
Para a etapa seguinte, resolvi descansar a bicicleta e parti para São José dos Ausentes (RS) na carona de um caminhão de uma madeireira. A estrada de cascalho, com péssima conservação, começa em Bom Jardim da Serra e não está registrada no mapa da Quatro Rodas.
Após esperar a temperatura subir um pouco, dei algumas voltas na cidade e caí na estrada para mais um dia de pedal, já em terras gaúchas. Logo nos primeiros quilômetros o clima mudou repentinamente. Como se estivesse entrando num ecossistema à parte, o sol sumiu e de longe vi uma forte cerração vindo de encontro. Acabei pegando um pouco de garoa no caminho, mas nada que encharcasse as coisas.
Até onde a cerração permitia, vi que era uma estrada bonita, com grandes campos típicos da região, e muitas fazendas de gado e ovelhas. Na verdade, tudo era muito interessante e eu estava curtindo bem a viagem, pois era uma situação diferente, que não estava acostumado e em um lugar onde nunca estivera antes. Era tudo o que eu mais queria.
Os cânions – Cheguei a Cambará do Sul, cidade que serve de base para a visitação dos Parques Nacionais da Serra Geral e Aparados da Serra, onde se encontram os cânions Fortaleza e Itaimbezinho, respectivamente. Foram dois dias exclusivos para curtir as belezas dos dois parques. Para quem nunca viu uma formação como um cânion, fiquei impressionado pela imponência e grandiosidade de suas profundas paredes cortadas com perfeita precisão.
Mais uma vez, tentando por o cronograma da viagem em dia, peguei um ônibus até São Francisco de Paula e pedalei no mesmo dia até Canela, que é bem aconchegante, porém já destoa dos lugares mais simples por onde passei, com restaurantes e hotéis mais caros.
O dia seguinte foi exclusivo para conhecer o Parque Estadual do Caracol, com sua bela cachoeira de mesmo nome e trilhas bem demarcadas.
Cidade do cinema – Depois de conhecer Canela parti em direção a cidade do cinema, Gramado. Estar em Gramado em pleno domingo de temporada foi um verdadeiro choque cultural, com os vários carros querendo passar por cima de mim, calçadas intransitáveis, inúmeros hotéis, lojas e restaurantes sofisticados. Realmente nada a ver com o contexto da viagem, mas valeu a pena para conhecer a cidade.
O ideal era conhecer uma parte mais interessante e afastada do centro, com várias vilas de colonos, porém o meu tempo e dinheiro já estavam esgotados. O dia seguinte seria o último da minha viagem: parti de ônibus até Caxias do Sul e depois para São Paulo.
(*)Jorge Blanquer é advogado e se iniciou no cicloturismo em 1997. Fez viagens de Curitiba a Florianópolis via litoral, Cunha à Paraty, além de inúmeras viagens pela Serra do Mar e interior do Estado. Realizou exposições fotográficas de suas viagens na Adventure Sports Fair 2002 e 2003 e no Salão das Duas Rodas 2001 e 2003. |
Data em que foi realizada:
de 13 a 29 de julho de 2003
Números
Distâncias da Serra Catarinense
54 km (pedal em asfalto – SC 438)
40 km (ônibus devido a forte chuva)
89 km (pedal em asfalto – SC 430 e 438)
85 km (estrada de terra)
Distâncias da Serra Gaúcha
55 km (pedal em terra)
23 km (pedal em terra)
18 km (pedal em terra)
71 km (ônibus em asfalto – RS 020)
35 km (pedal em asfalto)
8 km (pedal em asfalto)
Altitudes
Equipamentos e acessórios usados
Barraca
Isolante térmico
Alforges
Capa para bicicleta
Termômetro
Ciclocomputador
Canivete Suíço
Bússola
Binóculo
Kit de ferramentas e remendo
Bomba e câmera de ar
Silver Tape
Caramanholas (4)
Presilhas
Cadeado
Isqueiro e fósforos
Álcool 92 (1 litro)
Purificador de água
Detergente
Fogareiro
Panelas (2)
Prato e copo plásticos
Talheres
Lanterna
Despertador
Travesseiro inflável
Pilhas
Pano para limpeza em geral
Corda para varal
Sacos Zip-lok
Papel alumínio
Produtos de higiene
Mapa e roteiro de viagem detalhados
Caderno para diário
Caneta
Capacete
Toalha
Band-aid
Equipamentos e acessórios de fotografia
Câmera fotográfica Reflex
Câmera fotográfica simples (reserva)
Bolsa
Flash
Caixa com 5 rolos de filme
Tripé
Filtros polarizador e UV
Cabo disparador
Bateria reserva
Cartão cinza
Pincel e papel para limpeza
Tabela para anotação de dados de exposição
Etiquetas para identificação dos filmes
Vestuário e objetos pessoais
Saco de dormir tipo sarcófago
Bermuda de ciclismo em lycra
Pernito em lycra
Anorak em poliéster impermeável
Calça / Bermuda em Supplex
Calça em poliéster impermeável
Meias
Agasalho de moletom
Tênis
Gorro de lã
Luva comprida de lã
Camisetas para frio (curta e comprida)
Alimentação
Macarrão instantâneo
Arroz
Feijão
Sopa instantânea
Queijo
Cereais em barra
Banana seca em barra
Bolacha
Bisnaga
Leite em pó
Chocolate em pó
* Jorge Blanquer Rodrigues: Advogado, membro do Clube de Cicloturismo do Brasil, escreveu especialmente para o Webventure. Iniciou no cicloturismo em 1997. Fez viagens de Curitiba a Florianópolis via litoral, Cunha à Parati, além de inúmeras viagens pela Serra do Mar e interior do Estado. Realizou exposições fotográficas de suas viagens na Adventure Sports Fair 2002 e 2003 e no Salão das Duas Rodas 2001 e 2003.
Este texto foi escrito por: Jorge Blanquer Rodrigues*