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Extremo Sul do Brasil: de volta ao Taim


Capela do Taim (foto: João Paulo Lucena)

No extremo inferior do Rio Grande do Sul, onde termina – ou começa (!) – o Brasil, está a região do Taim, santuário de avifauna que abriga uma reserva ecológica com mais de 33 mil hectares de campos, dunas, banhados, mar e lagoa, apelidada de o “Pantanal Gaúcho”. Localizado em uma estreita faixa de terra entre o Oceano Atlântico e a Lagoa Mirim, a 370 quilômetros ao sul de Porto Alegre, compreende parte dos municípios de Santa Vitória do Palmar e Rio Grande.

Ali foi criada a Reserva Ecológica do Taim para preservar as últimas áreas de banhado do Rio Grande do Sul, formados a partir do prolongamento assoreado da Lagoa Mangueira, e evitar a extinção de espécies como o cisne-de-pescoço-preto. A unidade de conservação abriga diversos ecossistemas de praias lagunares e marinhas, lagoas, pântanos, campos, cordão de dunas e campo de dunas.

A estimativa é que no Taim se encontrem mais de 230 espécies de aves que, entre agosto e janeiro, aumentam com a chegada de outras espécies migratórias dos dois hemisférios. Ainda vivem no banhado jacarés-de-papo-amarelo, capivaras, preás, gambás, lagartos e cerca de 60 tipos de peixes. Alguns animais são bastante fáceis de avistar como as emas, gaviões, a saracura, o joão-de-barro, tartarugas, tuco-tucos e o ratão-do-banhado.

A flora compõe-se principalmente de vegetação típica de campos, figueiras, corticeiras, quaresmeiras, orquídeas, bromélias, cactos, juncos e aguapés.

Antigamente toda a região estava abrangida pelos Campos Neutrais, denominação dada pelo Tratado de Santo Idelfonso em 1777 a uma faixa de terra demarcada que se estendia do Taim até o Chuí e que não pertencia nem a portugueses, nem a espanhóis. Este espaço foi palco durante muitos séculos de grandes revoluções e acirradas batalhas por disputas territoriais e políticas.

Lembranças – Lembro desde pequeno das tantas passagens que fiz com meus pais pelos 15 km da BR-471 que cruzam a reserva ecológica do Taim. Repleta de capivaras, jacarés, tartarugas e aves migratórias de todos os tipos, os animais eram (e ainda são) facilmente avistáveis desde a estrada e constituíam um dos principais atrativos da longa viagem entre Porto Alegre e La Coronilla, já do outro lado da fronteira internacional com o Uruguai.

Para uma criança nascida e criada na cidade grande, a visão destes animais libertos em seu próprio ambiente, longe das enfadonhas visitas ao jardim zoológico, era o prenúncio da tão esperada quebra da rotina que acompanha o período de recesso escolar. Além disso, passar pelo Taim significava que também já estava próxima a fronteira brasileira com o vizinho Uruguai, onde o mundo conhecido se transmudava em um novo espaço de ricos sotaques, aromas e sabores estrangeiros.

À época, lá por 1972, com os dois países sob o jugo de ditaduras militares, os burocráticos trâmites fronteiriços eram repletos de policiais, agentes de imigração, soldados com metralhadoras, uma infinidade de papéis a carimbar e a obrigatória revista dos automóveis em busca de algum pretenso material subversivo da ordem e da paz. Sob a ótica de um menino que ignorava a realidade por trás da repressão política, isto dava a tudo um ingênuo clima de perigo e aventura, digno dos melhores filmes de espionagem…

Transcorrido o tempo e já distantes os anos de chumbo, a condição de efêmero passante transformou-se na de visitante regular, admirador da diversidade da fauna e da flora e, mais do que tudo, dos grandes espaços da planície costeira do Rio Grande do Sul.

Há pouco tempo, não mais de passagem mas sim como meu destino principal, voltei ao Taim para me apropriar da sua paz, fotografar e percorrer seus tantos quilômetros de trilhas de campos, dunas e banhados, visitando capelas seculares e faróis perdidos entre horizontes de areia e o perigoso mar do Rio Grande do Sul.

Aproveitando um convite para acompanhar as gravações do Programa Adrenalina decidi compartilhar minhas recordações de infância com meus filhos, gêmeos de 8 anos. Assim, direto depois da escola, entre mochilas, livros escolares, equipamento fotográfico e material de camping, ao anoitecer de uma sexta-feira de outono tomamos o rumo direto para o Taim.

A programação foi variada e intensa. Em paralelo com as gravações de TV tivemos todo o tempo do mundo para visitar a estação ecológica e seu pequeno museu, observar os animais no banhado, deliciar-nos nas águas transparentes da Lagoa Mirim, percorrer trilhas de 4×4 e se extasiar com a paisagem litorânea repleta de dunas e faróis.

Junto com vários amigos a diversão foi garantida, reforçando laços de afeto e de união entre pai e filhos. Além de um final de semana cheio de novos conhecimentos bebidos diretamente da fonte, quebrou-se para as crianças aquela urbana rotina de intermináveis aniversários infantis, horas frente à televisão e partidas de videogame…

Atrações – Com direito a várias paradas, em comboio de 4×4 valeu a visita à área da reserva junto ao mar, passando pelos Faróis Verga e Albardão, quando avistamos grande variedade de pássaros, restos de naufrágios, lobos e tartarugas marinhas e até de uma grande baleia junto à areia da praia.

Imperdível é a visita à pequena Capela do Taim, sobre a única linha de falésia viva da Lagoa Mirim. Os fundamentos da primeira construção espanhola são de cerca de 1700 (!) e agora este importante patrimônio histórico está sendo restaurado por arqueólogos da Universidade Federal de Rio Grande – FURG.

Dentre um pouco de trabalho, locações de TV e bastante diversão, depois de um final de semana repleto de aventuras, ar puro e paz de espírito, ficou em todos aquele gostinho de quero-mais e a vontade de logo logo voltar ao Taim…

  • A seis quilômetros antes da reserva ecológica, para quem chega de Porto Alegre, está a pequena Vila do Taim, também conhecida como Capilha. Não deixe de visitar a Capela do Taim sobre a falésia que dá para a Lagoa Mirim. A capela tem fundamentos datados de cerca de 1700, construção espanhola em 1785 e reconstrução portuguesa em 1844, com uma belíssima vista para o pôr-do-sol na lagoa.
  • Se quiser saborear uma deliciosa comida caseira, faça sua refeição no Restaurante Lancheria Mirim, na Vila do Taim. Mescla de mercearia e pequeno restaurante, a simplicidade do local não deixa nada a desejar. Fale com a dona, Jaqueline, pelo telefone (53)9975-0085 . Não abre aos domingos.
  • Pedágios: Entre Porto Alegre e o Taim são 370 Km e existem CINCO (!) pedágios a R$ 7,20 reais cada um. Significa R$ 72,00 apenas para ir e voltar, sem contar o combustível…
  • Combustível: Se estiver rumando ao Taim desde Porto Alegre, não deixe de encher o tanque de combustível em Rio Grande pois o próximo posto de abastecimento será somente em Santa Vitória do Palmar. No Taim não há combustível para venda.
  • Repelente: leve muito pois os mosquitos são insaciáveis nas regiões de banhado…
  • Celular/Internet wireless: A comunicação é muito deficiente. A única operadora que possui antena na Vila do Taim é a Vivo.
  • PARA SABER MAIS:

    Visitas: Na sede do Instituto Chico Mendes (Fone (53)3503-3151 , 2ª/6ª 8h30/12h, 13h30/18h), na beira da rodovia, pode-se visitar um pequeno museu com animais taxidermizados e assistir a um vídeo sobre o ecossistema. No entorno da estação há quatro trilhas (de 1h30 a 2h cada) monitoradas (agendar).

    Este texto foi escrito por: João Paulo Lucena